Salvador

Pronto para rir? Se divirta com a história dos nomes de alguns bairros, ruas, becos e vielas de Salvador

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Para entender um pouco mais sobre os nomes de bairros e ruas de Salvador, a equipe do BNews conversou com um historiador e também com moradores da cidade  |   Bnews - Divulgação Divulgação

Publicado em 21/03/2023, às 06h10   Camila Vieira


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Pau Miúdo, Rua do Tira Chapéu, Beco da Gasosa, Ladeira da Preguiça, Rua Chile e da Rua da Misericórdia. Esses são alguns dos tantos nomes engraçados e curiosos que intitulam bairros, ruas, becos e vielas de Salvador. Definições com um “duplo sentindo” que muitas vezes causam embaraço para quem vive no local e curiosidade para quem visita à cidade. A capital baiana e também a primeira do Brasil completa 474 anos no próximo dia 29.

Para homenagear de maneira lúdica a cidade que tem papel tão importante na história do Brasil, a equipe do BNews conversou com um historiador e alguns soteropolitanos para tentar entender um pouco sobre esses nomes que arrancam tantos risos, mas também trazem boas histórias de “pano de fundo”.

Antes da lista, é importante trazer a definição do que é um bairro é como é feita e escolha do nome de uma localidade. Segundo a lei Nº 9278/2017 (a mesma que alterou alguns CEPs de Salvador em 2017), bairro é a unidade territorial com densidade histórica e relativa autonomia no contexto da cidade, que incorpora noções de identidade e pertencimento dos residentes e usuários, os quais utilizam os mesmos equipamentos e serviços comunitários, mantêm relações de vizinhança e reconhecem seus limites pelo mesmo nome. Assim, por meio dessas características marcadas através das relações e do conhecimento popular, que se delimita a definição de uma localidade ou bairro. 

Agora a brincadeira vai começar com o nome de um dos bairros que mais arranca risos na capital baiana: o Pau Miúdo, localidade vizinha ao IAPI e a Caixa D’Água. Antes que as mentes pecaminosas pensem bobagem, a nomenclatura não tem nada a ver com o tamanho dos órgãos sexuais masculinos. A razão do nome se dá pela sua vegetação, o que ainda assim não impede que sejam feitas brincadeiras ousadas e de duplo sentido.

Moradora do Pau Miúdo há 50 anos, a aposentada Lédia Silva, 69 anos, diz já ter se acostumado com as brincadeiras com relação ao nome do bairro. “Lá atrás era bem pior, hoje em dia as coisas estão tão abertas que as pessoas já nem ligam mais”, diz ela. Residente da Rua da Coréia, uma das vias do bairro, ela conta que tem uma relação de amor com o lugar onde vive. “Cheguei aqui menina e nunca quis morar em outro lugar. Mãe viveu aqui e criou nove filhos. Todos foram embora, mas eu fiquei e daqui não saio”, afirma.

O nome do bairro faz referência a vegetação rasteira que existia na região que tinha como principal característica árvores pequenas, rasteiras e arbustos. No início da ocupação do local, as casas construídas eram feitas de palha e posteriormente eram “reformadas” para casas de taipa, necessitando de madeiras finas para obra, ou seja, eram usados pedaços de paus pequenos. “Era um lugar com vegetação rasteira, vegetação menor, por isso Pau Miúdo, nome dado aquela época e mantido até hoje", pontua o historiador e professor Rafael Dantas que foi coordenador do Turismo Cultural e Histórico da Bahia.

Segundo o historiador, que há 10 anos consolidou um trabalho sobre os bairros e ruas de Salvador, é interessante falar que toda rua de uma cidade tem seu nome oficial que foi escolhido por prefeitos, ao longo do tempo, ou através de definições populares que terminam se consagrando como a identidade da própria rua ou bairro. Alguns locais em Salvador também são batizados pelo costume popular. Um exemplo é a Baixa dos Sapateiros, que oficialmente chama-se Avenida J.J. Seabra. Outra avenida mais conhecida pelo soteropolitano pelo nome popular é a Bonocô, que originalmente chama-se Mário Leal Ferreira. Assim como elas, existe também a Avenida Luís Viana Filho, comumente chamada de Avenida Paralela.

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Desde 2017, Salvador passou a ter 170 bairros após uma lei municipal implementada pelo até prefeito ACM Neto. Na época foi determinada a criação de sete novos bairros na capital baiana: Chame-Chame, Colinas de Periperi, Dois de Julho, Horto Florestal, Ilha Amarela, Mirantes de Periperi e Vista Alegre.

