Justiça

Decisão de desembargadora em 2016 desencadeou Operação Injusta Causa da PF

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Quatro desembargador, um juiz e dois advogados foram os alvos da operação  |   Bnews - Divulgação Vagner Souza/BNews

Publicado em 11/09/2019, às 19h49   Redação BNews


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A Operação Injusta Causa, deflagrada nesta quarta-feira (11) pela Polícia Federal na Bahia, é fruto de uma Reclamação Disciplinar feita na Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) contra desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT5). No entanto, já em 2016, a desembargadora Dalila Nascimento Andrade, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 5ª Região, na Bahia, levantou suspeitas sobre uma determinação dada pela então presidente do órgão à época, desembargadora Maria Adna Aguiar - um dos alvos da operação desta quarta-feira – em um processo que envolvia a Faculdade de Tecnologia e Ciência (FTC) e ex-funcionários da instituição de ensino. Esse processo teria sido o pontapé inicial para a operação deflagrada hoje.

Na decisão que envolve a FTC, em 2016, e publicada pelo BNews, a desembargadora Dalila Nascimento suspeitou da decisão da então presidente Maria Adna que autorizou uma moratória em favor da FTC mesmo sem acordo entre as partes. O que, para desembargadora Dalila Nascimento, foi uma decisão “teratológica”, pois foi de encontro “a vontade das partes” o que “viola, manifestamente, a coisa julgada”. A desembargadora acusa também a juíza de manter em “sigilo a ata de audiência e ainda proibiu o acesso dos advogados aos autos do processo”. Outras inconsistências foram encontradas na decisão de Maria Adna. 

Operação - Pelo menos 50 agentes da Polícia Federal cumpriram hoje, em Salvador, 11 mandados de busca e apreensão, que têm por objetivo reunir documentos e outros elementos que possam comprovar suspeitas do recebimento de vantagens financeiras indevidas, indicativos de combinações de decisões judiciais, de ocultação de bens e de associação entre os investigados.

Apesar de as investigações serem sigilosas, a equipe do BNews acompanhou a ação da PF na manhã desta quarta e descobriu que um dos investigados é o desembargador Esequias Pereira de Oliveira. 

Ainda segundo fontes do BNews, pelo menos cinco desembargadores foram alvos das medidas: Norberto Frerichs, Pires Ribeiro, Esequias Oliveira e a própria Maria Adna Aguiar. O assessor dela, João Gonçalves Franco, também é investigado no caso. E o juiz Thiago Barbosa de Andrade. Além disso, o irmão de Maria Adna, o advogado Henrique Aguiar.

As investigações do Ministério Público Federal (MPF) que apontaram a existência da atuação de um grupo de magistrados do TRT5 que, em conjunto com advogados, negociava a venda de acórdãos e decisões da Casa, tiveram origem a partir de uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) envolvendo a Faculdade de Tecnologia e Ciência (FTC). O procedimento no CNJ, que é administrativo, foi contra os desembargadores Maria Adna Aguiar do Nascimento, Esequias Pereira de Oliveira, Washington Gutemberg Pires Ribeiro, Thiago Barbosa de Andrade, Maria das Graças Oliva Bonnes e Norberto Frerichs. Ainda não há confirmação se todos os magistrados investigados na CNJ são réus no processo judicial.

Entenda o caso:

Uma decisão proferida pela desembargadora Dalila Nascimento Andrade, do TRT5, levantou suspeitas sobre uma determinação dada pela então presidente do órgão, desembargadora Maria Adna Aguiar, em um processo que envolve a FTC e ex-funcionários da instituição de ensino. Dalila dizia estar “estarrecida” com a situação da Justiça do Trabalho do estado e que era preciso “tomar ou retomar a ordem judicial, a segurança e a moralidade do Judiciário Trabalhista na Bahia”.

Origem da reclamação no CNJ:

Em outubro de 2014, o Grupo FTC formalizou na Justiça do Trabalho um acordo com ex-funcionários para pagar uma dívida na ordem de R$ 96 milhões em parcelas que encerrariam em 2017. Em outubro de 2015 houve uma renegociação onde a instituição de ensino se comprometeu a não pedir um novo acordo. Porém, dois meses depois o Grupo FTC quis refazer o combinado entre as partes e pediu uma nova audiência conciliatória, que foi realizada no dia 17 de dezembro de 2015.

Nesta conciliação, os funcionários rejeitaram a proposta feita pelo grupo FTC, representado pelo proprietário Gervásio Meneses de Oliveira, de suspender por seis meses o pagamento da dívida. Mesmo sem acordo, a juíza trabalhista Marúcia da Costa Belov autorizou a suspensão. 

