Saúde

Crack mudou o perfil de dependentes químicos e usuários terão atendimento 24h próximo às cracolândias

Ilustrativa
Apesar de não ter números, Associação Psiquiátrica da Bahia mensura que quantidade de atendidos é muito inferior à demanda  |   Bnews - Divulgação Ilustrativa

Publicado em 31/12/2017, às 16h46   Tony Silva


FacebookTwitterWhatsApp

Com o novo programa de assistência a pacientes psiquiátricos do Ministério da Saúde (MS), uma das demandas mais crescentes será contemplada com os Centros de Atenção Psicossocial Álcool (Caps-AD) e Drogas 24h, os Caps-IV. Segundo a vice-presidente da Associação Psiquiátrica da Bahia (APB), a psiquiatra doutora Sandra Peu, “há cerca de 25 anos o crack mudou o perfil do dependente químico gravemente comprometido, sem diminuir o problema de dependência ao álcool, que é outra doença de grande incidência e relevância social”.

Foto: reprodução / Senado

A portaria que consolida a nova política de atendimento a pacientes psiquiátricos foi publicada pelo Ministério da Saúde (MS) no Diário Oficial da União (DOU) na última sexta-feira (22) e promete destinar R$ 320 milhões para ampliar e qualificar a assistência aos pacientes de saúde mental. A dependência química tem variações que exigem mais investimentos e empenho dos profissionais.

A psiquiatra comenta a importância de políticas públicas para o tratamento de dependentes químicos. “Existem, também, dependentes de outras substâncias psicoativas ilícitas e a abordagem de tratamento dessas pessoas é distinta. Há, ainda, a grande frequência da presença de dependência química somada à outra doença mental, o que demanda outra especificidade no tratamento. Esse perfil de paciente não contava com políticas públicas comprovadamente eficazes e com tratamento de fácil acesso”, comenta. 

A realidade do atendimento a dependentes químicos em Salvador

A reportagem do BNews procurou números específicos de atendimentos a dependentes químicos em Salvador, mas segundo a psiquiatra, não há levantamentos estatísticos oficiais. Apesar disso, a especialista destaca que “o número de pessoas atendidas em todos os serviços de atendimentos a dependentes químicos é muito menor do que a demanda para atendimento”. “Olhando da janela dos nossos carros quando passamos pela cidade, perdemos facilmente a conta das pessoas usando drogas nas ruas, completamente marginalizadas e sem acesso ao tratamento”, contextualiza. 

Foto: Reprodução

A doutora Sandra Peu explica que os dependentes químicos em Salvador são direcionados para tratamento nos dois Centros municipais de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps-AD), em Pernambués, e Gey Espinheira, no Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas (CETAD), além do Caps-AD estadual Gregório de Matos de modo ambulatorial. 

Apesar dos pontos de atendimento, a psiquiatra destaca uma dificuldade que poderá ser superada com os Caps-IV 24h. “Quem não tem o sentimento de doença, quem mora longe, quem não perdeu os laços sociais pela dependência química, têm muita dificuldade em frequentar esses serviços de saúde”, explica. 

Em casos de emergência, a doutora Sandra Peu sugere algumas unidades hospitalares. “Quando há uma circunstância de emergência psiquiátrica relacionada ao dependente químico, o paciente pode procurar a emergência do Hospital Juliano Moreira ou do Hospital Mário Leal, onde poderá ser internado, por curto período, se necessário e até sair da crise e voltar ao tratamento ambulatorial”, orienta.

A nova esperança para dependentes químicos na nova política de assistência psiquiátrica 

Esperançosa com o novo programa do Ministério da Saúde, a psiquiatra pontua que “a nova reforma psiquiátrica propõe que uma reestruturação nas políticas de saúde para álcool e outras drogas contemple desde programas de prevenção, que sejam comprovadamente eficientes, em contraponto à programas que levaram ao aumento do uso de álcool entre os jovens até a implantação de novos serviços, a exemplo do Caps-IV. Com atendimento 24 horas, os Caps-IV serão implantados próximos a ‘cracolândias’, facilitando o acesso imediato ao tratamento”, comemora.

Foto ilustrativa

Ainda conforme Sandra Peu, o Caps-IV conta com equipe multiprofissional especializada em dependência química e que está apta a atender, inclusive, emergências clínicas, que são frequentes à essa população. Ela ainda explica que para os pacientes com dependência química e com doenças clínicas simultâneas, que precisarem de internação, também está sendo feito incentivo em leitos psiquiátricos em hospitais gerais, com equipes multiprofissionais especializadas em saúde mental, para atuarem em ambiente adequado a esta demanda. 

Reforço no atendimento a dependentes químicos 

A vice-presidente da APB também está otimista com o reforço na rede de atendimento com a soma das unidades terapêuticas. “Essas comunidades terapêuticas já existem, mas não estavam vincularas à rede de saúde. Geralmente, são geridas por instituições religiosas e não estão submetidas à nenhum tipo de regulação que norteie uma proposta para tratamento de doença, que é, o que é a dependência química”, defende. 

A psiquiatra também apontou algumas vantagens da padronização no atendimento oferecido nas comunidades terapêuticas. “Com a soma das comunidades terapêuticas à rede, com investimento direcionado para a qualificação dos serviços, a saúde passa a ter gerenciamento sobre essas comunidades terapêuticas e o atendimento oferecido deve responder a um padrão. Assim, restringe-se a possibilidade de existirem maus tratos, restrição de direitos e segregação dos internados nestas instituições. Além disso, estar internado em uma comunidade terapêutica é um ato de decisão voluntária e que deve ter essa garantia estabelecida”, mensura. 

Sandra Peu analisa que “a nova reforma não retira nenhuma possibilidade do paciente em usufruir das estratégias terapêuticas já existentes e ainda soma novas estratégias, novos serviços, com a pretensão de serem mais bem qualificados, adequados à necessidade de cada pessoa e de mais fácil acesso”.

O ciclo que arrasta vítimas

A psiquiatra também chama a atenção da sociedade: “A medida que o crack avança pela Bahia, o número pacientes consequemente aumenta. Quanto mais drogas, mais dependentes químicos, mais trabalho e mais gasto de recursos no tratamento de saúde mental. A relação entre tráfico de drogas, dependência química e criminalidade é forte e faz outras vítimas de problemas psiquiátricos além dos usuários. Pessoas que moram em regiões periféricas em estado de guerra acabam sofrendo de depressão recorrente, ansiedade generalizada e transtorno de estresse pós-traumático”.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp