Política

Após quatro mandatos como prefeito, Guilherme diz que sai de cabeça erguida

Publicado em 28/10/2016, às 19h42   Luiz Fernando Lima


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Chegando ao final do quarto mandato como prefeito de Vitória da Conquista, Guilherme Menezes, mesmo tendo uma personalidade reservada, não esconde a angustia diante da possibilidade de ver o projeto petista na cidade ser derrotado após 20 anos. Foram cinco mandatos consecutivos, um deles do deputado estadual e atual candidato ao posto de gestor na cidade, José Raimundo. Nesta entrevista exclusiva à reportagem do Bocão News, que esteve em Conquista, o petista defende o legado e lamenta a possibilidade de interrupção do processo. Depois do gravador desligado, Guilherme Menezes, com a voz embargada declarou que a mudança na vida de pessoas conquistenses é motivo de orgulho e que sairá com a cabeça erguida deste processo.

Confira!

A dois meses do fim deste mandato de quatro anos qual é a avalição que o senhor faz?

Acredito que foi um mandato de maior responsabilidade do que o primeiro porque a proporção que as pessoas vão tendo a oportunidade de galgar posições na Educação, na participação da própria economia do município. Quanto mais as pessoas têm, mas elas exigem. Isso é natural. Este último mandato ele foi marcado por demandas mais sofisticadas. Quem antes queria o ginásio (Ensino fundamental) no interior depois que termina demanda por cursos do ensino médio. Em seguida querem transportes para fazer a faculdade e por isso que foi um dos mandatos que o governo municipal recebeu maior exigências e mais complexas. Estamos concluindo de cabeça erguida. 

Seus adversários dizem que existem dois grandes gargalos em Conquista. O primeiro é a Saúde e o segundo a falta de água. Quais são as evoluções nestes dois segmentos e quais as dificuldades?

A Saúde quando nós assumimos a primeira vez tinha para todo município de Conquista oito médicos já a caminho da aposentadoria e seis enfermeiras. Em 1997. Não existia nenhum programa com a fiscalização sistematizada e nós começamos a trazer, primeiro, para a prática do Sistema Único de Saúde.  Nós municipalizamos e depois com foco na regionalização. Inicialmente arrumamos a atenção básica. Já em 1999, dois anos depois, assumimos a gestão plena da Saúde. Consegui que um médico, professor do Instituto de Saúde Coletiva da Bahia, viesse para Conquista. Eu dizia para ele que estava na hora de “botar a mão na massa” e vir construir na prática e Jorge Solla veio para cá. Grandes avanços na Saúde nós fomos alcançando. Muitas vezes com incompreensão. Os hospitais conveniados ao SUS se negaram a receber qualquer paciente do SUS durante 12 dias achando que a gestão plena, que era uma imposição da Lei, fosse trazer prejuízos para o setor privado. O que não ocorreu, ao contrário, Conquista foi arrumando a sua saúde pública e atraindo pessoas. Chegamos a ter atuação com 80 municípios da região, principalmente na média e alta complexidade. Houve uma evolução muito grande. Criamos também no início um hospital materno-infantil com UTI neo-natal, cirurgia neo-natal. Banco de leite humano, laboratório que produz mais de 150 tipos de exames. Mês passado foram 69 mil exames realizados e já entrega online. Antes, se perdia muito. O paciente fazia o exame e não ia buscar. Era um prejuízo, um trabalho sem resultado. Hoje, praticamente, 100% do resultado dos exames são entregues. O nosso hospital tem residência médica. O nosso banco de leite recebe mais doação que o de Salvador. Não estamos concorrendo, que fique claro, mas é uma constatação para mostrar a decisão que nós tomamos.

A mortalidade infantil era grande em Conquista?

