Artigo

Evitando deslizes

Arquivo Pessoal
Bnews - Divulgação Arquivo Pessoal

Publicado em 04/07/2022, às 09h01 - Atualizado às 09h05   Daniela Pereira


FacebookTwitterWhatsApp

O ex-presidente Lula surpreendeu o público ao ler o discurso durante encontro com militância e apoiadores, ocorrido no último sábado (02), na Arena Fonte Nova. Mas engana-se quem pensa que esta foi a primeira vez que o petista abandonou o improviso para ser guiado por páginas de ofício.

Neste ano eleitoral, Lula tem adotado textos prontos, como fez no lançamento da sua pré-candidatura, no dia 07 de maio. No 2 de Julho ficou evidente a participação da esposa e socióloga, Janja, não somente para segurar os papéis para facilitar a leitura do marido, mas também na construção do texto.

Com parágrafos certeiros, ele contextualizou historicamente o 2 de Julho, referenciou as mulheres protagonistas da Independência brasileira, usou frases de efeitos como ‘lugar de mulher é onde ela quiser’, homenageou o agronegócio, criticou privatizações e, claro, a gestão do presidente Jair Bolsonaro.

Desacostumado a ver o ex-presidente lendo, o público se empolgou em momentos pontuais, sobretudo, nas críticas diretas ao atual presidente da República ou em citações de frases de efeitos usadas, principalmente, pela militância de esquerda. 

Mas quem está acostumado a acompanhar os noticiários sobre política sabe o quanto um texto pronto está sendo essencial para o pré-candidato e que três pontos podem ser destacados para justificar a escolha pelas leituras de discursos:

O primeiro seria a necessidade de evitar deslizes. Recentemente, Lula foi criticado por algumas falas durante pronunciamentos improvisados. Em um deles o ex-presidente desagradou os policiais ao dizer que “Bolsonaro não gosta de gente, gosta de policiais”. Em outro momento, durante entrevista à Revista Time, disse que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenski, é tão culpado na guerra entre Rússia e Ucrânia quanto Putin.

Apesar de seguir na liderança em todas as pesquisas de intenções de voto, o petista ainda batalha para que os brasileiros perdoem os seus deslizes e não tenham raiva de te querer, parafraseando Fagner, ex-apoiador de Bolsonaro.

O segundo ponto seria utilizar suas falas para apresentar as principais propostas de Governo. Entre uma crítica ou outra a Bolsonaro, Lula faz comparações entre seu governo e o atual, com o intuito de despertar a nostalgia dos brasileiros e o sentimento de que “naquela época era melhor”. Em seguida, ele aproveita o gancho para apresentar a ‘solução’ para o país, com o cuidado de não deixar de fora as classes mais insatisfeitas com o atual governo. Uma tacada de mestre!

E o último ponto, mas não menos importante, seria frustar as expectativas dos bolsonaristas, que aguardam os ruídos na comunicação do rival para usarem de munição contra ele, fomentando a campanha negativa.

Mas apesar dos pontos positivos, vale ressaltar uma desvantagem no ato de ler um discurso. O pré-candidato perde movimentação de palco, expressão corporal, contato visual com o público, e a espontaneidade, tão essencial numa campanha eleitoral. O contato visual gera proximidade e a espontaneidade desperta o sentimento de igualdade, característica chave de um candidato populista.

E foi justamente esta perda de espaço da esquerda nas camadas mais populares que contribuiu com a penetração e proliferação do bolsonarismo no Brasil. De fato, o Brasil ainda tem muita água para ver passar debaixo da ponte que leva ao 02 de outubro. Até lá muitos discursos serão lidos, outros improvisados. Alguns deslizes perdoados e outros levados para as urnas. Anota ai!

Daniela Pereira é jornalista com mais de 10 anos de experiência em redações e assessorias; MBA em Comunicação Eleitoral e Marketing Político; especialista em Engajamento e Gestão Estratégica em Ambientes Sociais; mestranda da Universidade Federal do Estado da Bahia (UFBA) e repórter de política do BNews.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp