Saúde

Transtorno Bipolar atinge oito milhões de brasileiros; entenda como a doença afeta o dia a dia

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Dia 30 de março é comemorado o Dia Mundial do Transtorno Bipolar   |   Bnews - Divulgação Ilustrativa

Publicado em 29/03/2019, às 23h15   Brenda Ferreira



Em 30 de março é comemorado o Dia Mundial do Transtorno Bipolar. E para ampliar o debate sobre o tema, o BNews trouxe o assunto à tona nesta data. De acordo com a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata), é necessário chamar a atenção para transtornos bipolares e eliminar o estigma social.

Dados da Associação Brasileira de Transtorno Bipolar (ABTB) mostram que o transtorno atinge 4% da população, o que representa cerca de oito milhões de brasileiros, sendo que 60% dos casos tem sua primeira manifestação antes dos 20 anos de idade.

Andreia Souza* está entre os 40% da população que foi diagnosticada após os 20 anos. A filha dela, Júlia Andrade*, conversou com o BNews e contou sua trajetória com a mãe que foi detectada com a doença aos 41 anos. Hoje, Andreia tem 54.

De acordo com Júlia, em 2006, sua mãe apresentou uma depressão que desencadeou um transtorno bipolar. Na época, ela tinha 9 anos. “Eu a via chorando e não entendia muito bem o porquê. Tinha dias que ela só queria ficar na cama e eu ficava pensando o que ela tinha”, lembrou.

Os familiares de Andreia chegaram a levá-la em vários psicólogos, para tentar descobrir o que ela tinha. “Inclusive alguns tentaram tratar ela querendo colocar religião [para ela seguir]”, disse Júlia.

A filha de Andreia contou que, quando cresceu e pôde perceber os sintomas da mãe, procuraram um psiquiatra juntas. “Ela descobriu que tinha transtorno bipolar e síndrome de borderline (Transtorno mental caracterizado por humor, comportamentos e relacionamentos instáveis). Depois disso, começou a se tratar com tarja preta e toma vários medicamentos, por dia, até hoje”.

Passados alguns anos, Júlia precisou começar a trabalhar e estudar, já que em casa é só ela e a mãe. E, diante de vários medicamentos e tratamentos pesados para transtorno bipolar, a estudante de jornalismo relatou que Andreia ficou viciada nos remédios. “Ela tomava sob a própria supervisão. Eu não tinha tempo de olhar”.

E a luta seguiu. “De uns dois anos para cá, eu percebi que não houve melhora. Tem dias que minha mãe acorda e simplesmente não quer tomar um banho, não quer levantar da cama. Tem dias que ela fala ‘vem trazer a comida para mim’”.

Apesar de todas as dificuldades, Júlia Andrade declarou que respeita e entende a mãe. “Não é fácil, é muito difícil. Ela não tem estabilidade. Tem dias que eu acordo de mau humor e eu sempre tenho que estar bem para ela”.

Situações externas – As portadoras de patologias do humor estão mais vulneráveis a situações que envolvem outras pessoas no seu convívio natural. Mãe e filha moram em um condomínio no bairro Itapuã, em Salvador. Júlia descreveu um cenário que é comum para as duas.

“O pessoal do condomínio já bate de frente com ela porque quando tem uma crise, ela grita muito. O pessoal daqui não entende mesmo. Já teve uma reunião para falar sobre minha mãe, para explicar que ela é uma pessoa doente”.

A estudante ainda confessou que, atualmente, a família não presta os devidos cuidados. “Minha família também não entende, não dá o suporte necessário. Minha avó acha que pode ser fingimento. Por mais que ela conheça minha mãe desde pequena, ela não dá um suporte”.

Para driblar essas situações, Júlia disse que tenta buscar pessoas “de fora”. “Tento uma academia para ela fazer dança, um esporte... porque a gente não tem suporte da família. O que torna ainda mais difícil a relação”.

Há cerca de dois meses, Andreia toma um medicamento, que segundo Júlia, absorve os neurotransmissores que ela não desenvolve (euforia e alegria, por exemplo).

“Levei no psiquiatra de novo porque o pai dela morreu e ela surtou. O médico passou novos remédios e, em uma semana, houve melhora e ele aumentou a dosagem. Hoje em dia, com os remédios, ela está mais calma”.

Para entender o Transtorno Bipolar mais a fundo, o BNews convidou a psiquiatra Miriam Gorender para falar sobre o assunto. Confira a entrevista:

1. Como podemos resumir Transtorno Bipolar?

É uma doença mental e tem um caráter inflamatório. Ela é progressiva, fortemente genética, altera várias instâncias do cérebro, dos neurotransmissores e que vai se manifestar como situações muito intensas de humor. Não é o mau humor ou o bom humor. Quando a gente fala de humor em psiquiatria é como se fosse um metabolismo de energia.

