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Agricultura de precisão ajuda a produzir vinhos diferenciados na Bahia

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A colheita de uvas no inverno ocorre em 267 hectares, inclusive na Bahia  |   Bnews - Divulgação Pixabay

Publicado em 08/09/2022, às 18h49   Redação BNews


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Um levantamento feito pela Associação Nacional de Produtores de Vinhos de Inverno (Anprovin) mostra que o cultivo da videira no Brasil para a colheita de uvas no inverno ocorre em 267 hectares. São mais de 400 mil litros de vinho por ano e de 500 mil garrafas, produzidos por 35 associados presentes em cinco estados brasileiros, entre eles a Bahia.

Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em São Paulo, a mais de 700 metros de altitude, um vinhedo está colhendo os resultados da aplicação da vitivinicultura de precisão. De acordo com pesquisadores, a variação dos atributos do solo e da planta ocorre mesmo em pequenas áreas de um vinhedo permitiu a colheita seletiva de uvas ‘Syrah’ e a obtenção de vinhos finos de inverno com características distintas.

A variabilidade espacial e temporal em pequenos vinhedos foi comprovada em pesquisa realizada pela Embrapa na vinícola Terras Altas (Ribeirão Preto, SP), em parceria com a Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Botucatu (SP), e o Núcleo Tecnológico Epamig Uva e Vinho, em Caldas (MG).

Realizado no modelo on farm research, que permite o estudo direto na propriedade agrícola, durante o ciclo da cultura da videira para vinho, o trabalho avaliou dois anos de produção de uva - 2020 e 2021 - em sistema de dupla poda. Nele, uma poda é realizada em agosto para indução do ciclo vegetativo e outra entre janeiro e março, para indução do ciclo produtivo e colheita de uvas no inverno.

“É um trabalho inédito em nossas condições de produção. E vem complementar a técnica de produção da dupla poda, aprimorada pelos pesquisadores da Epamig”, afirma o diretor da vinícola Terras Altas, o engenheiro agrônomo Ricardo Baldo.

Segundo a empresa, nos dois anos, os vinhos ‘Syrah’ de inverno apresentaram algumas características distintas em função das duas zonas de manejo delimitadas, denominadas de Z1 e Z2, e conforme os dois porta-enxertos adotados: ‘Paulsen 1103’ e ‘IAC 572’.

Em ambos os ciclos de produção de uvas, o número de cachos, massa total por planta e a massa média de cachos, sólidos solúveis, potencial hidrogênico (pH), antocianinas (pigmentos vegetais responsáveis pela cor do vinho) e compostos fenólicos (que conferem adstringência, coloração, sabor e aroma) nas sementes foram maiores em Z2. Os compostos fenólicos nas cascas foram maiores em Z1.

A reportagem da Embrapa ressalta que os vinhos originados do porta-enxerto ‘Paulsen 1103’ apresentaram maior acidez volátil nas duas zonas de manejo em 2020, enquanto o ‘IAC 572’ conferiu aos vinhos valores maiores de pH e teor de antocianinas, e poder antioxidante em Z2.

No ano de 2021, os vinhos provenientes da Z1 tiveram maior teor de álcool e açúcar, maior pH e tonalidade. Já aqueles elaborados a partir das uvas da Z2 apresentaram maior concentração de antocianinas, maior índice de polifenóis totais, e maior intensidade.

“As informações são estratégicas para a vitivinicultura de precisão e para o manejo de vinhedos, porque a partir delas o viticultor pode tomar decisões quanto à condução diferenciada de práticas agrícolas utilizadas no cultivo de uvas. Uma delas é a colheita seletiva”, diz o pesquisador da Embrapa Luís Henrique Bassoi.

O cientista afirmou que a adoção da prática pode originar vinhos com características diferentes e de interesse da vinícola. “Os resultados da pesquisa têm impacto direto na qualidade do vinho e podem, sem dúvida, contribuir para o aumento da qualidade do produto nacional”, reforça Baldo.

O levantamento foi orientado por Bassoi e conduzido pela engenheira agrônoma Larissa Godarelli Farinassi (foto à direita), da FCA Unesp. O objetivo dele foi a obtenção do título de doutora em Irrigação e Drenagem.

“Utilizamos os resultados dos estudos em nossos vinhedos, a colheita seletiva de determinadas áreas dos vinhedos já se tornou uma realidade. Os ganhos de qualidade já são percebidos no campo e estarão na taça do nosso consumidor”, indica Baldo.

