Justiça

Disputa bilionária entre J&F e Paper Excellence inicia fase decisiva nesta segunda-feira (21)

Marcelo Camargo/Agência Brasil
A disputa entre J&F e Paper Excellence vai iniciar as audiências de instrução do processo para definir de uma vez por todas quem tem razão na contenda  |   Bnews - Divulgação Marcelo Camargo/Agência Brasil

Publicado em 18/02/2022, às 12h41   Redação BNews


FacebookTwitterWhatsApp

O imbróglio que se arrasta há quase quatro anos nos tribunais, além dos 15 bilhões de reais envolvidos no negócio, chega em fase decisiva. Segundo a Veja, a partir desta segunda-feira (21), começam na Justiça de São Paulo as audiências de instrução do processo para definir de uma vez por todas quem tem razão na contenda: J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, ou Paper Excellence, do indonésio Jackson Wijaya.

A briga pelo controle da Eldorado Celulose, vendida em 2017 pela J&F para a Paper Excellence perpassa por acusações sérias.

Durante a disputa, a Paper recusou voltar atrás e chegou a ganhar a causa na instância de arbitragem empresarial que analisou o negócio. Mas a vitória durou pouco e a J&F, por força de uma liminar, suspendeu a decisão.

LEIA MAIS; Conflito entre J&F e Paper pode se alongar até próximo ano

Polícia Federal apura participação de empresas baianas em fraudes ligadas à J&F; veja

STJ autoriza Joesley e Wesley Batista a terem novamente cargos nas empresas J&F

Deputados barram tentativa de revisão de leniência de J&F

A J&F decidiu vender a Eldorado em setembro de 2017, num processo em etapas. Na última delas, quando a Paper assumiria o controle adquirindo a parte final das ações (os 50,59% que acabaram permanecendo com a J&F), começou o litígio. Todavia, a J&F acusou a Paper de descumprir o prazo e as condições para a finalização do negócio, que envolviam a liberação das garantias dadas pela empresa brasileira e pela família Batista em razão das dívidas da Eldorado.

Contudo, houve acusação da Paper contra a J&F de dificultar intencionalmente o cumprimento dessas condições por, supostamente, ter desistido da venda. Nesse ínterim, de fato, o cenário havia mudado: a J&F se recuperava da delação dos Batista, assinada em 2017 com o Ministério Público, e a celulose se valorizou no mercado mundial.

Ainda conforme a publicação da Veja, devido a toda essa briga, o caso Eldorado Celulose, além de sustentar que foi vítima de hackeamento e espionagem que teriam prejudicado sua defesa, a J&F afirma que um dos juízes que analisou a disputa entre 2019 e 2021 na corte de arbitragem da Câmara de Comércio Internacional agiu sem a imparcialidade necessária.

Em março de 2021, A J&F utilizou de um argumento que mudou o curso na Justiça. O grupo ajuizou a ação com o objetivo de invalidar a arbitragem mirando as baterias no juiz indicado pela companhia indonésia, Anderson Schreiber. Segundo a J&F, ficou por debaixo do pano o fato dele ter dividido um imóvel e linhas telefônicas com o escritório de advocacia Stocche Forbes, que trabalhou justamente para a Paper.

Após alguns desdobramentos, as empresas aumentaram ainda mais seus times de advogados, consultores e lobistas. Do lado da Paper, entre os contratados de peso estão o ex-presidente Michel Temer (MDB) — curiosamente, um adversário dos Batista desde a famigerada gravação clandestina no Jaburu — e o ex-delegado e ex-deputado Marcelo Itagiba. Do lado da J&F, há Frederick Wassef, ligado à família Bolsonaro, que atuou como advogado de um executivo do grupo, e o ex-diretor-geral da Polícia Federal Leandro Daiello — que, também curiosamente, comandou a corporação no auge da delação dos Batista. Essa disputa também virou caso de polícia e uma das queixas envolve a alegação de hackeamento de e-mails de advogados e executivos da J&F, que teria atingido mais de 100 endereços e 70 000 mensagens. As apurações tocadas pela J&F apontam para uma especialista em cibersegurança contratada pela Paper que teria subcontratado hackers para invadir o servidor da adversária. A polícia de São Paulo, contudo, arquivou um inquérito sobre o caso depois de não ter conseguido comprovar as suspeitas. Outro inquérito foi aberto em Diadema, e prossegue em sigilo.

