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Sem dados sobre crimes de maus-tratos, Bahia caminha a passos lentos na causa animal

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Adelia Felix

por Adelia Felix

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Publicado em 21/04/2021, às 03h00 - Atualizado às 03h00


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A Bahia ainda não tem dados que apontem avanços na legislação e em políticas públicas de bem-estar animal. No abril laranja, mês de prevenção contra a violência animal, estão em destaques as muitas necessidades dos animais e demanda-se do Estado que elas sejam atendidas. Enquanto isso não ocorre, a Bahia assiste outros entes federativos avançando na implantação de medidas, como delegacia especializada, hospitais e cemitérios públicos para animais. 

Questionada pelo BNews sobre números relacionados a crimes de maus-tratos e crueldade cometidos contra animais, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) informou que “não possui estatísticas de crimes, mas que analisa a possibilidade de contagem desses procedimentos”. De acordo com a pasta, os casos podem ser registrados em qualquer delegacia.

Apesar da ausência de uma estatística ampla sobre o cenário no estado, dados da Polícia Militar apresentados à reportagem mostram que criminosos ainda se sentem livres para atuar contra a vida de seres que não conseguem se defender. 

Somente entre janeiro de 2020 e março deste ano, foram apreendidos 159 animais silvestres, realizadas 195 conduções por crimes ambientais, 38 prisões em flagrantes por crimes ambientais, e efetivados 51 combates e maus-tratos a animais.

As operações, que acontecem por meio da Companhia de Polícia de Proteção Ambiental (Coppa), são feitas através de rondas e denúncias ou em parceria com outros órgãos estaduais e ambientais durante ações conjuntas.

Ambientalista há 22 anos e responsável pela implantação de medidas importantes quando atuou como vereador e deputado, Marcell Moraes avaliou que Salvador, quarta maior cidade do país, perde para cidades menores, como Recife, Belo Horizonte e Manaus na implantação de medidas públicas voltadas para a causa animal. De acordo com Moraes, a implantação de um hospital público veterinário, por exemplo, se arrasta desde 2012, gestão do ex-prefeito ACM Neto (DEM), e segue sem previsão na atual administração do prefeito Bruno Reis (DEM).

“Em Recife, já existem dois hospitais públicos veterinários. O nosso vai chegar... Se é que vai chegar. Essa promessa está desde a campanha de ACM Neto. Salvador não tem cemitério público para os animais. Os animais estão morrendo e são jogados na nossa Baía de Todos-os-Santos, ou nas valas, ou nos rios, e causando doença para nós mesmos. Salvador e a Bahia são um retrocesso na causa dos animais. Falta boa vontade ou competência”, afirmou.

Segundo o ambientalista, tanto o Governo Estadual quanto o Poder Municipal precisam atuar com medidas assertivas na causa animal. Moraes também apontou que a recém-criada Diretoria de Promoção à Saúde e Proteção Animal (Dipa), órgão vinculado à Secretaria Municipal de Saúde (SMS), não tem uma atuação efetiva por falta de recursos.

“Em Belo Horizonte, existe uma secretaria especializada. Aqui tem uma diretoria minúscula, sem orçamento algum para resolver problemas dos animais, que serve de oba oba. Aqui em Salvador as carroças estão aí. Um simples decreto do prefeito Bruno Reis acabava com isso. O que temos em Salvador são duas Samuvet, que pago com meu dinheiro, uma upa que minha irmã montou em parceria com um veterinário. Um castramóvel que é com meu dinheiro. Existe lei que proíbe venda de animais em petshop e a prefeitura não fiscaliza. Vamos acordar aí”, disse.

Na Câmara Municipal de Salvador, a irmã do ambientalista, vereadora Marcelle Moraes (DEM), que também defende a bandeira da causa animal, afirmou à reportagem que ao longo do seu mandato já ajudou mais de 100 mil animais.

“Tendo como base o ano de 2020, contabilizamos uma média de mais de 12.800 pedidos de ajuda. Quantitativo que representa pedidos de atendimento veterinários, castrações, denúncias de maus-tratos que chegaram até a central animal, canal disponibilizado por mim para atender tutores e protetores. Sem falar que sou acionada nas minhas redes sociais com inúmeros pedidos diariamente”, detalhou.

Segundo a advogada Ana Helena Perrone, que acompanha e apoia o trabalho de protetores de animais em todo Brasil, a Bahia tem pouquíssimos representantes públicos e privados atuando na seara do Direito Animal. A especialista destacou, em entrevista à nossa reportagem, que o maior trabalho sempre foi executado por protetores independentes, que contam tão somente com o apoio popular. 