Era imoral. Vitória da Conquista integra o polígono das secas. 63% do município é semiárido. Era uma quantidade imensa de crianças que morriam à mingua de doenças evitáveis e tratáveis, inclusive, como verminoses. Nós temos 304 povoados rurais e em cada um deles eu pergunto a quanto tempo morreu uma criança à mingua de um tratamento médico? Houve uma caminhada que valeu à pena. Com muitos erros, mas muitos acertos também, mas houve um complicador. Em 2012, por exemplo, segundo o IBGE, Vitória da Conquista tinha 316 mil habitantes e tinha mais de 600 mil cartões SUS. Não temos capacidade instalada para isso. Quem tem direito acaba pagando por aqueles que não deveriam ter aqui. E vem muita gente por fora do próprio controle. Temos uma central de controle de leitos e grande parte faz um cartão SUS aqui de Conquista e é atendido. Há esse complicador. Pedi várias vezes ao governador para descentralizar esse serviço. Nesta semana o governador Rui Costa esteve aqui e assegurou que Guanambi e outras cidades terão policlínica e serviços mais sofisticados porque isso melhora o atendimento em Conquista e para os municípios que realmente estão pactuados conosco.

E água?

Nós começamos a trabalhar com o que tínhamos. A cidade, segundo os geólogos, está em cima de um cristalino e não tem água nem de superfície nem de subsolo. Desde o primeiro momento fomos para a zona rural, são 11 distritos, e os povoados são 304. Em cada um deles, até por intermédio do orçamento participativo, era a população que dizia onde seria o barramento. Antes, havia uma prática da prefeitura de fazer uns tanquinhos. Fazia-se num dia 18 tanquinhos destes que três meses depois da chuva estavam todos secos. Nós já entramos quebrando esta corrente. Acreditamos que era uma enganação. Optamos pelo barramento onde a população escolhesse. Quem é do sertão de dentro, como se diz, é que conhece onde deve ser instalado essa barragem. O morador que sabe que se fizer em um determinado lugar a água pode ficar salobra ou a terra não segurar, enfim, são eles que sabem onde fica o melhor lugar para instalar o barramento e nós seguimos essa orientação a partir da participação da população. São mais de 800 barramentos que fizemos ou outras que recuperamos. Estamos no quinto ano sucessivo de seca e a televisão não mostrou mais uma carcaça de um bicho morto de sede. A partir de 2003 o governo federal começou a implantar as chamadas cisternas de placa que tem capacidade para 16 mil litros. São dois caminhões pipa para encher e aproveitar a água da chuva. Conquista está chegando a 4,2 mil cisternas deste tipo. Além disso, foi criada a política de distribuir em caminhões pipa água tratada. Aqui são 44 caminhões que a prefeitura compra água da Embasa e leva até o interior. A água que o pessoal do interior bebe é a mesma que a da cidade. Em cada localidade tem um apontador ou apontadora que é uma pessoa da comunidade que contabiliza a distribuição. Muitas vezes acontecia de o caminhoneiro contar que fazia 59 viagens e cobrava 70. O ser humano, se não estiver bem fiscalizado, às vezes, pratica até este tipo de perversidade. Cobrar a água de uma população que está com sede sem ter levado esta água é uma perversidade. Com esta fiscalização e a participação da população, quem mora na zona rural não está desprovida de água. Com relação à população da cidade, há quatro anos, no governo da presidente Dilma Rousseff foram investidos em torno de R$ 33 milhões para fazer um pequeno barramento no Rio Catolé, em Barra do Choça e sete estações de bombeamentos e uma adutora de 25 km que joga água para a barragem de Água Fria 2 que manda água para Conquista e durante estes anos a cidade não entrou em colapso graças a estas intervenções. Já abriram várias licitações para a construção da barragem e deram desertas. Hoje, o valor orçado para a construção gira em torno de 170 milhões de reais. A barragem terá a capacidade e de 24 milhões de m³.

Em tese isto seria suficiente para resolver o problema?

Resolveria. Não tem colapso graças a ação rápida e o governo de Rui Costa está trabalhando para trazer água do rio Gaviãozinho que fica há cem metros de altitude do Catolé. Esta água será bombeada para abastecer o Catolé e continuar servindo a cidade. Outra coisa é que muitos distritos já têm água encanada. O convênio com a Embasa era só para a sede, mas durante este tempo fomos conseguindo, inclusive com recursos de emendas parlamentares, estender a rede para muitos distritos.