Personalidades - A capital baiana também tem muitos bairros com nomes de figuras e personalidades que marcaram a história. Dom Avelar, Marechal Rondon, Luís Anselmo, Stella Maris e Cosme de Farias são alguns deles. Figuras que hoje nomeiam localidades, mas que tiveram grandes contribuições históricas. Nascida em Cosme de Farias, no ano de 1960, a pedagoga Angélica Freitas, 63 anos, viveu um período em São Caetano e depois retornou ao seu bairro de origem. “Retornei ao Cosme em 1983, onde permaneci morando até 2018. Era um bairro tranquilo até a década de 80. Quando era criança, brincava na rua até tarde da noite, sem me preocupar com a violência. As portas das casas ficavam abertas à noite, os adultos conversavam despreocupados”, lembra saudosa.

A professora também lecionou no Colégio Estadual Cosme de Farias que carrega o nome do bairro. “Tinha uma relação muito boa com a escola e com a comunidade. Fiz muitas amizades com os moradores, país de alunos e comerciantes”, conta ela. Sobre à origem do bairro, diz que passa adiante o que aprendeu ainda quando pequena. “O que sempre ouvi falar é que pertencia à família Saldanha. O bairro recebeu o nome de Cosme de Farias, a partir dos anos 60, quando o major do mesmo nome foi morar no local. Ele era endeusado pelos moradores, pois era defensor dos pobres e lutou muito contra o analfabetismo. Era rábula, ou seja, advogava sem ter a graduação em Direito”, conta ela.

Para quem tem 40 anos trabalhando entre a Rua da Misericórdia e a Rua Chile, os nomes carregam muito significado. O relojoeiro Cícero Santana, 72 anos, velho conhecido das ruas do Centro de Salvador, se emociona ao falar sobre os locais. Questionado pela reportagem sobre o significado dos nomes das localidades, ele diz que pouco sabe. “Só sei que a Misericórdia é uma das ruas mais antigas de Salvador”, diz ele. E de fato é, a rua data do século 16 e liga a Praça da Sé à Praça Thomé de Sousa.

A curiosa e glamorosa Rua Chile - Sobre a pequenina Rua Chile que tem nome de um país vizinho, seu Cícero sente-se orgulhoso em fazer parte da composição da via há tantos anos. “Aqui me sinto na Europa de Salvador”, brinca o relojoeiro. Localizada no Centro Histórico de Salvador tem um passado grandioso e um acervo arquitetônico, de causar inveja às principais ruas da cidade e do país. Inicia-se, na sua parte baixa, na Praça Castro Alves, reduto do carnaval baiano. Mais adiante se junta à Praça Municipal, que abriga o suntuoso Palácio Rio Branco, a parte alta do Elevador Lacerda, a sede da Prefeitura de Salvador, além do Prédio da Câmara dos Vereadores. A Rua Chile, neste ponto, muda de nome para Rua da Misericórdia que desemboca na Praça da Sé que dá acesso ao Terreiro de Jesus e ao Pelourinho.

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O passado de glória desta rua que já se chamou “Direita dos Mercadores” e “Direita do Palácio” e que foi rebatizada em 1902 na ocasião da visita da Esquadra Chilena à cidade, inclui o status de rua mais chique da cidade, onde as senhoras faziam as suas compras nas lojas mais sofisticadas de Salvador. Entretanto é impossível não fazer referência às personagens que fizeram a história desta rua, principalmente à memorável “Mulher de Roxo”, cuja história se confunde com a própria história da Rua Chile.

Ao longo dos 1970, até perto do fim do século passado, uma figura enigmática e até certo ponto amedrontadora, chamava a atenção de todos que passavam pela Rua Chile. Por lá, vagava uma mulher vestida de roxo, com trajes que mais lembravam o hábito usado pelas freiras, o que incluía ainda um grande crucifixo na altura do peito. Apesar de folclórica, a imagem da dama causava os mais diversos tipos de sentimentos, como medo, receio, compaixão, arrepios e até mesmo pena.

Muitos dizem que o rosto por trás da Mulher de Roxo era de Florinda Santos, já outros alegam que se tratava de Doralice. Até hoje a dúvida permanece. A verdade, no entanto, jamais será descoberta, pois foi enterrada junto com seu corpo, em 5 de abril de 1997, quando faleceu aos 80 anos, sendo sepultada como indigente.

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