Geral

Ataques a escolas: Por que ocorrem com frequência e como parar a onda de violência?

Reprodução/Vídeo
Pelo menos 10 ataques a escolas ganharam a capa dos noticiários desde maio de 2021  |   Bnews - Divulgação Reprodução/Vídeo
Sanny Santana

por Sanny Santana

[email protected]

Publicado em 08/04/2023, às 05h30


FacebookTwitterWhatsApp

Constantes ataques a escolas vêm ocorrendo no Brasil. O que era comum apenas em países estrangeiros, principalmente nos Estados Unidos, hoje toma conta do território brasileiro e vem causando pânico em colégios de diversas partes do país.

O mais recente ataque a escola ocorreu no dia 27 de março deste ano, em plena 07h20 de uma segunda-feira, na zona oeste de São Paulo. As vítimas foram crianças e professores do ensino fundamental II da Escola Estadual Thomazia Montoro. Na ocasião, uma professora de 71 anos foi assassinada por um jovem de 13, estudante do 8° ano da instituição.

Desde maio de 2021, pelo menos dez ataques a colégios tiveram grande marco nos noticiários brasileiros, sem contar a invasão a uma creche ocorrida neste mês de abril, em Blumenau (SC), onde quatro crianças, entre 4 e 7 anos, morreram.

Entre os ataques mais marcantes, está o que vitimou a aluna cadeirante, de 19 anos, Geane da Silva Brito. O caso aconteceu na Escola Municipal Eurides Sant'Anna, em Barreiras, no oeste da Bahia. A jovem foi morta por diversos disparos de arma de fogo e facadas, sem qualquer chance de defesa, sem poder, ao menos, fugir.

Mas qual a razão de tantos ataques a escolas? Porque adolescentes, tão novos, chegam a ponto de cometer tantas atrocidades, chegam a ponto de assassinar colegas e até mesmo professores?

Para Janaíne Pires, cientista social e advogada de 30 anos, não há um real culpado para os constantes atentados, porém diversos fatores podem explicar esse "surto" que vem ocorrendo no Brasil. Entre os principais problemas estão a pandemia com o fácil acesso a conteúdo explícito e violento, as mudanças políticas e a cultura do armamento.

Clique aqui e se inscreva no canal do BNews no Youtube!

“Vivemos um momento onde passamos por mudanças políticas e evidenciamos o culto a doutrinações ligadas ao uso de armas de forma desenfreada. Os jovens adquiriram fácil acesso às redes sociais em razão da globalização, mas isso ocorreu sem fiscalização. Passamos também por uma pandemia, onde ficamos em isolamento social, tendo a internet como principal entretenimento. A necessidade do isolamento junto com a propagação da cultura das armas e a ausência do convívio social e pessoal com outros jovens fez com que a grande maioria focasse o seu tempo em buscar o que era disseminado em massa nas redes sociais”, inicia, em entrevista ao BNews.

“Precisamos desassociar a culpa dos ataques a escola em si. É preciso ter uma visão de que passamos por um momento social onde os jovens cultuam ‘o que está virando hit na internet’ e isso desencadeia a propagação de discursos de ódio, de racismo, de intolerância e uso de armas (...) Os jovens são como ‘esponjas’. Eles seguem fluxo do que se mostra pertinente ao ciclo em que vivem. E o perigo está justamente aí, é muito fácil você sair da curva do aceitável e se tornar alvo de chacota, de xingamentos e afins”, explica.

Pires ainda chama a atenção para o fato de que o ambiente escolar é onde muitos jovens passam maior parte do seu dia, tornando o ambiente o mais propício a concretizar o que se vê nas redes sociais. É, inclusive, o ambiente propício para que o adolescente seja vítima de bullying.

Segundo a psicóloga Juliana Ayres, de 41 anos, o bullying, inclusive, pode causar sérios danos e problemas psicológicos, especialmente em crianças e adolescentes. No entanto, conforme dito a profissional ao BNews, quando se fala em ataques, outros aspectos devem ser considerados.