“O poder público pouco faz no sentido de criar mecanismos de contenção da reprodução de animais de rua, por exemplo, uma vez que a reprodução desenfreada de cães e gatos gera impactos na saúde pública. Não existem efetivamente hospitais públicos que promovam castração em massa de animais de rua ou que dê acolhimento e tratamento a animais vítimas de maus tratos, em nosso estado Os animais apreendidos, resgatados são, na grande maioria das vezes, tratados e reabilitados às custas de quem promoveu os resgates”, disse. 

A advogada acrescentou também que a principal carência da legislação brasileira, no tocante aos animais, passa pela falta de fiscalização e controle por parte do poder público, tanto de tutores quanto de criadores e comerciantes de animais. Ana Helena também citou que outro ponto que demonstra carência em nossa legislação é a falta de uma punição mais efetiva para casos de maus tratos a outras classes de animais, como os equinos que circulam pelas cidades puxando carroças, objeto de muitas discussões à época da votação da Lei 10.064/2020.

“É necessário conhecer, controlar e fiscalizar a relação do homem com os animais, para evitar e coibir abusos e maus tratos.  Um outro ponto que expressa nossa carência legislativa se expressa pela falta de material educativo e informativo à disposição da população. Educar a população quanto aos direitos dos animais seria uma importante via de promoção da dignidade animal, seguindo a máxima educar para não precisar punir”, explicou.

O que diz a prefeitura de Salvador 
Segundo a Secretaria Municipal da Saúde, desde a implantação da Dipa, em 2019, foram investidos cerca de R$ 1 milhão. No ano 2020, foram recebidas 70 denúncias relacionadas a maus-tratos e 8 abandonos de animais. Neste ano, já foram registrados 48 casos de maus-tratos e 04 de abandono.

A diretoria atua recepcionando essas denúncias, com castrações gratuitas através duas unidades de serviço de castração móvel (castramóvel), duas clínicas conveniadas, visitando os locais indicados, orientando os munícipes sobre a importância da guarda responsável, do não abandono de animais.

No ano de 2020, por meio da diretoria, foram castrados mais de 8 mil animais, e neste ano já são 4 mil bichos castrados. “É importante lembrar que esta prática atende de forma eficiente a população e os animais pois a esterilização de fêmeas e machos também auxilia no controle de natalidade, reduzindo consequentemente o número de zoonoses, pois, diminuindo os nascimentos não planejados teremos menos cães e gatos errantes (animais abandonados), e menos animais abandonados significa menor número de doenças transmitidas para a população tendo o animal como vetor”, ressaltou a pasta em nota.

Um outro benefício é que o procedimento de esterilização é levado para bairros mais afastados, fazendo com que os munícipes tenham fácil acesso ao serviço. Ainda de acordo com a pasta, a Dipa também atua na luta pela adoção responsável, e trabalha no recolhimento de animais de grande porte que esteja ou sejam abandonados em via pública evitando assim acidentes no transito de Salvador.

Sobre o Hospital Veterinário, a SMS informou que está em tramitação a licitação para a construção. O projeto para construção da unidade já está em fase de conclusão e será instalado no bairro de Canabrava, em uma área de mais de 1.200 m². A unidade deve atender prioritariamente os animais domésticos de propriedade da população mais pobre e que não possui recursos financeiros para pagar atendimento e serviços de um veterinário particular.

Para a titular da Dipa, Tainara Ferreira, a diretoria tem sido um órgão importantíssimo para garantir e assegurar a promoção a saúde e proteção animal em Salvador. “Nossa capital sai a frente com sua criação pois, cuidar da saúde dos animais é tratar da saúde pública dos munícipes. Cada vez mais vimos o crescimento da causa protecionista e a importância da expansão de políticas públicas que assegurem o advento de mais conquistas em prol dos animais”, avaliou.

Como denunciar?
Denúncias de maus-tratos contra animais podem ser feitas pelo número 190. As queixas também podem ser feitas em qualquer delegacia da Polícia Civil, ao Ministério Público Federal e Estadual, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema).

As práticas que se enquadram na categoria de maus-tratos são abandonar, ferir, manter preso permanentemente em correntes, em locais pequenos e sem higiene, não abrigar do sol, da chuva e do frio, não dar comida e água diariamente, entre outras. Maus-tratos aos animais é crime previsto pela lei ambiental desde 1998. Em setembro do ano passado, uma alteração na lei passou a garantir pena de 2 a 5 anos de reclusão, além do pagamento de uma multa e o registro de antecedente criminal aos agressores.

Classificação Indicativa: Livre

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