Saúde

A caixa preta do Hospital Espanhol: MP e TCE investigam os milhões da Desenbahia

Publicado em 25/07/2015, às 12h45   Caroline Gois (Twitter: @bocaonews)


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Enquanto cerca de 1.300 pacientes aguardam, diariamente, na fila da regulação e outros tantos lotam as emergências por falta de vagas, Salvador está há pouco mais de oito meses com um déficit que ultrapassa os 270 leitos. Isso porque um dos maiores hospitais da capital baiana fechou as portas após uma crise oriunda de má administração, cujo resultado foram demissões, transferência de pacientes e abandono dos prédios e equipamentos que prestavam serviço à Saúde pública e particular na Bahia.
Esta semana, o site Bocão News conversou com o promotor da área de Improbidade Administrativa do Ministério Público do Estado da Bahia (MP), Adriano Assis, que revelou um cenário ainda sem respostas sobre o que está por trás da crise do Espanhol e o montante de uma operação milionária ainda não justificado e já na mira do MP e do Tribunal de Contas do Estado (TCE). "Temos duas áreas no MP que tem atribuições em relação a este caso do Espanhol. A área de Saúde - que irá apurar as consequências de atuação na Saúde Pública já que era um estabelecimento credenciado pelo SUS e a área na qual atuo. Na minha área, estamos verificando a questão do empréstimo que foi feito por parte da Desenbahia que tentou viabilizar a retomada das atividades antes da parada completa. Mas, estas atividades já vinham declinando. Infelizmente, não deu certo e o hospital fechou. Estamos analisando esta operação de financiamento e realizando o acompanhamento dela através do TCE para saber se houve regularidade na operação e se foi feita nos termos da legislação. Outro aspecto é garantir que, eventualmente, qualquer operação que envolva o hospital esteja assegurada à devolução dos recursos neste empréstimo e se houve improbidade em 2011", explicou o promotor, ressaltando que há uma liminar que determinou a garantia de indenização ao erário público caso irregularidades sejam encontradas.