A pessoa alterna entre períodos de grande energia, de aceleração e de euforia. É patológico e é intenso a nível de trazer para a vida da pessoa, tristeza e perda de energia.

2. Quais são os tipos de transtorno bipolar?

Não tem tipo. O Transtorno Bipolar do Humor tem gradações. Tem dois polos: o para cima e o para baixo, e a pessoa alterna entre eles.

3. Para uma pessoa leiga, que não sabe lidar com os transtornos, como conviver com pessoas que tem?

A principal questão de convívio é fazer com que ela se trate adequadamente. Se a pessoa for bem tratada, tem chance de estabilizar. Com o tratamento adequado, consegue que a pessoa tenha seus altos e baixos. A pessoa deixa de estar à mercê da doença, assim como a família.

É uma doença crônica, não tem cura. Tem controle.

4. Se uma pessoa tiver dúvida quanto ter a doença, o que ela pode fazer e qual profissional procurar?

Tem pessoas que tem muita impulsividade, mas não tem bipolaridade. Quem pode fazer o diagnóstico apenas é um especialista em psiquiatria. 

5. Quais são os sintomas iniciais quando a pessoa está desenvolvendo o transtorno?

Não existe uma forma única de sintomas iniciais. Ela pode aparecer de diversas formas. Não é possível um leigo ou qualquer outro profissional ter um diagnóstico bem fundamentado, apenas o psiquiatra.

O dia foi marcado no calendário em homenagem à data de aniversário do pintor Vincent Van Gogh, que foi diagnosticado como portador do transtorno bipolar.

Serviços de atendimento gratuito em Salvador - As unidades dos Centro de Atendimento Psicossocial tratam transtorno mental. Os atendimentos incluem consultas individuais, de grupos e oficinas terapêuticas, além de visitas domiciliares, apoio matricial às unidades de atenção básica de saúde e outros.

Segundo informações do site da prefeitura de Salvador, a documentação necessária para atendimento nestes locais é o cartão do SUS e a identidade. 

Lista dos Caps da capital:

 CAPS II bairro Garcia | Telefone: (71) 3329-1004
 CAPS II Oswaldo Camargo: bairro Rio Vermelho | Telefone: (71) 3611-3916
 CAPS I Prof Luís Meira Lessa (Criança e Adolescente): bairro Rio Vermelho | Telefone: (71) 3335-6827
 CAPS II Rosa Garcia: bairro Jardim Armação | Telefone: (71) 3489-9795
 CAPS II Aristides Novis: bairro Engenho Velho de Brotas | Telefone: (71) 3611-2952 / 2953
 CAPS II Eduardo Saback: bairro Pernambues | Telefone: (71)
 CAPS bairro Pernambués (álcool e drogas) | (71) 3116-4696
 CAPS II Nise da Silveira: bairro Cajazeiras | Telefone: (71)
 CAPS II Águas Claras | Telefone: (71) 3309-9641
 CAPS II Dr. Antonio Roberto Pellegrino: bairro Jardim Baiano | Telefone: (71) 3321-3679
 CAPS II Franco Basaglia: bairro de Itapuã | Telefone: (71) 3285-0396
 CAPS II Prof. Adilson Sampaio: bairro Caminho de Areia | Telefone: (71) 3611-6584/6585
 CAPS II bairro Liberdade | Telefone: (71) 9997-9566
 CAPSIA (infância e adolescência): bairro Liberdade | Telefone: (71) 3256-0869
 CAPS II: bairro Pau da Lima | Telefone: (71) 3611-6584
 CAPS II bairro São Caetano| Telefone: (71) (71) 32592556
 CAPS II Maria Célia Da Rocha: bairro Alto de Coutos | Telefone: (71) 3397-6743
 CAPS ad III Gey Espinheira: bairro Barris : Telefone: (71) 3329-7393

O BNews procurou a Secretaria de Saúde do Estado (Sesab), que informou que não dispõe dos dados sobre a doença. "Transtorno bipolar não é doença de notificação compulsória. O atendimento é feito pela rede municipal, nos CAPs - Centro de Atenção Psicossocial".

Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) não respondeu aos questionamentos da reportagem até a publicação desta matéria. Os dados mencionados são do site da pasta. 

*Os nomes utilizados na matéria são fictícios para preservar a identidade das personagens.

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