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A armadilha: cuidados com o ITBI na compra de imóveis

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Bnews - Divulgação Arquivo pessoal

Publicado em 23/11/2021, às 12h28   Tiago Alves


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A operação de compra e venda de imóveis demanda bastante atenção. Sem o olhar precavido, uma aquisição de terreno ou de imóvel construído pode-se transformar de um sonho em um tortuoso (e caro) pesadelo. 

Transferir imóveis de modo regular e seguro envolve custos, tanto ao comprador quanto ao vendedor. E não são poucos: escritura pública, taxa de registro ao cartório de imóveis, reconhecimentos de firma, comissão ao corretor de imóveis, diversos emolumentos e impostos. Isso sem contar outras despesas que podem surgir, como taxas de desmembramento, avaliação do imóvel, averbações, sinal público, procurações públicas, projetos arquitetônicos e honorários advocatícios.

Na tentativa de enxugar tais despesas, não é incomum encontrar compradores e vendedores a acertar preços contratuais distintos do que é efetivamente pago. Explico: o vendedor A anuncia o seu imóvel à venda por R$ 200 mil. A compradora B se interessa e fecha acordo de pagamento nesse preço. Na análise da venda, contudo, percebem a incidência de imposto de transferência do bem imóvel (ITBI, ou ITIV, a depender da prefeitura) calculado sobre o valor da transferência. Simulam no contrato, ao visar diminuição do imposto, compra e venda do mesmo imóvel no valor de R$ 100 mil. 

Ao final, entendem como vantajosa a operação, pagam os valores em questão e seguem suas vidas. 

O vendedor A e a compradora B, ao simularem tal valor (o que pode ser configurado como fraude), caíram na armadilha do ITBI mais barato. Somado ao olhar desatento na compra e venda do imóvel, não faltarão riscos a ambos os lados. 

Imagine-se que o imóvel em questão, de caráter residencial, fosse vendido por representante de pessoa jurídica (ex: uma imobiliária). No momento da aquisição, o imóvel encontrava-se ocupado por uma família inquilina, a qual possuía contrato de locação devidamente registrado na matrícula do imóvel. 
Tal hipótese não é incomum – e até pode ser entendida como corriqueira. Mais incomum ainda, entretanto, é o fato de compradores de imóveis não realizarem pesquisas prévias dos imóveis e de seus vendedores. E na falta de boa precaução, o remédio poderá ser amargo. 

Nesse mesmo exemplo, caso o inquilino não tenha tomado conhecimento da oferta da compradora B, poderá, em seis meses, pedir ao Judiciário a concessão de seu direito legal de preferência, igualando-se o valor pago. Relembremos: qual era o valor do contrato? Dessa forma, o imóvel será vendido por preço abaixo do valor de mercado – e, legalmente, a compradora B estaria no prejuízo. 

A vendedora A, de má-fé, poderia utilizar-se de artifício legal para indicar-se lesada por pagamento abaixo do valor de mercado, pedindo a anulação ou que o preço da escritura seja devidamente complementado. A prova? O contrato assinado no valor de R$ 100 mil. Até se provar algo distinto, já se foram meses de processo, custas judiciais e honorários de advogados. 

Explorando mais ainda a hipótese, seria possível que a imobiliária A estivesse a dever na praça, através de diversos processos judiciais, não analisados pela compradora B. Eventual credor de A poderia utilizar a escritura (relembre-se, pública) para demonstrar ao Judiciário a existência de conluio entre A e B, anulando-se a venda. Motivo? Preço pago bem abaixo do valor de mercado. 

Não para por aí. Imagine-se que nada disso ocorreu e toda transação foi pacífica, mesmo com valor abaixo do mercado. Na hipótese da compradora B decidir por revender o imóvel, a proprietária encontrará outro entrave. A Receita Federal, na análise de seu Imposto de Renda, provavelmente constatará ganho de capital. Ainda que o imóvel seja revendido pelo mesmo preço efetivamente pago (R$ 200 mil reais), estará registrada a venda por R$ 100 mil. Logo, uma simulação a evitar mais impostos incidiria em mais impostos.

Se os motivos da esfera civil e tributária não forem suficientes, há repercussão criminal. A emissão de declaração falsa para evitar, ainda que parcialmente, o pagamento de tributos é crime, daqueles que ensejam detenção de até dois anos, fora a multa. Caso o Poder Público descubra a fraude em tempo oportuno, ainda serão devidos os impostos excedentes e multa tributária.

Vê-se, aqui, dois problemas comuns. O primeiro é o risco na burla de impostos. Na busca da economia de poucos milhares de reais (R$ 3 mil no exemplo em questão, considerando a taxa atual da cidade de Salvador), vendedor e compradora puseram uma operação simples em grande perigo. O segundo, tão problemático quanto, é a falta de cuidado na compra de imóveis. Pela alta soma de valores, a compra de imóveis requer análise moderada, através de pesquisa e investigação (a chamada due diligence).

Ao deparar-se com uma armadilha, surgem duas opções: fugir ou cair. É necessário, para tanto, saber da existência dessas camas-de-gato. Que os compradores e vendedores de imóveis possam enxergar os alçapões jurídicos – e escapar deles.

Tiago Almeida Alves é advogado graduado em Direito pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS, membro da Comissão de Condomínio do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM), e atualmente cursa o MBA em Gestão de Escritórios de Advocacia e Departamentos Jurídicos na Baiana Business School (Faculdade Baiana de Direito). 

Classificação Indicativa: Livre

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