Salvador
Publicado em 29/03/2024, às 05h00 Marco Dias
Em Capitães da Areia, publicado em 1935, Jorge Amado descreve a essência de Salvador e da sua formação enquanto primeira capital do Brasil: “na sua frente estava a cidade misteriosa, e ele partiu para conquistá-la. A cidade da Bahia, negra e religiosa, é quase tão misteriosa como o verde do mar.
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Quase cem anos depois, as influências afro-brasileiras e religiosas persistem na construção cultural da cidade. Fundada em 29 de março 1549 por Tomé de Sousa, a capital baiana já existia muito antes dessa “descoberta portuguesa", contendo algumas etapas de formação.
Formação da cidade
Para o historiador Ricardo Carvalho, a primeira etapa de formação da cidade de Salvador aconteceu em novembro de 1501, quando o navegador florentino Américo Vespúcio adentra a Baía de Todos os Santos.
Podemos dizer que Salvador e a Baía de Todos os Santos foram descobertas naquele dia, no dia de Todos os Santos, em 1º de novembro de 1501”, explica Carvalho.
Já o processo de miscigenação, que resultou no primeiro casal interracial em solo baiano aconteceu por volta de 1510, quando chega em Salvador o primeiro morador europeu, Diogo Álvares Correia, o Caramuru, na praia do Rio Vermelho.
Ele se envolve afetivamente, maritalmente, com Paraguaçu, a filha do cacique e, assim se forma a primeira família, digamos assim, interracial, a primeira família integrando a Europa e o Brasil”, contextualiza Carvalho.
Dezessete anos antes da chegada de Tomé de Souza, Francisco Pereira Coutinho, o primeiro capitão donatário da Capitania da Baía de Todos os Santos, estabelece a Vila do Pereira.
Mais tarde, com Tomé de Sousa, em 1549, a região passou a se chamar Vila Velha. O Vila Velha do Pereira, já que ele transferiu a administração da cidade para onde hoje é, aquela região da Praça Municipal, Pelourinho, Rua Chile, para aquela área, pontua o historiador.
Influência religiosa
A religião católica dos colonizadores portugueses mesclou-se, com o passar do tempo, com as crenças dos indígenas que já residiam na capital e com a religião dos povos africanos escravizados que aqui chegaram. Traço representativo dessa variedade são as igrejas, templos e terreiros, que conferem a Salvador o status de cidade marcada pela religiosidade.
No processo de expansão dessa influência religiosa, Salvador foi invadida por holandeses em 1624, que traziam consigo a linha do protestantismo, que já se espalhava pelo continente Europeu.
Os holandeses invadem o Brasil através da cidade de Salvador e permanecem aqui durante um curto período. [Como resposta] Todos foram convocados para lutar e muitos outros lutaram compulsoriamente. A igreja tinha de meter na cabeça dos baianos que aquela era uma luta religiosa contra os hereges protestantes holandeses”, explica Ricardo Carvalho.
Segundo o censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Salvador possui 6.032 estabelecimentos religiosos, número que é superior a quantidade de estabelecimentos de ensino e saúde. No Centro Histórico, há uma grande concentração desses espaços sagrados.
Diversidade cultural no Centro Histórico
O Pelourinho, um dos pontos turísticos obrigatórios para quem visita a capital baiana, carrega o símbolo dessa história em expressões culturais presentes no local. Para o agitador cultural Clarindo Silva, não há lugar melhor na cidade do que o Centro Histórico.
Ouso dizer que é o coração dessa nação chamada Brasil. Fico feliz em ver a cidade completar 475 anos com toda a dignidade, apesar de alguns problemas naturais de uma cidade como Salvador, esse é um momento de emoção", declara Silva.
A baiana de acarajé é considerada um patrimônio cultural imaterial do Brasil desde 2005, registrado no Livro dos Saberes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan). Seguindo a tradição da mãe, Cristiane também coloca o Centro Histórico como seu local favorito na cidade.
Aqui tem a nossa história, é daqui que trazemos tudo, sobretudo nós, africanos, afrodescendentes, então sou muito grata por ter nascido em um local como esse", revela Cristiane.
Apesar da diversidade religiosa e cultural, a região do Pelourinho não é tida como um bairro nobre da capital, algo que mudou com o passar do tempo e com a expansão territorial da capital baiana.
Sabemos que até a década de 40 aqui era um grande centro econômico, cultural e financeiro, e a partir da Segunda Guerra Mundial, as ditas famílias tradicionais foram para o Corredor da Vitória, para a Graça, o que representou um empobrecimento da área", explica o agitador cultural.
Cidade mais negra fora da África
De acordo com o censo de 2022 do IBGE, Salvador tem pouco mais de 2,4 milhões de habitantes, sendo considerada a capital com a maior ancestralidade africana, a partir de estudos genéticos: 50,8%, a cidade mais negra fora do continente africano.
Três lugares para conhecer a história de Salvador
Quem visita a Casa das Histórias de Salvador tem acesso a um acervo multimídia, com conteúdos digitais e materiais físicos que incluem materiais do Arquivo Público Municipal, encontrando a trajetória dos quase cinco séculos da cidade, com narrativas, saberes e fazeres de pessoas do cotidiano, além da contribuição negra e indígena para a formação da primeira capital do país.
Horário de funcionamento: de terça a domingo, das 10h às 18h, com entrada até às 17h
Entrada: gratuita até o dia 31 de março de 2024.
Endereço: Rua da Bélgica, 2, Comércio.
Com mais de 3 horas de conteúdo audiovisual, a Casa do Carnaval é um espaço de Salvador que conta a história da maior festa popular da cidade.
Horário de funcionamento: de terça a domingo, das 10h às 18h, com entrada até às 17h
Entrada: os ingressos custam R$ 20, com meia entrada para residentes em Salvador, estudantes e idosos. Às quartas, a entrada é gratuita.
Endereço: Praça Ramos de Queirós, Pelourinho.
O Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira possui um acervo de mais de 350 obras que retratam o trabalho, as lutas e as resistências, além da influência cultural da cidade mais negra fora da África.
Horário de funcionamento: de terça a domingo, das 10h às 17h, com último acesso até às 16h30
Entrada: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia). Quarta e domingo a entrada é gratuita.
Endereço: Rua das Vassouras, 25, Centro Histórico.
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