Vitivinicultura de precisão

De acordo com a Embrapa, a vitivinicultura de precisão é a adoção de procedimentos e de uso de equipamentos e sensores para a prática da agricultura de precisão (AP) em sistema de produção de uva para vinho.

Essa forma de gestão da área de produção de uvas permite caracterizar a variabilidade espacial e temporal do solo e da planta, além de auxiliar na execução de práticas agrícolas de modo diferenciado no vinhedo. No caso específico da pesquisa na vinícola Terras Altas, foi adotado o sistema de dupla poda, fazendo com que a colheita de uvas para vinificação ocorresse durante o inverno.

Hipótese comprovada

Os estudos foram feitos a partir da hipótese de que a variabilidade de atributos do solo e da videira em um mesmo vinhedo poderia acarretar características diferentes nas uvas e nos vinhos delas originados. Assim, foi caracterizada a variabilidade espacial do vinhedo irrigado por gotejamento a partir da delimitação de duas zonas de manejo.

Na pesquisa, os cientistas avaliaram se as zonas de manejo se diferenciavam entre si quanto aos atributos químicos e físico-hídricos do solo, bem como em relação aos aspectos produtivos, quantitativos e qualitativos das uvas e à composição dos vinhos, nos ciclos de produção investigados.

Como já se esperava, a variabilidade espacial e temporal do vinhedo pertencente à vinícola Terras Altas, constatada em duas zonas de manejo, ocorreu mesmo em pequenas áreas da unidade de produção.

As zonas de manejo também possibilitaram a avaliação de diferenças quanto aos atributos físicos-hídricos do solo. “Os valores de umidade do solo, em decorrência das irrigações realizadas e chuvas ocorridas, foram maiores em Z2 nas profundidades de 0,4 até 1,0 metro. A diferença observada entre as zonas de manejo 1 e 2 aumentou em profundidade em ambos os ciclos de produção”, confirma a pesquisadora.

De acordo com Ricardo Baldo, o projeto desenvolvido em parceria com a Embrapa é muito importante, considerando que o foco de produção da empresa é voltado totalmente para a qualidade do vinho. “Conhecer a fundo as características de cada vinhedo e delinear as áreas de melhor produção em relação à qualidade do fruto nos faz trabalhar com colheitas mais seletivas privilegiando o tipo de uva mais adequado para cada perfil de vinho a ser produzido”, observa o diretor.

O conhecimento da variabilidade do vinhedo está auxiliando a instalação do sistema de irrigação por gotejamento na vinícola, ao definir os setores do sistema de irrigação, para aplicação de uma lâmina de água variada, caso necessário.

A pesquisa conta também com o apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Microvinificação

Ainda de acordo com a Embrapa, usando como base os dados das zonas de manejo, as colheitas seletivas de inverno das uvas da ‘Syrah’ foram realizadas em julho de 2020 e em julho de 2021. As uvas foram encaminhadas para o Núcleo Tecnológico Epamig Uva e Vinho, para a microvinificação - processo de fabricação do vinho em pequena escala - e determinação de parâmetros como pH, acidez total, açúcar, alcalinidade, entre outros.

Segundo a coordenadora do Programa Estadual de Pesquisa em Vitivinicultura da Epamig, Renata Vieira da Mota, a vitivinicultura de precisão é uma ferramenta importante nas pesquisas, pois contribui para o conhecimento detalhado do vinhedo e fornece as informações que ajudam a explicar o comportamento fisiológico da planta.

“A vitivinicultura de precisão é essencial quando pensamos na elaboração de vinhos finos de melhor qualidade, pois o conhecimento das características das uvas em cada talhão permite que o enólogo elabore produtos diferenciados a partir da colheita seletiva das uvas, trazendo maior valor agregado ao vinho”, avalia a coordenadora.

Potencial vitícola

De acordo com o zoneamento pedoclimático realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mais de 70% do estado de São Paulo apresenta aptidão edáfica para o cultivo da videira.

No entanto, conforme o estudo, o potencial vitícola regional é mais proeminente nas estações de outono e inverno, quando as condições climáticas são favoráveis à maturação das uvas.

Conforme a Associação Nacional de Produtores de Vinho de Inverno (Anprovin), 13 vinícolas adotam a técnica da dupla poda no estado de São Paulo, produzindo vinhos de inverno em uma área de 60 hectares.

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