Polícia

Mossoró: Relembre fuga, investigação e saiba detalhes da recaptura

Arquivo pessoal
Fugitivos de Mossoró foram presos nesta quinta-feira (4)  |   Bnews - Divulgação Arquivo pessoal
Sanny Santana

por Sanny Santana

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Publicado em 04/04/2024, às 15h38 - Atualizado às 16h56


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Comparada à incansável busca pelo assassino Lázaro Barbosa, a perseguição aos fugitivos da Penitenciária Federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte, chegou ao fim nesta quinta-feira (4), após 50 dias de buscas que levaram dor de cabeça às forças de segurança e ao governo. 

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Rogério da Silva Mendonça, de 35 anos, e Deibson Cabral Nascimento, de 33 anos, fugiram do presídio de segurança máxima no dia 14 de fevereiro, e foram encontrados em Marabá, no sudeste do Pará, a mais de 1.600 km de distância de Mossoró. Em um trajeto de "linha reta", isso significa que entre as duas cidades há, pelo menos, cinco estados de distância.

Na visão do juiz federal Walter Nunes, corregedor da penitenciária e coordenador geral do Fórum Permanente do Sistema Penitenciário Federal, esse foi "sem dúvidas" o episódio mais grave da história dos presídios de segurança máxima do país. O relato foi dado em entrevista à Folha de S. Paulo.

A fuga da dupla

Rogério e Deibson, inevitavelmente, entraram para a história dos presídios brasileiros e abriram os olhos para alguns descasos na Penitenciária Federal de Mossoró. Essa foi a primeira vez que detentos conseguiram escapar de uma das cinco penitenciárias de segurança máxima do país.

Para realizar o feito, os criminosos teriam usado materiais de uma obra que acontecia no pátio da penitenciária. Os dois abriram um buraco onde ficava uma luminária, na parede, que não tinha estrutura protegida por uma laje de concreto, mas era feita de alvenaria comum.

Logo depois, os dois detentos chegaram ao local da manutenção do presídio, onde estão máquinas, tubulações e toda a fiação. De lá, a dupla conseguiu alcançar o teto do prédio. Também não havia havia nenhuma laje de concreto ou sistema de proteção.

Os fugitivos, na sequência, encontraram ferramentas que estavam sendo usadas na reforma interna do presídio.Um tapume de metal, que protegia o local da reforma, foi facilmente ultrapassado. Com um alicate, eles ainda conseguiram cortar um arame e passar pela grade que impedia o acesso ao lado externo do presídio.

Por incrível que pareça, os dois presos conseguiram realizar a fuga mesmo estando em RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), onde as regras são mais rígidas que as do regime fechado. Nesse tipo de ala há um local para o banho de sol para que os detentos não tenham contato com outros presos.

De acordo com o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, algumas câmeras não estavam funcionamento adequadamente, assim como lâmpadas, que poderiam ter ajudado na detecção da fuga.

Na época da fuga, o mesmo presídio abrigava Luiz Fernando da Costa, conhecido como Fernandinho Beira-Mar, líder do Comando Vermelho (CV).

Buscas e ajuda de facção

Além de trabalhosa, a busca pelos fugitivos custou caro. Mais de R$ 2 milhões foram investidos em 45 dias de busca pela dupla. E não é para menos, já que a operação envolveu mais de 600 agentes da da Polícia Federal (PF), Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) e a Força Nacional, além do uso de drones e helicópteros.

Investigações da Polícia Federal apontaram que a facção criminosa Comando Vermelho (CV) bancou uma rede de apoio para ajudar os dois detentos, os auxiliando a se manterem em áreas rurais com alimentação, bebidas, transporte e armas de fogo.

A dupla chegou a entrar em contato com membros do CV no dia 16 de fevereiro, mesmo horário em que fizeram uma família refém, para conseguir mantimentos, na zona rural de Mossoró e tiveram acesso a celulares.

Depois desse ocorrido, os criminosos receberam suporte local de um residente da cidade. A polícia diz que esse homem resgatou a dupla e a conduziu para uma região próxima a Baraúna, última cidade que faz divisa com o Ceará. Essa foi a primeira pessoa presa no caso, no dia 21. Segundo investigadores, ele teria recebido R$ 4.500 para fazer o serviço.

Após a prisão e execução de mandados de busca e apreensão, a polícia constatou que ele não agiu isoladamente no apoio aos criminosos, contando com a colaboração de outras pessoas. Até o dia 29 de fevereiro, seis pessoas envolvidas no suporte dos detentos foram presas pela polícia.

Rogério e Deibson ainda chegaram a invadir um galpão e agredir um agricultor que estava no local dormindo. Apesar de exigirem arma e celular, os detentos saíram apenas com três pacotes de bolacha, uma carne de lata, dois pacotes de bolo e água gelada.

Na cidade de Baraúna, também no Rio Grande do Norte, a polícia investigou que a dupla criminosa teria pago R$ 5 mil por proteção em uma propriedade rural.

Policiais encontraram do lado de fora de uma residência um buraco que serviria como espécie de bunker para dificultar que eles pudessem ser identificados por drones, caso os equipamentos se aproximassem do imóvel. A propriedade fica a cerca de 27 km da Penitenciária Federal de Mossoró.

