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Ourolândia: multas de denunciadas por extração ilegal de mármore são convertidas em bens para município

Divulgação / MP-BA
MP e MPT miraram práticas trabalhistas e ambientais em desacordo com a lei ocorridas no município   |   Bnews - Divulgação Divulgação / MP-BA

Publicado em 02/10/2018, às 12h20   Adelia Felix


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Localizada no Piemonte da Chapada Diamantina, a cidade de Ourolândia recebe uma série de bens e serviços custeados por empresas responsáveis pela extração de mármore no município, na próxima quarta-feira (3). A entrega acontece após acordo que atingiu dez empresas acusadas de cometer várias irregularidades trabalhistas. Atualmente, calcula-se que mais de 60 empresas atuem neste ramo no município, o qual é responsável por mais de 90% da produção nacional de mármore-bege, ou mármore Marta Rocha, como era conhecido quando foram localizadas as primeiras minas, nos anos 50 do século passado. 

A região foi alvo de duas ações do programa de Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) em 2010 e 2014, que envolveram o Ministério Público do Trabalho da Bahia (MPT-BA) e o Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), os quais miraram práticas trabalhistas e ambientais em desacordo com a lei. 

Segundo o MPT, na primeira fiscalização, foi assinado um termo de ajuste de conduta com dez empresas que atuavam no setor. Na segunda, após ser identificado que houve descumprimento, foi cobrado na Justiça do Trabalho a multa prevista, no valor aproximado de R$ 900 mil. Os valores foram convertidos em bens e serviços, como um ônibus para a Secretaria da Saúde do município, um automóvel para o Conselho Tutelar e computadores para a Secretaria da Educação, entre outros bens. A procuradora responsável pela ação, Vanessa Griz, fará a entrega.

“O desenvolvimento econômico não pode ocorrer às custas do adoecimento dos trabalhadores. Todas as empresas do setor estão sujeitas às normas trabalhistas. O pagamento das multas em forma da aquisição de bens para os órgãos da educação e da saúde não desobriga os empregadores a garantir um ambiente de trabalho seguro e sadio”, diz a procuradora. A compra de cada item é feita à medida que o município indica e comprova a real necessidade. No dia da entrega, também acontece um Ciclo de Palestras sobre Trabalho Seguro para empregados e empregadores do setor, no Centro Educacional Pedro Edson. 

O MP, por meio do promotor de Justiça Pablo Almeida apresentou, em julho do ano passado, uma denúncia contra a ex-prefeita Yhonara Rocha de Almeida Freire, o ex-secretário municipal de Meio Ambiente, Múcio Ancelmo Oliveira de Azevedo, a ex-técnica ambiental do município, Bernadeth Sousa Rocha Simões, cinco empresas e nove empresários por crimes ambientais. O órgão pediu à Justiça indenizações de R$ 72,8 milhões.

Na denúncia, o promotor destacou que a atividade prejudicava os recursos hídricos da Bacia do Salitre, bem como o relevante conjunto de cavernas da cidade, com volume significativo de fósseis e pinturas rupestres. O MP verificou ainda que no licenciamento, os empresários e as empresas apresentaram estudos, laudos e relatórios ambientais falsos e enganosos.

Até julho do ano passado, foram ajuizadas 16 ações civis públicas. Ao BNews, o promotor Pablo revelou que o dado já está ultrapassado. “Já temos 50 ações civis públicas ou criminais contra mais de 100 empresas, empresários, ex-autoridades municipais e agentes públicos, com pedidos indenizatórios superiores a R$ 200 milhões. Ações estas propostas na Justiça Estadual pelo Ministério Público Estadual”, explica o promotor.

No próximo dia 27 de novembro, acontecem audiências com as empresas de mármores, quando será discutido um acordo coletivo. O assunto foi debatido em reunião realizada na sexta-feira (28), na sede da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), em Salvador. 

“Na reunião, foram tratados impactos da atividade no ambiente natural e cultural, na busca de um acordo para encerrar as ações propostas na Justiça Estadual. O acordo que tentamos viabilizar é bem complexo porque envolve vários trabalhos. Um dos aspectos é compensar os impactos ambientais ao meio ambiente natural de Ourolândia. A proposta desenhada envolve a criação de um viveiro de mudas, que teria capacidade de produzir 20 mil mudas de espécies nativas por ano, o qual faria esse trabalho por pelo menos 15 anos. Assim, teríamos a produção de 300 mil mudas e o plantio dessas mudas em áreas de preservação permanente”, explica.

Para o representante do MP, a atual forma de produção não possui um adequado coeficiente de sustentabilidade ambiental. “Porque apenas 30% das pedras extraídas são aproveitadas comercialmente. Além disso, dentro desses 30% o processo de serragem do mármore em chapas gera uma perda de 25%, que vira pó, que por sua vez vira rejeito, que por sua vez não tem destino final adequado. A Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado, no ano de 2010, já tinha identificado que existia um estoque de rejeito estimado de 2 milhões de metros cúbicos, geralmente empilhados nos pátios das empresas. Sendo que de 2010 até 2018 ocorreram vários picos de produção, e as pilhas de rejeito cresceram sem controle”, detalha.

Desta forma, o promotor explica que a Fieb, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e o Centro Integrado de Manufatura e Tecnologia (CIMATEC) foram acionados para que fossem encontradas melhores soluções técnicas e científicas para a situação.  “A ideia é reaproveitar toda essa quantidade de rejeito de pedra, o que poderá resolver o problema ambiental com ganhos econômicos para as empresas. Eles já realizaram reuniões preliminares para chegar ao desenvolvimento de cinco pré-projetos”, afirma. 

Além disso, também é discutido o patrimônio cultural, espeleológico, arqueológico e paleontológico. “Ourolândia tem inúmeras cavernas, dentre as quais a Toca dos Ossos, considerada a caverna mais fossilífera do Brasil. Além disso, um mapeamento realizado identificou mais de 10 km de extensão dessa caverna, a qual já é considerada uma das 10 maiores do Brasil. A partir do Trabalho da FPI, o MP e o proprietário pactuaram a criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural [RPPN] nesta caverna. E, a reserva já foi reconhecida pelo Inema [Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos] como tal. No acordo, buscamos a criação de um museu em Ourolândia, próximo a essa caverna e também a estruturação da visitação, para realização de trabalhos de educação ambiental”, revela.

Outras duas reuniões estão previstas na sede da Fieb para tratar sobre o mesmo assunto.

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