A pedido da holding dos irmãos Batista, uma delegacia fluminense abriu ainda outro inquérito para investigar se o árbitro Schreiber cometeu o crime de falsidade ideológica por ter omitido que dividiu espaço com o escritório Stocche Forbes. Para a J&F, o árbitro deixou de revelar “fortes vínculos” com pessoas ligadas à outra parte e perdeu a confiança. Schreiber se defendeu afirmando que houve uma simples sublocação de salas comerciais entre o Stocche Forbes e o escritório dele, três anos antes da arbitragem. No último dia 10, o Ministério Público do Rio pediu o arquivamento da investigação criminal contra o árbitro, o que foi atendido pela juíza Daniella Prado no dia 11. Porém, em uma reviravolta, dias depois de arquivar o caso a juíza se declarou impedida de julgá-lo, e o inquérito contra Schreiber passou para um outro juiz, como revelou o Radar Econômico, de VEJA.

Situações como a de Schreiber geram intensos debates no meio jurídico: a mera omissão de informações é suficiente para anular uma sentença arbitral ou é preciso provar que o árbitro efetivamente foi parcial? Segundo a advogada e árbitra Maria Augusta Rost, o chamado “dever de revelação” é o que garante a credibilidade das arbitragens. “Tudo deve ser revelado. Se o árbitro deixa de lado o dever de revelar, isso vai minando a legitimidade da jurisdição arbitral”, diz, sem entrar no mérito do caso Eldorado.

A juíza responsável pela ação anulatória proposta pela J&F em São Paulo, Renata Maciel, inicialmente negou o pedido de liminar para paralisar a transferência de controle da Eldorado, indicando ser necessário aprofundar a análise dos prejuízos causados pela omissão do árbitro. A J&F recorreu. O desembargador José Araldo Telles reverteu, então, a decisão e mandou suspender a troca de comando da Eldorado até o julgamento do mérito. Telles morreu no último dia 6, deixando eventuais recursos do caso para um sucessor. Em dezembro, a disputa da Eldorado foi objeto de discussão em um evento sobre desafios da arbitragem realizado em Miami. A presidente da Comissão de Arbitragem da Câmara Internacional do Comércio, Débora Visconte, chegou a comentar publicamente na ocasião que “o Tribunal de Justiça entendeu que isso (a omissão) conflitaria o árbitro”, mas defendeu a ideia de que a liminar de suspensão do negócio seja revista.

Na visão da Paper, a alegação de impedimento de Schreiber deveria ter sido feita pela J&F no curso da arbitragem, e não depois de perdê-la. Além disso, os três árbitros deram ganho de causa à empresa indonésia, portanto, o voto de Schreiber não teria sido decisivo. 

À Veja, a J&F se manifestou por meio de uma nota. “O caso da Paper Excellence é um escândalo comprovado por documentos, testemunhos e perícias. Está provado que todos os e-mails trocados pela J&F com seus advogados na arbitragem foram espionados durante a disputa. A J&F confia na Justiça para garantir a reputação do instituto da arbitragem e corrigir as exceções, como o caso da Paper Excellence”, diz o comunicado. É essa discussão que será retomada agora, mas nada indica que o conflito se resolva na primeira instância. As partes já falam em subir até o STJ, responsável por dar a última palavra em matéria de arbitragem no Brasil.

Siga o BNews no Google Notícias e receba os principais destaques do dia em primeira mão.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp