Artigo

O bom, o mau e o (muito) feio - Os poderes e as responsabilidades dos síndicos

Arquivo pessoal
Bnews - Divulgação Arquivo pessoal

Publicado em 27/07/2021, às 08h00   Tiago Alves


FacebookTwitterWhatsApp

“Há um novo xerife na cidade”. Tal como em um filme antigo, esse é o sentimento que permeia um condomínio após a assembleia geral de eleição do(a) síndico(a). Mesmo sem o bangue-bangue ou as emocionantes corridas de cavalos, é nítido perceber que a figura do(a) síndico(a) desperta o senso de autoridade, cabendo aos moradores o devido respeito e obediência a determinados comandos.

De fato, o(a) síndico(a) detém poderes. Ainda que não porte uma estrela dourada no peito, a legislação dá autoridade ao titular da administração do condomínio para o exercício de suas funções. Logo, é possível que ao síndico(a) emitir notificações por irregularidades, aplicar multas e restrições, processar moradores e/ou pessoas estranhas ao condomínio pelo cometimento de alguma ilegalidade, convocar assembleias quando lhe aprouver, dentre outros.

Esses poderes são relevantes para a administração de um condomínio. Seja em um pequeno edifício com poucas unidades, ou um condomínio do tamanho de um bairro, verifica-se que os dilemas de administrar um ambiente comunitário são muitos.

Nesse sentido, percebe-se que nem todo poder está expresso na lei em letras garrafais. Um exemplo disso foi visto em plena pandemia, quando os(as) síndicos(as) se viram em dúvidas de como proceder frente à obrigatoriedade do uso de máscaras em espaços comuns. Notifica? Aplica multa? Chama a polícia? Manda prender e processa? E assim, diversos(as) síndicos(as) enxergaram situações sem saber se suas armas eram realmente úteis.

Para o bom manejo dessas armas, a lei deixou uma bússola a orientar os diversos administradores de condomínio. Na ausência de norma expressa, os poderes do(a) síndico(a) deverão ser acionados sempre que a situação de fato trouxer risco a três S’s: Segurança, Salubridade e Sossego. Desse modo, ao se deparar com problemas que comprometam essa regra de ouro, deverá o(a) síndico(a) analisar a questão e intervir do modo mais adequado ao imóvel e seus condôminos.

Ainda que não expresso na lei, cabe destacar um quarto S a ser ponderado: o bom Senso. Por mais habilidoso(a) que o(a) síndico(a) seja com as armas que a lei lhe proporciona, não se mata uma mosca na parede com uma bazuca. A aplicação das normas pela administração prezará pelo bem comum, posto que a principal função do(a) mandatário(a) não é ser carrasco(a) do prédio.

Sim, o mandato do(a) síndico(a) tem poder.

É válido perceber, no entanto, que a lógica por trás de todas as atribuições conferidas a quem administra está vinculada ao serviço. Síndico(a) poderoso(a) assim existe para cumprimento de deveres. E não são poucos.

O mais importante deles é o de cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia. O que passar disso, ainda que por má interpretação, pode estar sujeito a punições. É um poder que se sujeita à vontade de todo o condomínio, devendo-se expressar de acordo e nos limites das decisões da comunidade.

Nos filmes de faroeste, como “O Bom, o Mau e o Feio”, a lógica é: “O mundo está dividido em duas categorias: aqueles com arma carregada e aqueles que cavam. Você cava”. No caso de um condomínio, a lógica é outra: “O(a) síndico(a) está com a arma carregada. E, por isso mesmo, ele(a) cava”.

Por conta do cumprimento da convenção e dos outros documentos e decisões, surgem outros deveres do(a) síndico(a). Deve a administração elaborar o orçamento, prestar contas anualmente e sempre que forem exigidas, dar conservação à coisa comum, zelar pela prestação de serviços nas áreas comuns, dever de informação quanto a eventuais processos judiciais e administrativos contra o condomínio, dentre outras.

Na leitura desses comandos, percebe-se até que os poderes do(a) síndico(a) podem ser entendidos, na verdade, como um conjunto de “poder-dever”. Existem algumas ações, como a convocação de assembleia, por exemplo, que deixa de ser mero poder quando o assunto em questão é a prestação de contas (tanto que é lícito ao condômino propor ação para a convocação da assembleia, como já visto aqui.

O não exercício do poder-dever, portanto, pode implicar em sanções à administração, inclusive através da responsabilidade civil de ressarcir aos cofres do condomínio quando o caso assim o exigir.

“Grandes poderes, grandes responsabilidades”, como já muito ensinado na cultura popular dos quadrinhos e dos filmes. Há quem diga que a vida imita a arte. É necessário, entretanto, que o(a) síndico(a) saiba bem o papel que deseja reproduzir, sob pena de transformar o ambiente condominial em uma terra de ninguém.

De todo modo, prepare a pipoca. Administrar um condomínio tem suas emoções.}

Tiago Almeida Alves é advogado formado pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS, membro da Comissão de Condomínio do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM), e atualmente cursa o MBA em Gestão de Escritórios de Advocacia e Departamentos Jurídicos na Baiana Business School (Faculdade Baiana de Direito). 

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp