BNews Turismo
Publicado em 12/09/2023, às 11h13 Divulgação Rafael Albuquerque
O escândalo que envolve a 123 Milhas tomou proporções gigantescas em decorrência da quantidade de clientes que foram lesados. Muitos consumidores foram surpreendidos com a suspensão da venda de bilhetes de passagem “Tarifa Promo”.
Além de suspender a venda dessas tarifas promocionais, a empresa deixou claro que não iria honrar as passagens já compradas e que faltavam ser emitidas, causando ainda mais revolta entre os consumidores.
Diante dos fatos, da repercussão negativa e da situação enfrentada pela 123 Milhas em decorrência da quantidade de processos ajuizados pelos consumidores, o grupo, para se proteger, ajuizou pedido de Recuperação Judicial. O problema é que esse pedido suscitou muitas dúvidas.
Consultado pela editoria BNews Turismo, o advogado Filipe Vieira, ex-superintendente do Procon Bahia, explicou a situação.
Filipe Vieira, advogado e ex-superintendente do Procon Bahia
“A Recuperação Judicial é uma alternativa, disposta em Lei, que só pode ser usada por empresas que estejam regulares e legalizadas junto aos órgãos públicos. No caso, a Lei permite que uma empresa – que esteja endividada, ou com problemas no fluxo de caixa ou na realização dos seus negócios – solicite auxílio judicial para reequilibrar e recuperar seu negócio que esteja se perdendo”, disse.
Desde modo, a Recuperação Judicial é a intervenção feita por ordem de um Juiz, que nomeia um novo administrador judicial, para que ele passe a gerenciar aquela empresa. O objetivo é é equilibrar todas as dívidas e garantir todas as fontes de receita da empresa para a retomada da atividade de modo assertivo e o pagamento todas as dívidas.
Segundo Vieira, “é criada uma lista com o nome de todos os credores, para quem a empresa deve dinheiro ou deva obrigatoriamente prestar algum serviço, ordenada pela classe do credor: Trabalhador da empresa – esses credores tem o direito assegurado de ter salários e vencimentos pagos antes de todas as outras dívidas da empresa; Credor Real – que é o nome jurídico daquele credor que teve sua dívida assegurada por algum bem ou patrimônio da empresa, como aqueles casos em a pessoa compra um veículo que fica como garantia (ou alienado) da própria dívida; ou um imóvel que está no nome de uma empresa e só seria da 123 Milhas, “se” ou “quando” ela terminasse de pagar a dívida; Credor Comum (“Credor Quirografário”) – classe de todos os demais credores da empresa, dentre os quais os consumidores que compraram passagens com tarifas promocionais junto à 123 milhas ou HotMilhas (mesmo grupo empresarial)”.
Clique aqui e se inscreva no canal do BNews no Youtube!
Quando a Justiça defere a recuperação, de imediato são congeladas todas as dívidas da empresa, além de poder suspender o andamento de todos os processos que existam contra a empresa e que gerem obrigações de pagar algum valor ou indenização. “Todos os atos de gestão passam a ser acompanhados pelo juiz, pelo administrador judicial e por um conselho de credores, representando cada uma das classes mencionadas a cima”, afirma o advogado.
A referida Recuperação Judicial foi deferida pela 1ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, e isso, segundo o especialista, “tem impacto direto na administração da empresa, na condução dos negócios, no congelamento das dívidas e no cumprimento das obrigações assumidas pela empresa. Os principais efeitos diretos que recaem sobre os direitos dos consumidores são: 1) o cumprimento da obrigação assumida em emitir os bilhetes de passagem; 2) a suspenção dos processos ajuizados contra a empresa”.
No primeiro caso, informa Filipe Vieira, o indicado para o consumidor que não teve o bilhete emitido é o seguinte: “manter contato direto com a empresa para verificar a situação do seu bilhete e verificar a solução possível, entre elas: i) pedir a efetiva emissão do bilhete, indicando data e destino da viagem, caso já tenham sido definidos; ii) o cancelamento da compra e a restituição da quantia paga, na mesma forma da compra (dinheiro, cartão de crédito, pontos de milhagem); iii) a emissão de um voucher ou créditos para uma futura e nova compra junto a 123 milhas ou parceiras comerciais. Esses pedidos podem ser feitos também na Justiça”.
O ex-superintendente do Procon deu algumas orientações aos consumidores que têm pendências com a 123 Milhas: “Para quem já ajuizou ou para quem pretende ajuizar, nossas recomendações são as de mantenha o espírito conciliatório, para facilitar a obtenção amigável do seu direito, e, para não ter seu processo totalmente paralisado, busque obter uma ‘sentença declaratória’. Uma sentença dessa natureza além de reconhecer o seu direito, através da formação de um título executivo judicial, pode ser usada para você se alistar no rol de credores da empresa, com maior agilidade”.
Questionado sobre o modus operandi da 123 Milhas, de vender um “produto futuro”, ”, pois a viagem não tinha nem data nem prestado direto definidos, Filipe Vieira destacou:
Um ponto central e bastante problemático na política de vendas da 123 Milhas era a TARIFA PROMO, pois neste negócio, não se tinha certeza sobre qual produto seria vendido ao certo para o consumidor que só tinha as informações completas em momento posterior, quando o bilhete aéreo emitido. Vender algo que virá a existir não é um problema por si só, como o restaurante que vende um prato que não foi preparado ainda, ou empresa que vende um móvel planejado que nem foi fabricado ainda, ou qualquer produto customizado que ainda nem saiu o papel. Em todos esses casos a coisa não existe, por questões circunstancias de modo que embora não exista, é muito certo que virão a existir”.
Ainda segundo o especialista, o problema no caso da 123 Milhas parece ter tomado grandes proporções pela captação financeira que eles fizeram, pela quantidade de vendas de Tarifa Promo que operaram, e o tanto de passagem que, agora estando muito mais cara, teriam que arranjar meios de emitir: “Essa captação tão alta e valores, para produtos improváveis de serem emitidos, ascendeu o alerta para o fato de, em verdade, a empresa está operando como um tipo de pirâmide financeira, ou poupança popular, ao prometer aquilo que – e aqui está um ponto crucial – sabidamente não iriam conseguir cumprir”.
O advogado finalizou a entrevista respondendo qual a grande lição que fica sobre esse assunto: “O caso da 123 Milhas precisa de atenção especial dos órgãos judiciais, dos órgãos de proteção ao consumidor e dos próprios clientes, valendo a máxima antiga que dizia ‘Quando a esmola é muito boa, o Santo desconfia!’. Ou seja, quando a vantagem em um negócio é muito boa, o consumidor deve ficar atento para os meios de prova de que aquela oferta, promessa, promoção, condição vantajosa e imperdível poderá ser realmente cumprida. Interessante notar, inclusive, que aquele dito popular, encontra fundamento nos art. 30 e 35 do Código de Defesa do Consumidor, instituído pela Lei Federal nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 e, por isso, acaba de completar 33 Anos de existência”.
Código de Defesa do Consumidor completa 33 anos de “lutas e conquistas”, afirma especialista na área
CPI revela que 123Milhas enviava e-mail pedindo para cliente mentir às empresas aéreas; veja