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‘Tenho necessidade de uma resposta’, diz mãe de professora de dança morta em acidente na Pituba

Vagner Souza/BNews e Arquivo pessoal
Amigos e familiares de Geovanna Lemos, 41 anos, se mobilizam para que o o caso não seja esquecido   |   Bnews - Divulgação Vagner Souza/BNews e Arquivo pessoal

Publicado em 06/05/2018, às 13h30   Vinícius Ribeiro


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A uma semana do Dia das Mães, Glovildes Alves Santos, a 'Tia Vida' ou ‘Dona Vidinha’, mãe da professora de dança Geovanna Alves Lemos, 41, morta no dia 15 de março em um acidente automobilístico na Pituba, em Salvador, vive a angústia de não ter respostas para a perda da única filha. Desde aquele dia, a vida da senhora de 70 anos parece ter perdido o sentido. 

Em entrevista ao BNews, na manhã deste domingo (6), a servidora pública aposentada quebrou o silêncio após 52 dias do acidente fatal. Durante este período, ela não queria falar. Não queria polemizar. Mas a demora em obter respostas e o temor por esquecimento do caso a fizeram mudar de ideia. 

Com os olhos marejados, Tia Vida nos recebeu no prédio onde ainda reside na Barra, acompanhada de uma amiga de Geovanna, a professora de Dança da Ufba, Marcia Mignac, que sinalizou logo de início que o domingo é um dia difícil para a idosa. "Era quando elas tinham mais tempo para ficar juntas", lembrou. As duas vestiam camiseta branca, que exibia a imagem de Geovanna e o clamor por justiça.

"No domingo ela comprava pão, passeava com o cachorro e voltava. A gente tomava café... conversava, só nós duas", disse Tia Vida, recordando da rotina da filha nos momentos de folga. 

Cheia de sonhos, além de dar aulas de Dança, Geovanna estudava pedagogia e lecionava em colégios particulares de Salvador. Na Ebateca, era professora de balé. "Ela era apaixonada por crianças", frisou Tia Vida. Segundo fez questão de ressaltar, o carinho era recíproco. "Lá na hora do acidente, uma funcionária do Sartre virou pra mim e disse: 'Mãe, olha o que eu trouxe'. Era um bilhete de um aluno que ia levar pra ela. Ele ia entregar naquele dia", lamentou a idosa. Geovanna queria se especializar em educação inclusiva.

"É A MINHA FILHA, MOÇO"

Por volta das 12h30 do dia 15 de março, dona Glovildes recebeu o telefonema que iria mudar sua vida. Do outro lado da linha, alguém do colégio Sartre, onde a Geovanna lecionava, informava que a filha havia sofrido um acidente. Em um táxi, a mãe foi ao local e, antes mesmo de chegar ao ponto da batida, ouviu o burburinho que indicava o pior.

"Eu perguntei a um lavador de carros e ele disse: 'a mulher está morta ali'. Quando ele disse aquilo, eu disse: 'É a minha filha'. Quando cheguei ao local, falei com um policial e vi o corpo coberto. Vi que era ela pelo sapato, única parte que não estava coberta", lembrou em prantos. "É a minha filha, moço. E agora? O que é que é que eu vou fazer da minha vida?", completou, enquanto era amparada por um policial militar. 

Tia Vida conta que ficou em estado de choque e apenas depois, ao ouvir policiais e populares conversando, foi se dar conta do que havia provocado o acidente.

Geovanna ia para o Sartre, onde daria aula naquela tarde. Como sempre fazia, era transportada pelo mototaxista Luciano da Silva Lopes, o "Seu Galego". De acordo com testemunhas, a motocicleta onde Geovanna estava foi atingida por trás pelo carro da médica Rute Queiróz, 49. À polícia, a condutora do veículo alegou ter perdido a consciência pouco antes da colisão, que arremessou Geovanna. Ainda de acordo com os relatos, no chão, o corpo da vítima ainda foi atropelado pelo veículo da médica.

Segundo a família da professora de dança, desde o dia do acidente, traumatizado, o mototaxista não teve condições de voltar a trabalhar. Sem a moto e com medo do trânsito. Os advogados da médica teriam entrado em contato com "Seu Galego" nesta semana. Geovanna sempre chamava sempre o mesmo mototaxista, conforme lembra a mãe. "Ela dizia que ele sempre foi muito cuidadoso", disse.

Dona Vidinha salientou não ter mágoa da suposta responsável pela morte da filha, mas exige que o caso seja apurado e não caia nas raias da impunidade. "Tenho necessidade de uma resposta. Não quero incriminar ninguém, até porque sei que ela (a médica) é mãe, e não queria que isso estivesse acontecendo. Mas quero justiça, por minha filha", disse à reportagem

A médica Rute Queiróz disse ter sido diagnosticada por um cardiologista, em novembro do ano passado, com fibrilação atrial (falha no batimento do coração). Apesar do alerta, não foi houve recomendação para a suspensão de atividades como dirigir.  

O caso é investigado pela 16ª Delegacia Territorial (DT/Pituba). De acordo com a defesa da família de Geovanna, o inquérito ainda não foi concluído. À época, a previsão da Polícia Civil era de conclusão em até três semanas. Apesar do pedido da defesa da família, não houve reconstituição do acidente. 

BAZAR - Para ajudar Tia Vida com "os gastos inesperados" ocasionados pelo sepultamento e mudança para o interior (leia mais abaixo), amigos se mobilizam para arrecadar fundos para colaborar com a idosa. Neste sábado (5), a amiga Marcia promoveu em casa um bazar com roupas utilizadas por Geovanna ao longo de 12 anos de dança do ventre. "Vendemos cerca de 25% do material. Muitos que compraram disseram que não sabiam se iam usar, pegaram para ajudar mesmo. A lembrança é muito forte", contou.    

Após um mês do acidente, amigos e familiares realizaram um ato no local do acidente. Além de cobrar a resolução do caso, os manifestantes alertaram com faixas e cartazes para os riscos no trânsito. A ideia ainda é fazer um jardim no canteiro do local do acidente com o nome da professora de dança. Ações que recordam o caso também são compartilhados nas redes sociais, a exemplo do vídeo abaixo. "Não queremos incitar o ódio (contra a médica), mas precisamos nos mobilizar por justiça", explicou Marcia.

Sozinha em casa, Tia Vida foi convencida por familiares a voltar para Ilhéus, no Sul da Bahia, onde ela e a filha nasceram. "Não faz mais sentido viver aqui, sem ela", finalizou a conversa.

Na cidade natal, Tia Vida irá reencontrar o cachorro Pingo (levado logo após o acidente), com quem a filha Geovanna passeava todas as manhãs pelas ruas da Barra.

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