Mas há uma proposta de emendas parlamentares para construção da barragem serem viabilizadas na bancada...

Ainda com relação a água quero dizer outra coisa. Durante muito tempo na Bahia um grupo político com muito poder no governo federal poderia ter feito algo. Eu me lembro de um deputado federal que chegou à presidência da Câmara e o pai presidente do Congresso que esteve num possível local da barragem do Rio Pardo e fez uma carreata imensa como direito a camisetas e que traria a grande solução. Quando recebemos o governo, entretanto, não havia um papel sobre o assunto. Eles tinham todo o poder demais na república para fazer política de recursos hídricos em toda a Bahia. A barragem do Rio Pardo hoje em dia já tem um projeto executivo pronto graças à prefeitura e ao ministério da Integração Nacional.  Ai sim, a capacidade para 433 milhões de m³ quase 20 vezes o que será a do Catolé. Sem projeto não adianta o gestor ir para lugar nenhum.

Essa barragem foi prometida lá atrás?

Foi aquela festa. Carreata, camisa comemorativa. Mataram boi. Lembro demais. Depois, quando assumiu outro governo houve a pancadaria. A política tem que se livrar desta coisa chamada hipocrisia. Isso faz muito mal à política. Faz muito mal, sobretudo, aos cidadãos.

Nestes 20 anos de governos petistas existe uma relação inegável de serviços prestados, contudo, o que se ouve nas ruas é que preciso dar um choque na gestão e dar uma resposta ao atual grupo político até para que haja oxigenação e aumente o ímpeto...

Tenho dito à população que este é um projeto de mudanças. Nós chegamos há 20 anos, mas 20 anos é um tempo muito pequeno para a vida de uma comunidade, de uma cidade. Por exemplo, a mortalidade infantil era imensa. A quantidade de crianças que eram sepultadas sem certidão de nascimento ou atestado de óbito, em fundo de quintal era imoral. Tanto é que tinha uma frase muito cruel que era comum de se ouvir que era alguém dizer ‘hoje tem um anjinho para a gente beber’. Um anjinho, no Nordeste, é uma criança de meses que morreu devido à desnutrição ou prematura e ficam ali aquele caixãozinho do lado da sala com as rezadeiras cantando as ladainhas e tinha sempre uma bebida. Tem depoimento de pessoas que fizeram um, dois e até três caixões de ‘anjinhos’ numa única localidade rural em um dia e a pessoa dizia que não ganhava dinheiro com isso, que tinha tristeza, mas que como era quem sabia fazer tinha que fazer. Isso acabou em Vitória da Conquista. Por isso que nos 304 povoados, nos 11 distritos onde chego a primeira pergunta que faço é essa: quanto tempo morreu uma criança à míngua. Isso mostra que foi uma mudança. Nós temos mudado todo dia. Uma coisa é alcançar isso e outra é manter. A população gosta quando uma rua é assaltada, mas depois que você asfalta aquela rua você não tem nenhum vigilante. Quando você constrói uma escola todo dia tem professor, motorista, merenda escolar, material escolar, água, luz, telefone, salário rigorosamente pago em dia, ou seja, não para mais de ter investimento. Quando se abre uma unidade de saúde a nossa obrigação era ter uma unidade de saúde em cada distrito é o que manda o ministério da Saúde. Nós temos 11 distritos e 17 unidades nas sedes destes distritos e já temos 78 postos nos povoados por uma iniciativa da prefeitura. Eu digo isso sem nenhuma vaidade porque tem povoado aqui que está distante de outro povoado 150 km. São mais de dois mil quilometro que interligam a cidade. Continuamos fazendo postos. Foi outra mudança radical. Conquista não tinha nem equipe de Saúde da Família hoje temos 44 e já começamos com a figura do odontólogo. Médico aqui na zona rural só existia na véspera de eleição acompanhando algum candidato com um saco de amostra grátis e dentista só o prático. Eu vi. Em 1996 quando estava em campanha uma dentista prática extraindo dente usando a mesma agulha e seringa e eu fui falar com ela dizendo que estava cometendo um crime. Havia sido contratada por uma candidata à vereadora. Nós estávamos em tempos de Aids, hepatites virais. Era essa a saúde ofertada para a população de Conquista. Hoje nós temos 42 mil alunos, existia um déficit quando chegamos de 10.200 vagas para alunos de 7 a 14 anos. Hoje temos 52 mil vagas. Nós planejamos ter mais vagas que alunos. A educação é uma estratégia.

