Esporte

Médico de federação de vôlei quer regra mais rígida para transexuais

Marcelo Ferrazoli/Vôlei Bauru
COI afirmou que publicará novas diretrizes sobre e que caberá exclusivamente à federação internacional de cada modalidade   |   Bnews - Divulgação Marcelo Ferrazoli/Vôlei Bauru

Publicado em 19/01/2018, às 06h36   Folhapress


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No momento em que a transexual Tifanny Abreu, 33, se destaca na Superliga feminina defendendo o time de Bauru, a FIVB (Federação Internacional de Vôlei) discute na próxima quarta-feira (24) durante reunião da sua comissão médica na Suíça a presença na modalidade de atletas que mudaram de sexo.

Neste encontro, o médico brasileiro Bruno Borges, um dos seis integrantes da junta, vai sugerir controle mais rígido e diminuição do nível de testosterona no sangue para a liberação destas atletas.

Resolução do COI (Comitê Olímpico Internacional) de 2015 diz que uma transexual não precisa fazer cirurgia de mudança de sexo para competir entre as mulheres. Só é necessário que seja constatada a presença de no máximo 10 nanomol de testosterona por litro de sangue em dois exames feitos nos últimos 12 meses antes da liberação. Também é necessário realizar um controle periódico.

"Considero o valor do COI muito elevado, e dois exames em um ano é pouco. Vou pedir algumas mudanças e isso será discutido. Mas, ainda que aprovado, não será para agora, pois precisa também passar por aval do conselho de administração da FIVB", disse Borges à Folha.

Em nota, o COI afirmou que publicará novas diretrizes sobre e que caberá exclusivamente à federação internacional de cada modalidade definir as regras de elegibilidade de atletas transexuais.

Segundo o Bauru, os exames de Tifanny sempre apontaram valores abaixo de 1, algumas vezes chegando a 0,25.

Borges é um dos integrantes da comissão nacional de médicos de vôlei, órgão subordinado à CBV (Confederação Brasileira de Vôlei) que deu a liberação à Tifanny.

"A liberação é baseada estritamente na regra do COI, pois é o único parâmetro que temos. Mas ao meu ver não é só isso que deveria determinar", disse o médico João Grangeiro, que também faz parte da comissão.

"A FIVB está comprometida a estabelecer um sistema justo, harmonioso e transparente para a participação universal de atletas em competições indoor e no vôlei de praia, como também a nivelação do jogo", disse a entidade, que exige de transexuais a apresentação de documentos com o novo sexo.

O caso de Tifanny não é único no mundo, a transexual Alessia Ameri, 31, joga na segunda divisão italiana. Na Espanha, Omaira Perdomo, 18, recebeu autorização para jogar na categoria feminina.

TIFANNY

Tifanny começou sua transição de gênero em 2012, com tratamento para diminuição do nível de testosterona. O processo foi concluído em 2014, quando passou pela cirurgia de mudança de sexo.

Antes disso, tinha carreira de pouco destaque no vôlei masculino. No Brasil, ainda como Rodrigo atuou só em times da 2ª divisão nacional. Hoje, Tifanny é a maior pontuadora da Superliga feminina, com média de 23,3 pontos por jogo, à frente de Tandara, do Osasco e da seleção brasileira, que tem média de 20.


"Claro que a Tifanny mudou bastante quando optou por trocar de sexo. Mas ainda hoje, os parâmetros são muito mais perto dos de um homem do que os de uma mulher", disse Grangeiro.

"Como a mudança ocorreu muito tarde [depois da puberdade], todo o desenvolvimento dela foi como homem. Isso envolve a parte óssea, muscular e frequência cardíaca", afirma Karen Faggioni de Marca Seidel, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia.

"Há estudos que apontam que para haver a perda desta estrutura pode levar até 15 anos", disse a médica.

Sua presença no torneio e o desempenho têm gerado insatisfação de dirigentes, técnicos e jogadoras. Situação idêntica aconteceu quando atuou na Itália em 2017.

Uma das supostas vantagens que Tifanny teria é a de ter feito a formação no vôlei em condições diferentes das outras jogadoras. A atleta de 1,94 m jogou a maior parte da carreira no masculino, cuja rede tem 2,43 m de altura. No feminino, ela fica a 2,24 m.

As atletas, por receio de se exporem e serem vítimas de ataques nas redes sociais, não estão falando sobre o tema.

"As jogadoras não estão contentes. Eu já percebi isso. Só que elas têm medo de falar. Sabem que a Tifanny ataca mais forte. Elas sentem a diferença", disseSérgio Negrão, técnico de Brasília, equipe que sofreu 24 pontos da jogadora em derrota por 3 sets a 1 no último dia 9.

"Ela faz diferença sim. Mas não tem muito o que falar. Ela está autorizada É uma novidade para todos", disse Renato Tavolari, supervisor do Sesi-SP.

Afeita a entrevistas e sem problemas de falar sobre sua mudança de sexo, Tifanny optou por se calar à medida que a polêmica em torno do seu nome aumentou. Segundo a assessoria do Bauru, quer se concentrar nos treinos e jogos.

"Esta repercussão não nos surpreende em nada. Era de se esperar. Mas não estamos infringindo nenhum regulamento. Estamos muito satisfeitos, inclusive com o seu desempenho, que têm feito a diferença em prol do nosso time. ", disse Livia Mayra Garcia, supervisora do Bauru.

Desde a chegada de Tifanny, o time ganhou três das cinco partidas disputadas. Antes, tinha só três vitórias com o dobro de jogos realizados.

"Não acho que ela tenha uma força descomunal, fora da realidade, como estão dizendo por aí. Eu treino todo dia com ela e posso dizer isso. Claro que um ou outro ataque sai mais pesado mesmo. Mas na Superliga temos atacantes semelhantes, como a Tandara e a Thaisinha, que pegam forte na bola também", disse Angélica, capitã de Bauru.

"Ela foi muito bem recebida. O que eu tinha um pouco de receio era como seria a recepção das outras torcida. Até agora não tivemos problemas, só no jogo contra o Fluminense que teve bastante xingamento", disse a capitã.

O técnico da seleção brasileira feminina José Roberto Guimarães, foi procurado para falar sobre Tifanny, mas não quis se manifestar. Anteriormente, disse que poderia considerar sua convocação. 

Classificação Indicativa: Livre

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