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A morte da democracia pelas mãos da OAB

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Eleições da OAB já finalizaram em quase todos os Estados da Federação  |   Bnews - Divulgação Divulgação

Publicado em 28/11/2024, às 18h49   Ruy João Ribeiro



No mês de novembro do ano de 2023, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) promoveu mudanças nas regras eleitorais, por meio do Provimento 222 de 2023, para manter o poder das atuais lideranças e fragilizar o Estado de Democrático de Direito. O objetivo é tentar reeleger o atual Presidente Nacional da OAB, o advogado Beto Simonetti, e sepultar a histórica regra de alternância do mandato de presidente da OAB nacional por cada região do país.

As eleições na OAB de cada estado ocorrem simultaneamente em todo o Brasil, na segunda quinzena de novembro, a cada três anos. Cada estado da Federação tem um Conselho Seccional (representação estadual) e respectivas subsecções (representação municipal), variando de acordo com a quantidade de advogados e municípios.

O Provimento 222/2023 trouxe mudanças que acabaram por beneficiar os grupos que estão no exercício do poder, consolidando um sistema onde a reeleição ou eleição dos candidatos da situação é quase inevitável. Uma das mudanças no provimento é a redução do tempo de campanha para 30 (trinta) dias antes da data do pleito.

Outro exemplo estarrecedor e que demonstrou, na prática, uma violação às regras ao Estado Democrático de Direito, ao princípio da igualdade de oportunidade aos candidatos (paridade de armas), foi a permissão de que os candidatos da situação não se desincompatibilizassem dos seus cargos e usassem, sem cerimônia, toda a estrutura da máquina institucional no período pré-eleitoral e durante a campanha.

A falta de mecanismos que garantam a igualdade de condições entre as chapas da situação e oposição reforçam a ideia de que as eleições da OAB de 2024, na prática, se tornaram um jogo de cartas marcadas, com propósito específico.

As eleições da OAB já finalizaram em quase todos os Estados da Federação, faltando apenas a realização do pleito no estado do Piauí (30/11), o que permite afirmar que o Provimento 222/2023 cumpriu seu papel: eleger ou reeleger quase à unanimidade os candidatos da situação, com uso escancarado da máquina institucional!

Veja o resultado das eleições da OAB 2024 entre situação e oposição:

OAB/AC (reeleito), OAB/AL (reeleito), OAB/AM (reeleito), OAB/AP (situação), OAB/BA (reeleita), OAB/CE (situação), OAB/DF (situação), OAB/ES (oposição), OAB/GO (reeleito), OAB/MA (reeleito), OAB/MG (reeleito), OAB/MS (reeleito), OAB/MT (reeleita), OAB/PA (oposição), OAB/PB (reeleito), OAB/PE (situação), OAB/PI (30/11), OAB/PR (situação), OAB/RJ (situação), OAB/RN (situação), OAB/RO (reeleito), OAB/RR (reeleito), OAB/RS (reeleito), OAB/SC (situação), OAB/SE (reeleito), OAB/SP (situação), OAB/TO (reeleito).

Na Bahia, foi possível testemunhar os mais diversos abusos políticos e econômicos, antes e durante a campanha, em favor da atual direção da OAB-BA. Em contrapartida, foram criados inúmeros obstáculos para que a oposição não exercesse o direito de concorrer em condições de igualdade. Exemplificativamente: a)  lançamento antecipado da chapa, em período proibido; b) impulsionamento da conta de Instagram da OAB-BA e dos candidatos; c) entrega de mais de 250 medalhas para a advocacia veterana em período pré-eleitoral; d) inauguração/reinauguração de salas da advocacia em centenas de municípios em período pré-eleitoral; e) realização de dezenas de cursos em período pré-eleitoral; f) escolha do dia da eleição entre dois feriados nacionais, com propósito de gerar abstenção na capital; g) eleição de forma presencial, no estacionamento do maior Shopping Center da Bahia, causando transtorno e impedindo centenas de advogados(as) de votarem, muito embora já se tivesse adotado a votação on-line para a última eleição do Quinto Constitucional;  h) falta de entrega de lista completa de advogados aptos a votar; i) campanha com custo elevadíssimo, estimado em milhões de reais, com utilização de trio elétrico em carreata, balões utilizados em campanhas partidárias, festas com bandas caríssimas e bebidas alcoólicas; dentre outras dezenas de circunstâncias que revelam, inequivocadamente, o desequilíbrio entre as chapas da situação e oposição.

O resultado eleitoral, no entanto, desagradou a atual gestão: abstenção de mais de 65% de advogados(as), deslegitimando a próxima diretoria; derrota em mais de 95% das urnas da jovem advocacia; derrota na capital do Estado (Salvador); derrota em grandes subseções, a exemplo de Vitória da Conquista, o segundo maior colégio eleitoral do interior; fim da hegemonia no colégio de presidentes das subseções. Com isso, a oposição da Bahia saiu como uma das mais fortes de todo o Brasil, com a advocacia da baiana dividida.

Esse resultado eleitoral incomodou tanto a atual gestão que foi anunciada para a primeira sessão do Conselho Pleno, dia 29/11/2024 - dez dias após a realização da eleição – uma proposta de alteração da forma de eleição para o Quinto Constitucional, mudando de eleição direta (consulta direta à classe) para a eleição indireta (conselho escolhe os advogados que podem ser votados pela classe).

A falha em garantir a verdadeira alternância de poder nas eleições internas da Ordem compromete o discurso republicano da OAB, compromete sua missão de defender as prerrogativas da classe e os direitos fundamentais da sociedade civil, colocando em risco a representatividade e a diversidade de vozes necessárias para que a Ordem continue a cumprir seu papel com legitimidade perante a sociedade.

É possível afirmar que a atual gestão da OAB-BA, em que pese já estar há 12 anos no poder e ter garantido mais três anos (2025/207), pretende se perpetuar no poder, o que representa, lamentavelmente, a morte da democracia dentro da OAB-BA, uma das entidades mais importantes do Estado Democrático de Direito, cujo papel social precisa ser inegociável.

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