Salvador

MP-BA entrará na Justiça contra empreendimento no Cidade Jardim; construtora nega irregularidades

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A Villas Construtora é acusada de realizar intervenções sem a licença do município  |   Bnews - Divulgação Vagner Souza/BNews

Publicado em 25/01/2019, às 12h40   Márcia Guimarães


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O caso envolvendo a Villas Construtora, a Associação de Moradores do Cidade Jardim, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur) e o Ministério Público da Bahia (MP-BA) parece estar longe do fim. Isso porque o caso irá parar na Justiça.

“O Ministério Público vai ingressar com uma ação na Justiça para evitar que o empreendimento seja implantado, pois lá tem uma Área de Preservação Permanente (APP), que é a que está do lado do rio e não pode ser construída. Eles [Villas Construtora] estão construindo em cima do rio, fazendo o encapsulamento, para criar uma viazinha que sai no Cidade Jardim. Era importante que essa área fosse objeto de uma restauração, de uma revitalização e se integrasse à área pública, e não destruir a área”, explicou a promotora do Ministério Público da Bahia (MP-BA) Hortênsia Pinho.

Ela conta que o MP-BA fez, em 2015, uma recomendação para que o município de Salvador tomasse os devidos cuidados com a implantação do Loteamento Reserva Cidade Jardim (que antes tinha outro nome) e solicitou a suspensão parcial dos efeitos de qualquer licença ambiental. O órgão já tinha verificado que havia uma APP e um recurso hídrico no local e havia, então, uma incompatibilidade de implantação do empreendimento onde ele estava situado.

“O empreendimento foi paralisado e só recentemente tive notícia que agora realmente a Prefeitura concedeu um alvará, que o empreendimento está a todo vapor e que haveria uma via pública que ligaria o empreendimento ao Cidade Jardim. A intenção é de aumentar o valor econômico do imóvel para garantir que tenha um acesso pelo Cidade Jardim. Só que esse acesso é bem estranho porque é uma via muito estreita, que soterrou o rio para ter uma saidinha no bairro”, citou a promotora. Ela diz que, para ter essa saída, a Villas Construtora teve que pegar um pedaço de área pública.

“E o Cidade Jardim tem pouquíssima área pública. Além disso, compromete uma área muito interessante, que tinha o potencial de pracialidade e poderia melhorar a qualidade de vida da população, oferecendo lazer, de integração social. Inclusive, todas as áreas públicas do bairro foram desafetadas e trocadas por outras áreas. O bairro já sofre com a falta de áreas verdes e áreas públicas, que foram doadas ao poder público na época de implantação do loteamento e depois desafetadas e trocadas. Hoje estão na mão da iniciativa privada”, relembra Hortênsia.

Ela destaca que é proibido botar a rua porque a via está em cima de um recurso hídrico e porque essa via vai segregar e dificultar muito a vida de uma comunidade que existe ali no fundo, a Comunidade da Fonte. “O empreendimento está situado de uma forma que essa comunidade carente vai perder a sua servidão de passagem, vai dar uma volta enorme. Atualmente, já construíram até um muro na comunidade, retirando os quintais e as posses dessa população. Essas ações foram feitas com intimidação e a comunidade precisa ser essencialmente protegida”, denunciou.

A promotora adianta que irá solicitar ao juiz que veja uma medida de urgência para parar a implantação do empreendimento porque, na forma em que está previsto, descumpre o Plano Diretor de Salvador, já que, no seu local, passaria uma via pública (chamada de Arterial Trincheira do Candeal). Esta via foi pensada para melhorar o trânsito de Brotas, que é muito caótico. “Como é que o poder público municipal aprova o Plano Diretor que prevê uma via e a Sedur autoriza um empreendimento com 19 lotes que serão futuramente 19 torres em cima da área onde passaria a via? Esse é um problema grave”, avaliou.