“[Deve ser considerado] se a pessoa sofreu algum tipo de abuso na infância, se veio de um ambiente familiar violento ou de negligência, se existe um histórico de transtorno mental prévio, por exemplo. Também temos que levar em conta a ausência de suporte emocional e de acolhimento pós bullying, que podem potencializar os efeitos do trauma. Quando vários desses fatores acontecem ao mesmo tempo, é maior a probabilidade de a pessoa desenvolver um quadro patológico e com atitudes extremas. Por isso é tão importante estarmos atentos aos bullyings que são feitos na infância e não os subestimar, pois não sabemos a vulnerabilidade emocional que já existe previamente em uma criança que está sofrendo determinado bullying”, declarou.

Mas e para evitar esses ataques? Como proteger o seu filho para que ele não seja uma vítima ou um agressor?

Novamente a apologia a armas é citada pela cientista social. “Para que os futuros jovens ou adolescentes não caiam nesse ciclo é necessário que seja desmitificado o uso de armas e de violência como solução dos problemas sociais. É preciso quebrar o paradigma de que o uso de armas, violência e ameaças vão lhes proporcionar o respeito e a consideração daqueles que os cercam”, inicia.

Ela ainda completa afirmando que o uso de políticas públicas que possam fiscalizar, controlar e disseminar a violência e o uso das armas pode ajudar.

Pires ainda comenta sobre a importância de atividades que estimulem o convívio em sociedade para que, dessa forma, os jovens não se sintam isolados. “Os jovens precisam ser orientados para o desenvolvimento em atividades que irão auxiliar no convívio em sociedade e em atendimento aos aspectos gerais da vida em si”, diz.

“Aliado a uma educação domiciliar e a fiscalização do conteúdo que se tem acesso na internet, é importante criar um diálogo entre as escolas e o órgão jurisdicional responsável pela criação de políticas públicas que combatam a violência como um todo. Nesse sentido, me refiro a violência psicológica também”, afirma.

Para Pires, um jovem que cresce com livre acesso a qualquer tipo de conteúdo na internet não cria uma consciência do que é ‘certo ou errado’, mas apenas do que lhe convém. “E o perigo está justamente aí. Se ele acha que usar uma arma é o correto porque ele viu em alguma rede social que é certo, ele vai usar”, declara.

Para finalizar, a cientista social afirma que é necessário que os jovens se sintam ouvidos. “Devemos conscientizar os jovens de que a sua voz é possível ser ouvida sem que seja necessário fazer o uso da violência para isso”.

A psicóloga também cita outros métodos para que um adolescente não adoeça psicologicamente: dar apoio emocional.

“Uma boa ferramenta nesse processo seria a inclusão da educação emocional nas escolas. Isso ajuda crianças e jovens a perceberem ou identificarem suas angústias e sofrimentos, e a lidar com eles da melhor maneira. O autoconhecimento pode começar desde cedo. Temos que lembrar que medo e raiva são muitas vezes reações emocionais ao que desconhecemos. Quanto mais o jovem se conhecer e se entender emocionalmente, menor a chance de ele criar estratégias nocivas para lidar com suas dores”, aconselha.

Ayres ainda declara ser imprescindível que os pais validem as emoções do filho e os escute, de fato.

“É muito comum que a gente faça pouco caso ou simplesmente negue o direito de uma criança a uma determinada emoção ou sofrimento, sem noção das consequências que isso pode causar a elas. Por isso os pais precisam ajudar seus filhos a lidarem com as suas emoções de maneira respeitosa, acolhedora e empática. Isso deve ser exercitado diariamente, para que a gente mude o hábito da sociedade. A emoção a gente não controla, mas o que fazemos com ela, sim”, diz.

A constante vigilância em relação ao conteúdo que as crianças e adolescentes estão consumindo na internet também é um assunto abordado. “É necessário saber o tipo de perfil que eles seguem, o que assistem, com quem conversam. Negligenciar a maneira como as crianças acessam informações é muito perigoso, uma vez que elas ainda não estão completamente formadas e são mais vulneráveis e suscetíveis”.

A atenção também deve ser dada a possíveis mudanças comportamentais dos filhos ou alunos: se está mais triste, mais calado, mais ansioso ou agressivo. “Eles podem estar precisando de ajuda para lidar com alguma questão emocional, e geralmente não sabem como pedir”, opina, colocando como último ponto a educação não-violenta, que deve ser a criação correta dentro de casa.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp