Justiça

Defensor-geral acredita que STF decidirá pela constitucionalidade do juiz de garantias

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Secretário-geral do Condege e defensor-geral da Bahia, Rafson Ximenes defendeu inovação do pacote "anticrime" durante audiência pública promovida pelo STF na última segunda-feira (26)  |   Bnews - Divulgação Reprodução/YouTube/ TV Justiça

Publicado em 26/10/2021, às 13h27   Marcos Maia


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O defensor-geral da Bahia, e secretário-geral do Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege),  Rafson Ximenes, acredita que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá pela constitucionalidade do juiz de garantias, figura constituída pelo pacote "anticrime", instituído no ano passado.

Na última segunda-feira (25), Ximenes foi um dos participantes de uma audiência pública promovida pelo Supremo para discutir as previsões trazidas pelo novo ordenamento. Os debates iniciados ontem seguem acontecendo nesta terça-feira (26).

"Pelo que tenho acompanhado, as audiências estão deixando muito claro que institutos como o do juiz de garantias não tem qualquer vício de inconstitucionalidade. Muito pelo contrário. Se adequa perfeitamente ao nosso texto constitucional", avaliou em entrevista ao BNews.

Ele também avalia a figura do juiz de garantias como o "maior avanço no processo penal brasileiro nos últimos 50 anos". Atualmente, a sua implementação permanece suspensa, aguardando o desfecho da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6298, que versa sobre o tema.

O defensor-geral explica que o instituto do juiz de garantias viabilizará uma justiça mais imparcial, à medida que o magistrado que dará inicio ao processo, acompanhando o processo de investigação pelos órgãos responsáveis, não será mais o mesmo que julgará o feito no desfecho do processo. 

"É uma tentativa de dar mais imparcialidade no julgamento e evitar que o juíz seja contaminado pelas próprias decisões. Juízes são pessoas, como eu ou você, que naturalmente tem afetos e vaidades. Cada vez que ele vai reiterando decisões sobre um crime, vai ficando mais difícil ele mudar de ideia", avalia. 

Ximenes avalia que este novo instituto será especialmente importante para pessoas em situação de pobreza, maiores alvo do sistema penal brasileiro. De acordo com ele, na Bahia, e especialmente em Salvador, 98% das pessoas presas em flagrante tem renda de até dois salários mínimos e são negras.

O defensor explica que existem várias razões para se decretar a prisão de alguém antes de um julgamento, e que, normalmente, esses motivos estão relacionados a algo que vai interessar ao próprio andamento do processo. Ele cita como exemplos a prisão de pessoas que possam coagir testemunhas ou fugir.

"Há uma [condição] chamada 'riso à ordem pública' que é basicamente um julgamento sobre a pessoa. É dizer, antes da decisão final - até antes de existir a denúncia -,  que aquela pessoa tem de responder o processo preso pois representa risco a sociedade", acrescenta. 

Ele também afirma que a Defensoria descobriu, por meio de um levantamento, que 99,7% das prisões em flagrante que acabaram convertidas em preventivas, em 2019, levaram este princípio em consideração. Para o defensor, os números provam que a maioria dos réus já iniciam o processo já com "o pé na condenação". 

Assim, instituir a figura do juiz de garantias faria toda a diferença para garantir uma justiça mais parcial.

"Com certeza, um juiz que toma essa decisão vai ter muito mais dificuldade depois de reconhecer que aquela pessoa era inocente quando for o caso. [...] Não tem nada a ver com impunidade. É sobre as pessoas terem mais confiança na Justiça", diz.  

Na época da sanção da lei do chamado pacote “anticrime”, o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, divulgou uma nota reforçando uma posição contrária à figura do juiz de garantias.

Na ocasião, ele argumentou que o instituto funcionaria em comarcas com apenas um juiz, além de outros problemas. Entusiastas do chamado lavajatismo, por exemplo, também costumam ser contra a medida.

Ximenes defende que contra os argumentos de que a medida pode provocar impunidade, é fundamental repercutir com a sociedade "dados da realidade e não impressões e casos que ganham repercussão". 

Ele reiterou, que, por exemplo, no estado da Bahia, a maioria dos flagranteados são negros, pobres, com pouca educação formal e que na maioria das vezes são flagrateeadas sem armas. Quando apreendidos com drogas, portam consigo quantidades "ínfimas" de entorpecentes.   

"Essa é a realidade do processo penal. Para cada político ou empresário que um dia foi denuncidado - não condenado - há milhares de pessoas pobres. Então, quando a gente começa a discutir o processo penal a partir, por exemplo, da operação Lava Jato, existe uma distorção da realidade", pondera. 

Embora veja como positiva a criação do juiz de garantias, o defensor-geral avalia que o pacote anticrime trouxe alguns retrocessos criminológicos, como a ampliação do tempo que um condenado pode ficar preso de 30 para 40 anos - algo que, na avaliação dele, "não faz sentido" e deve aumentar as despesas com pessoas encarceradas no País.

"O que é curioso é que todas as normas que não fazem muito sentido, aumentando tempo de pena de forma exagerada e sem explicação - foram mantidas. Nenhuma delas foi suspensa. Só foi suspenso o que poderia garantir um julgamento mais racional, que poderia favorecer as pessoas pobres. É uma lei de duas cabeças - uma moderna e outra que representa retrocesso", opinou.

Ximenes também destacou que audiências públicas, como estas realizadas pelo STF, são importantes no processo de democratização de debate relevantes para a sociedade.

"É um ponto positivo que o Supremo Tribunal Federal esteja fazendo uma discussão jurídica sobre este instituto - para escutar todo mundo que vai conviver com as consequências do dispositivo legal que está sendo questionado", afirma.

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