Diante da controversa decisão de Belov, os advogados dos ex-funcionários impetraram mandado de segurança, que foi julgado pelo TRT5. Os desembargadores Renato Mário Simões e Léa Reis Nunes acataram o pedido e suspenderam o acordo. Na decisão, Léa 

Na decisão, Léa Reis Nunes sugeriu que a juíza Marúcia da Costa teria sido designada pela presidente do tribunal para fazer o novo acordo. Mas, conforme destaca a própria desembargadora, “inexiste documento [...] provando que foi ela [Maria Adna] quem determinou a marcação da audiência”. Na ata da conciliação consta apenas a assinatura de Marúcia e não comprova efetivamente o acordo: “E o pior, a ata que seria de conciliação, não comprova efetiva conciliação entre as partes, mas acirrada e declarada, em bom português, discordância”, ressaltou Léa Reis, observando que a audiência conciliatória ocorreu às vésperas do encerramento do ano de 2015.

Com as duas decisões desfavoráveis proferidas pelo TRT em 27 e 28 de janeiro, o Grupo FTC recorreu na manhã do dia 1º de fevereiro solicitando que os pagamentos fossem suspensos. Foi então que a presidente do TRT5, desembargadora Maria Adna Aguiar, concedeu liminar suspendendo as determinações dos magistrados Renato Mário Simões e Léa Reis Nunes (que obrigavam o Grupo FTC a pagar a dívida) e mandou que ocorresse, como manda a legislação, um sorteio para definir o novo desembargador para ficar responsável pelo processo.

A desembargadora Dalila Nascimento foi escolhida neste sorteio e proferiu uma decisão ordenando que a FTC voltasse a quitar a dívida com os ex-funcionários, suspendendo, assim, a liminar da presidente do TRT-BA. A magistrada levanta, ainda, suspeitas sobre as decisões anteriores. 

Primeiramente, avaliou a decisão de 1º grau, proferida pela juíza Marúcia Belov, como “teratológica”, pois foi de encontro “a vontade das partes”, o que “viola, manifestamente, a coisa julgada”. A desembargadora acusa também a juíza de manter em “sigilo a ata de audiência e ainda proibiu o acesso dos advogados aos autos do processo”.  

Em sua decisão, Dalila Nascimento afirma que a então presidente do TRT5, Maria Adna, recebeu o pedido da FTC em “petição física”, o que, segundo ela, não é mais permitido pela lei. “A presidência deste tribunal [...] não estava autorizada a receber o presente Mandado de Segurança [ação ingressada pela FTC] por meio físico”, destaca. “O ajuizamento de qualquer ação originária de segundo grau de jurisdição deverá ser realizado exclusivamente por meio do Sistema de Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho”, ressalta, salientando que o sistema está implantado na Justiça do Trabalho da Bahia desde maio de 2012.

Dalila diz ainda ter ficado surpresa com o fato da FTC, em seu pedido, destacar que era de “urgência urgentíssima”, e ainda assim ter esperado passa o final de semana, mesmo havendo um desembargador plantonista, para solicitar a suspensão da decisão à presidente do Tribunal. Dalila Nascimento destaca que o pedido foi feito no dia 29 de janeiro às 7h34, uma segunda-feira, “alguns minutos antes de iniciado o horário de expediente normal [às 8h]”. 

Ainda na sua decisão, a desembargadora tece duras críticas ao grupo FTC. Afirma que a instituição voltava a “assombrar”. “Afinal, quando todos da sociedade baiana, e não apenas os que aqui labutam (juízes, servidores, MPT, advogados), e mais especialmente os credores, imaginavam que o conflito estava definitivamente pacificado [...] o empresário, sócio da impetrante, volta a demonstrar o total desrespeito com que sempre tratou o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região”, afirmou. Também destacou que o grupo sempre “agiu de má-fé, em todas as esferas e instâncias judiciais, como, aliás, temos visto há décadas”.

A desembargadora acusou ainda o Grupo FTC de contar com “beneplácito de integrantes do próprio tribunal”, “atuando em manifesta e flagrante ilegalidade, violando direito líquido e certo de centenas de jurisdicionados”.

À época, o diretor do Grupo FTC, Gervásio Oliviera, afirmou ao BNews que a empresa não tem ingerência sobre as questões levantadas na matéria acima. Oliveira ressalta que a FTC tem cumprido todas as decisões determinadas pela Justiça desde o início do processo.

Diante do imbróglio judicial, o caso foi parar no Conselho Nacional de Justiça com ao menos seis desembargadores investigados. Posteriormente, o Ministério Público Federal (MPF) concluiu que havia atuação de um grupo de magistrados do TRT5 que, em conjunto com advogados, negociava a venda de acórdãos e decisões da Casa. Foi então que a Polícia Federal foi acionada para dar prosseguimento à operação Injusta Causa.

Classificação Indicativa: Livre

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