Apesar da intensa busca e depoimentos de testemunhas, além de objetos e esconderijos que indicassem a presença dos detentos, a polícia permaneceu 'caçando' os bandidos por mais de um mês.

No final do mês de março, mais de 100 agentes da Força Nacional precisaram deixar as investigações para que uma nova estratégia fosse traçada contra os foragidos. Seis dias depois, os criminosos foram encontrados.

A recaptura

Os criminosos foram encontrados por agentes da PF e da PRF nesta quinta-feira (4), na cidade de Marabá, no sudeste do Pará, a mais de 1.600 km de distância de Mossoró. A operação envolveu o monitoramento de três veículos que davam cobertura à fuga. Ao todo, seis pessoas foram presas nos três carros.

Os suspeitos foram presos na ponte que atravessa o Rio Tocantins. A abordagem ocorreu neste local para evitar a fuga pelo rio. Foram apreendidos uma arma, dinheiro e celulares.

De acordo com a TV Globo, por volta das 10h desta quinta, um delegado da PF informou à PRF em Marabá que os fugitivos passariam pela cidade de Tailândia. A polícia, então, iniciou a perseguição. 

Ao se aproximarem de Morada Nova, a 25 quilômetros de Marabá, policiais fecharam dois lados de uma ponte, na BR-222. Em cima da ponte, dois veículos foram abordados.

Um fugitivo estava em um carro e outro em um segundo veículo. Um terceiro carro, que dava apoio aos criminosos, também foi detido. A dupla do CV deve ser devolvida a Mossoró. 

Sequência de erros no presídio

Erros no presídio foram identificados após a fuga da dupla. Um dos facilitadores, por exemplo, foi a inutilidade das câmeras de segurança, que estavam sem funcionar. Ao menos 124 unidades dessas câmeras que ficam espalhadas pelo presídio estavam com algum problema. 

Em um documento, é relatado ainda que tubulações estariam desprotegidas e pede que o problema seja resolvido com urgência. Isso porque qualquer preso que quisesse acessar o espaço, bastaria retirar a luminária do local, segundo informações do colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo.

Além disso,segundo a Folha de S. Paulo, foi descoberto que os dois detentos fugitivos ficaram pelo menos 30 dias sem revista nas celas. Uma investigação foi aberta contra 10 servidores da prisão.

A falta de fiscalização teria impedido que os servidores vissem o buraco que os presos fizeram para escapar. Não se sabe quanto tempo foi necessário para que a abertura fosse feita, mas estima-se que tenha levado de três a quatro dias.

Pelo fato de os relatórios analisados constarem apenas o período de 30 dias, ainda há a possibilidade de o prazo de falta de revistas em celas ser ainda maior. Foram colhidos depoimentos de 22 servidores durante as investigações.

Além disso, um processo foi aberto pelo Ministério da Justiça contra a construtora que reformou o pátio do presídio federal na cidade de Mossoró. Na visão do órgão, pode ter ocorrido um "desrespeito a determinações contratuais", o que teria influenciado na fuga dos detentos. 

Depois desse ocorrido, o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, anunciou medidas de modernização do sistema de videomonitoramento dos presídios e no aperfeiçoamento do controle de acesso aos presídios federais com sistema de reconhecimento facial para presos, visitantes e administradores.

Quem eram os fugitivos

Rogério da Silva Mendonça, de 35 anos, e Deibson Cabral Nascimento, de 33 anos, faziam parte da facção Comando Vermelho (CV), liderada por Fernandinho Beira-Mar. 

A dupla nasceu no estado do Acre e estava presa na penitenciária desde 27 de setembro de 2023. De acordo com Secretaria de Estado de Segurança Pública do Acre, Rogério e Deibson participaram da rebelião ocorrida em julho de 2023 no presídio de segurança máxima Antônio Amaro Alves. Cinco presos foram mortos brutalmente, com decapitações e esquartejamentos.

Deibson Cabral, também conhecido como "Tatu" ou "Deisinho", estava preso desde agosto de 2015, com passagem pelo presídio federal de Catanduva (PR). Ele responde pelos seguintes crimes: assalto, furto, roubo, homicídio e latrocínio, além de algumas condenações.

Já Rogério estava cumprindo pena no Acre, sendo transferido para Penitenciária Federal de Mossoró. Os fugitivos são apontados como membros de organização criminosa e cumpririam pena de dois anos, até 25 de setembro de 2025.

Fernandinho Beira-Mar

Apontado como líder do CV, facção que a dupla faz parte, Fernandinho Beira-Mar foi transferido logo após a fuga. Ele foi transferido do presídio federal de Mossoró para Catanduvas, no Paraná. A mudança aconteceu 18 dias após Deibson e Rogério fugirem.

De acordo com informações divulgadas pela CNN, além de Fernandinho, outros 22 detentos foram transferidos, tanto para Catanduvas, quanto para uma unidade em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Segundo a coluna de Guilherme Amado, os advogados de Beira-Mar revelaram que o líder do CV exaltou a fuga de Rogério e Deibson, já que é inédita na história dos presídios federais.

traficante também comentou que acredita que a fuga aconteceu por uma "sequência de erros e acasos" da administração do presídio.

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