Para Kátia D’el Rey, moradora do Cidade Jardim há 25 anos, a Associação de Moradores não teve acesso ao projeto, mas acredita que houve um subdimensionamento do empreendimento. “A área do empreendimento fica no Candeal, ela tem o acesso para a Rua José Pedreira. Depois dela, com o acesso criado e o tamponamento do rio, vai dar na Rua Carlos Maron. Você caminha alguns metros e dá no Cidade Jardim. Então, já existia o acesso e não precisava ter feito esse desmatamento e tamponar o rio. Só que o metro quadrado de lá é inferior ao do Cidade Jardim e o fato de ter um acesso pelo Cidade Jardim faz com que o imóvel seja mais caro e valorizado”, reclamou a moradora.

Ela diz que os moradores são contra a obra porque tínhamos uma APP onde o clima era bem menos quente do que é hoje, pois tinha o rio e a árvore. “Quando houve o tamponamento do rio, a água saiu rompendo tudo e fez um grande buraco em 2014. Após isso, procuramos o MP e continuamos, desde então, na maior luta para resolver isso”, relembrou Kátia.

A moradora ressaltou que a Associação está, há quatro anos, pedindo para a prefeitura construir um parque na região: “a gente não tem nenhuma área verde. Todas as quatro que tínhamos foram negociadas pela prefeitura e tudo foi construído. A gente quer que essa área seja destinada a uma praça a que dá para a Rua Leonor Calmon, do Cidade Jardim. Para ter acesso pelo Cidade Jardim, eles [Villas Construtora] passaram por cima dessa área que seria uma praça e que beneficiaria o Candeal, o Cidade Jardim e circunvizinhos. Queremos que seja preservada a última área verde que temos aqui!”.

Outro problema apontado por Kátia é a questão do engarrafamento. Segundo ela, a região tem muito mais fluxo de carros do que estava projeto do loteamento e a Rua Leonor Calmon é a única via que os moradores têm para todo o loteamento, ou seja, se tiver qualquer problema, ninguém consegue transitar.

Neste sábado (26), às 9h30, os moradores do Cidade Jardim irão dar um abraço em volta da praça onde eles querem que seja construído o parque. “Essa área é comunal e foi prometida para a gente pela OAS, desde que foi lançado o loteamento”, avisou Kátia.

O que diz a Sedur

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur) informou que a obra na região do Cidade Jardim continua paralisada, obedecendo as ações fiscais do órgão. Para garantir o cumprimento da legislação, a fiscalização no local é diária.

“A Sedur informa que atua de acordo com os parâmetros estabelecidos na Lei Municipal 8.915/2015, que dispõe sobre a Política Municipal de Meio Ambiente. Seguindo os termos que a lei preconiza, o órgão emitiu em 2018 a dispensa de licenciamento ambiental da obra, na qual foi condicionado a necessidade da solicitação da Autorização de Supressão de Vegetação (ASV), o que não foi obedecido pela construtora”, disse o órgão.

No dia 4 de janeiro de 2019, a construtora foi notificada para suspender a atividade de terraplanagem por não possuir a licença do órgão. “O pedido de licença de terraplanagem já havia sido indeferido, por não apresentar os projetos dos muros de contenções e os sistemas de drenagem. Já no dia 07 de janeiro, a Sedur autuou a empresa por realizar a supressão de vegetação também de forma irregular”, completou a Sedur.

Contrariando o MP-BA, o órgão afirmou que o empreendimento não desrespeita o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU). “O terreno é privado e vem sendo licenciado desde 1998 e a possibilidade da construção de uma via pública no local iria de encontro ao direito de propriedade”, justificou.

Villas Construtora se defende

Em coletiva de imprensa nesta sexta-feira (25), a Villas Construtora disse que a empresa, em 1999, recebeu do então prefeito, Antônio Imbassahy, uma área de 1004,18 m², destinada à abertura da via de acesso ao Loteamento Cidade Jardim, em permuta de outra área com 9.300,00 m² do bairro do Barbalho. De acordo com a construtora, o projeto foi aprovado em 2003 e possui Registro no Cartório de Imóveis desde 2004.

