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Vale ouro: A LGPD e os condomínios

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Bnews - Divulgação Arquivo Pessoal

Publicado em 10/08/2021, às 08h00   Tiago Almeida Alves*


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Os ciclos de produção de riquezas mudaram os fluxos da economia no mundo inteiro. Seda, pau-brasil, cana-de-açúcar, pedras preciosas, café, petróleo, soja... o mundo mudou a cada nova “febre” econômica, e a busca por essas riquezas transformou as relações entre os povos.

O “ouro” do Século XXI, entretanto, não se extrai de uma mina, nem se planta na terra. O que move a economia do planeta hoje são os dados. Informações de bilhões de pessoas, empresas e governos circulam pelo globo – e são comercializados por isso. As empresas mais valiosas do mundo atual têm como principal modelo de negócios a guarda e o compartilhamento de dados pessoais.

Enquanto você lê esse texto, há transmissão de dados. Com o seu aparelho, com o seu navegador, com a sua internet. Não, ninguém está te hackeando enquanto você lê essa coluna. Mas a mina de ouro das informações transformou o mundo - e trouxe o alerta às autoridades.

Seguindo as legislações de outros países, o Brasil entendeu a necessidade de criar uma legislação para proteger os dados de pessoas, empresas e governos: é a chamada Lei Geral de Proteção de Dados, ou LGPD. De acordo com a lei, deve-se ter a cautela necessária ao lidar com dados pessoais de terceiros e cumprir as exigências legais, sob possibilidade de punição em caso de descumprimento.

E qual é o impacto da nova lei aos condomínios?

O condomínio contém em suas pastas dados sensíveis de seus moradores e trabalhadores. Tais dados, ainda que não tenham implicação econômica direta, podem sofrer exposição caso não haja o devido tratamento deles.

Cabe um exemplo:

Imagine um condomínio que não exerça o devido tratamento de dados, e nem exige das suas empresas terceirizadas que tomem o cuidado necessário com as informações que dispõe. Numa matéria de jornal, descobre-se que uma empresa de cobrança terceirizada do condomínio compartilhou os dados de CPF dos moradores a terceiros sem autorização e de modo indevido.

Está aí um prato cheio para dores de cabeça - e para as sanções.

Em 1º de agosto de 2021 entraram em vigor as punições por descumprimento da LGPD. Dentre elas encontram-se advertências, multas sob faturamento e diárias (algumas até milionárias, a depender da realidade financeira do infrator), suspensões e bloqueios de bancos de dados, dentre outras. Algumas delas podem, inclusive, sobrar para o próprio condomínio. E lá se vai mais uma taxa extra, dessa vez por falta de cuidado com os dados dos moradores.

Se os dados são valiosos para a economia, sua proteção é tão importante quanto aos síndicos de condomínio. Existem cuidados básicos que um condomínio pode tomar como atitudes válidas para proteção de seus condôminos.

Destacam-se três.

A primeira atitude é a do consentimento. De acordo com as regras de transparência da nova lei, é necessário que haja o devido consentimento na captação de dados de moradores pelas administradoras de condomínio e/ou síndicos profissionais. Autorizações expressas (por formulário escrito ou até mesmo eletrônico) são essenciais para isso.

A segunda atitude é a de descarte dos dados. Trazendo a realidade dos condomínios, ex-moradores não são obrigados, em regra, a manterem suas informações pessoais nos bancos de dados dos condomínios e administradoras, podendo exigir o descarte dos dados. Para tanto, é necessário que haja organização adequada das informações, para se ter certeza que tudo foi devidamente excluído, quando solicitado.

A terceira atitude é a da retenção dos dados. Imagine-se que um ex-morador deseje a exclusão de seus dados, mas se percebe que há um débito de ordem condominial contra si. A legislação permite, em casos como estes, que os dados sejam retidos pelo condomínio até a regularização do débito. Mas é necessário haver clareza nos motivos pelos quais os dados são retidos. Até será cabível ao condomínio, a depender do contexto, criar uma Política de Privacidade, para facilitar essas questões.

À primeira vista, os assuntos sobre proteção e tratamento de dados parecem ser um outro idioma aos condomínios, algo distante e desnecessário de se discutir. Sendo os dados uma mina de ouro à economia, cabe ao síndico proteger o patrimônio de seus moradores.

E, cá entre nós, nunca se protegeu tanto ouro com atitudes tão simples.

Tiago Almeida Alves é advogado graduado em Direito pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS, membro da Comissão de Condomínio do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM), e atualmente cursa o MBA em Gestão de Escritórios de Advocacia e Departamentos Jurídicos na Baiana Business School (Faculdade Baiana de Direito). 

Classificação Indicativa: Livre

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