Conseguiram avançar no Ideb?

Quando nós chegamos foi uma proposta nossa não perder mais uma geração de jovens por falta de ginásio. E nós abrimos. Onde tivesse uma garagem vazia, uma sala vazia, nós mandávamos pintar para passar a ser a quinta série ou sexta. Assim que surgiam os recursos fazíamos as edificações. Eu dizia que escola é feita de gente e não de parede. Se tiver um professor motivado, com salário em dia, com transporte decente, a educação acontece. Conheci gente que repetiu a quarta séria quatro vezes porque não tinha como ir para a quinta, pois não existia. Nossos carros rodam sete mil quilômetros mês. Ifba, cursos universitários, enfim. Se o prefeito não for buscar, não vem.

Transporte público: o candidato de oposição fala em regularizar o transporte clandestino. Diz que empresas quebraram e acusa a atual gestão de ser negligente...

Quando eu fui eleito a primeira vez, muitos donos de vans me procuraram para saber se eu iria regularizar. Só havia uma empresa de ônibus e me perguntavam o que eu iria fazer. Eu dizia que seria pedantismo de minha parte dizer o que resolveria o problema do transporte coletivo porque não sou especialista. Prefeito não tem que ser especialista em tudo. A minha obrigação é contratar uma empresa de especialistas. Pessoas que entendem por dentro todos itens do transporte coletivo, inclusive, para saber como deve ser a tarifa. Abrimos uma licitação e uma empresa de São Paulo venceu. Levou quase um ano a elaboração do trabalho. As pessoas contratadas pela empresa ficavam de 5h até o último horário viajando na única empresa que tinha vendo a quantidade de pessoas que andavam e que distancia que andavam e só então que trouxeram o diagnóstico dizendo que precisava de outra empresa de transporte. Quando chegou a outra empresa foi uma festa. As duas empresas rodando no mesmo dia sem cobrar passagem. A câmara de vereadores naquele tempo entrou na justiça para não entrar outra empresa. Eu só tinha cinco vereadores e 14, contra. Um ano depois, 36 empresas compraram o edital de licitação e na hora de abrir chegou o oficial de justiça e barrou. Oito meses depois, já um ano e oito meses depois, novamente abrimos o edital. Desta vez, somente 16 empresas entraram no edital.

Ai saiu...

Não. O mesmo oficial de justiça chegou de novo com a ação movida pela Câmara e particulares porque tinham interesses. Nós persistimos e conseguimos. Em 2009, quando eu voltei, encomendei outro trabalho. Quase 100% adaptados para cadeirantes. Nós pavimentamos quase 200km de ruas, principalmente, vias exclusivas de ônibus. Fizemos 51 km de canais de drenagem, porque Conquista está numa serra. Isso melhorou muito a circulação dos veículos. Houve avanços. Creio que o próximo prefeito tem tudo para contratar uma empresa para planejar o que fazer. Agora, não pode nascer solução alinhavada da cabeça de candidato. Acho que isso não é muito responsável. Essa solução de véspera de eleição, ou seja, consorciar van com ônibus. Todos os estudos que fizemos desaconselharam a prefeito a consorciar mototáxi, van e ônibus. Vira uma guerra e uma guerra negativa para o usuário do sistema. Não fiz nada da minha cabeça. Todas as vezes que os donos de vans vinham me oferecer a apoio eu dizia que não poderia aceitar como moeda de troca. O candidato não tem esse direito. Transporte coletivo é para servir a uma população e tudo que fizemos foi em cima de estudo.

Classificação Indicativa: Livre

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