Ainda em 2003, a gestão municipal emitiu para a Villas Construtora o Alvará de Construção do Loteamento Reserva Cidade Jardim. A sua última renovação ocorreu em 26 de abril de 2018 e vigorará até abril de 2022.

A empresa alega possuir também, como Decreto Municipal, Licenciamento Ambiental com sua última renovação emitida no dia 08 de agosto de 2018, com prazo de 02 anos, e Licença de Supressão vigente. Ela também garante que o acesso do loteamento Reserva Cidade Jardim sempre foi pela Rua Leonor Calmon, no Cidade Jardim, desde o ano de 1999, com aprovação do Termo de Acordo e Compromisso com a Prefeitura Municipal, e ratificação através do projeto aprovado no ano de 2003.

Sobre a denúncia de terraplanagem ilegal, a Villas Construtora assegura que nunca realizou nenhum serviço desse tipo, apenas fez, em dezembro de 2018, a supressão e limpeza da área. Quanto à construção da praça, a empresa cita que, em 24 de janeiro de 2017, enviou à Sedur uma proposta para a construção do equipamento, custeado pela Construtora. Para a Villas, a praça sugerida é mais ampla e funcional, com mais de 2.000 m² e em área plana.

A construtora explicou que o projeto do Loteamento Reserva Cidade Jardim possui 18 lotes pequenos, que agrupados possibilitarão a construção de oito torres residenciais, além de 741,44 m² para edificação de um ponto comercial. Dos 42.349,25 m² do terreno, 27.239,16 m² são de áreas comercializáveis, resultando em uma área remanescente de 15.110,09 m², que foi doada para a Prefeitura de Salvador.

Segundo o diretor de engenharia e responsável técnico da Villas Construtora, Bruno Barreto, o empreendimento está regular, atendeu todas as primícias necessárias para a aprovação dele. Ele não soube precisar se o loteamento possui Relatório de Impacto no Trafego (RIT).

“Não posso precisar no momento. Acho que o importante é a gente saber que as leis não podem ser retroagidas, então a aprovação de algo compete ao momento em que foi aprovado”, afirmou Barreto.
Na avaliação dele, o empreendimento vai trazer alguns ganhos de mobilidade para a região. “É importante lembrar que nenhuma aprovação de um projeto é feita sem essa análise e não será agravado nenhum problema em relação à questão da mobilidade. Inclusive, algumas edificações na vizinhança passarão a ter acessos melhorado e com melhor qualidade de mobilidade”, alegou o diretor.

Ele frisou que está fazendo a estrutura do loteamento para, posteriormente, os edifícios serem aprovados individualmente. Então, cada empreendimento passará por um processo de avaliação e deverá manter as características necessárias para que não haja nenhum impacto.

“O acesso feito no local é muito bem planejado, com vias de dez metros. São vias largas que permitem estacionamento nas laterais, sem comprometer o fluxo nos dois sentidos e tudo isso foi planejado e concebido da melhor forma possível”, garantiu.

Em resposta à supressão da árvore gameleira, ele disse que estava prevista e, para cada árvore derrubada no empreendimento, foram plantadas duas de espécie similares em local definido pela própria administração municipal.

Sobre a denúncia do Ministério Público referente à construção de um muro que separa a Comunidade da Fonte, Barreto declara que não há nenhuma intervenção feita para prejudicar a comunidade. “Muito pelo contrário, todas as ações que vão ser feitas vêm a somar, a gerar não só uma melhoria na qualidade de mobilidade para eles, mas também gerar emprego e renda, então não procede essa informação. A única parte que foi murada foi a área privada, que é de propriedade da construtora”, argumentou.

Classificação Indicativa: Livre

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