Esta investigação gira em torno de um empréstimo no valor de R$ 53 milhões feito pela Desenbahia em 2013, época da crise do hospital. Em 2014, uma reunião entre o Sindicato dos Médicos (Sindmed), representantes do Hospital e do Governo tentou salvar a instituição. Na sede do Ministério Público da Bahia (MP), no CAB, os ânimos foram de acusações sobre de quem é a culpa pela maior crise na saúde pública já vista no Estado.
A reportagem do Bocão News teve acesso, com exclusividade, às conversas que deixaram o clima tenso no local, cuja caixa-preta do Espanhol foi sendo aberta. No local, um dos diretores da instituição apontou o superintendente de Gestão do Sistema de Regulamentação da Atenção à Saúde da Sesab, Andrés Castro Alonso Filho, como responsável por toda crise. "Foi um pecado a entrega do poder da gestão. Andrés tem total culpa pela situação na qual o hospital se encontra. Foi entregue a ele total autonomia para a negociação com forncedores e funcionários", afirmou.
No fim de agosto do ano passado, Andrés foi colocado como sendo também representante da Desenbahia e levou uma proposta aos conselheiros. No dia 28 de setembro de 2014, por cerca de duas horas, 21 dos 40 conselheiros, além de dois representantes do Estado dicustiram a situação do hospital. Após votação definida por 11 votos a 10, ficou determinada a inclusão no contrato junto com a Desenbahia um aditivo que garantia a amortização da dívida do hospital com a estatal, contraída desde o início da crise, em 2012. Com carência de seis meses para quitação da dívida e devendo quatro, o Espanhol tinha dois meses para pagar um valor que ultrapassa os R$ 100 milhões.
Por conta disso, segundo fonte do Bocão News, o representante do Governo e da Desenbahia, o superintendente de Gestão do Sistema de Regulamentação da Atenção à Saúde da Sesab, Andrés Castro Alonso Filho, levou a proposta aos conselheiros. A maioria acatou ao aditivo que tem como termo principal garantir todos os prédios do Espanhol à Desenbahia, que engloba 11 blocos de A a O. Ainda conforme a fonte, os 11 conselheiros que acataram à proposta o fizeram temerosos diante da contraproposta do governo, que seria o fechamento imediato do hospital.
Para esclarecer o que está por trás deste empréstimo, a reportagem procurou a Desenbahia e enviou um e-mail no início da semana com diversos questionamentos referentes ao contrato como, por exemplo: como a Desenbahia buscou assegurar este recurso? Quais foram as garantias? Foi pago em parcelas? Se sim, qual o valor e quantas? O MP aponta inconsistências no quesito jurídico e técnico no contrato deste empréstimo. Como a Desenbahia se posiciona sobre isso? Até este sábado (25), nenhuma resposta foi enviada. A reportagem também procurou o presidente do Conselho Administrativo do Hospital Espanhol, Demétrio Moreira Garcia, que passou o caso Desenbahia para o advogado, mas afirmou: "Estamos empenhados em resolver o problema do hospital e em 40 dias haverá uma negociação pra definir o futuro do hospital". 
Entretanto, em contato com o advogado que representa o hospital, Washignton Pimentel, nenhuma resposta foi obtida pelo site em e-mail enviado também no início da semana. O e-mail foi solicitado pelo próprio advogado, que disse estar em São Paulo no dia do contato. No e-mail, questionamentos semelhantes aos que foram feitos à Desenbahia como: o valor foi pago de uma só vez ou dividido e qual a garantia feita por parte da Desenbahia para ter a devolução deste valor, já que o hospital estava em crise? Onde foi aplicado este dinheiro? Qual o débito total do Espanhol? Como andam as negociações para reativar o hospital? A Amil mostrou algum interesse? Há um prazo para que as negociações sejam finalizadas? 
De acordo com o promotor Adriano Assis, "o relatório do TCE aponta inconsistências  - tanto jurídica quanto técnica neste contrato. Esta é uma das questões. A outra é como foi decidido em que empregar este dinheiro e quais foram as prioridades. A Desenbahia vem prestando detalhes ao MP e estamos apurando como a estatal buscou assegurar este recurso. Quais foram as garantias?  Há critérios a serem atendidos e estamos analisando os critérios deste acordo para saber se houve análise técnica que verificasse se todas as exigências normativas foram preenchidas para não colocar em risco o credor. Tanto que no caso da Caixa Econômica, a Caixa verificou que não haveria viabilidade do retorno da quantia e não emprestou mais."
Com relação ao futuro do hospital e sobre as negociçaões em vigência, o promotor alegou que a condução disso fica a cargo da Real Sociedade Espanhola, que é uma instituição civil e privada. "Como há interesse público envolvido estamos investigando e acredito que o prejuízo seja muito grande", disse. O promotor não soube informar o valor total deste débito. "A Real Sociedade tem este valor. Há não só os empréstimos, mas as questões trabalhistas e passivo bancário, imposto. Isto ainda não foi auditado nem certificado, por enquanto, por nenhuma autoridade pública", afirmou.
Um outro empréstimo recebido pelo Hospital Espanhol foi da Caixa Econômica Federal, cujo valor total foi de R$ 57 milhões. Desse montante, R$ 32 milhões foram repassados e, dos R$ 25 milhões que restavam, apenas R$ 4 milhões foram disponibilizados para o hospital. Por conta disso, o pagamento dos cerca de 600 funcionários cadastrados na insitutição ficou atrasado. Com a crise agravada, o fechamento tornou-se algo inevitável.
O Governo


O governador Jaques Wagner, publicou decreto na página 3 do Diário Oficial do Estado em setembro do ano passo, que torna o Hospital Espanhol entidade de utilidade pública. O decreto 15.425 desapropria além do Hospital Espanhol, o Centro Médico Manuel Antas Fraga, ambos pertencentes à Real Sociedade Espanhola de Beneficência em favor do Estado da Bahia. O decreto diz ainda que a Secretaria de Saúde do Estado (Sesab), com o apoio da Procuradoria Geral do Estado (PGE) fica autorizada a promover os atos administrativos e judiciais, se necessário, em caráter de urgência, com vistas à efetivação da desapropriação e também “imitir-se na posse respectiva, providenciando, inclusive, a liquidação e o pagamento das indenizações, utilizando-se, para tanto, dos recursos que dispuser".

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