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Senado ignora propostas de peso da CPI da Covid, mas aprova medidas simbólicas

Jefferson Rudy/Agência Senado
Apenas 3 de 17 projetos de lei foram aprovados seis meses após comissão apresentar relatório  |   Bnews - Divulgação Jefferson Rudy/Agência Senado

Publicado em 10/04/2022, às 19h20   Renato Machado, Folhapress


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A CPI da Covid vai completar um ano da sua criação, mas ainda sem colocar em prática as recomendações de seu relatório final. Além de não haver ainda a responsabilização pelos crimes durante a pandemia indicados pela comissão, os integrantes do colegiado tentam destravar a tramitação de projetos de lei dentro do próprio Senado.

Levantamento do Observatório da Pandemia —frente parlamentar criada para acompanhar as proposições do relatório final da comissão— mostra que foram aprovados na Casa legislativa apenas 3 de um total de 17 projetos de lei propostos pela CPI.

Todos os projetos aprovados possuem um caráter mais simbólico, de homenagem às vítimas e aos profissionais que combateram o coronavírus. As propostas que buscam melhorar o arcabouço jurídico para, por exemplo, facilitar a punição de autores de crimes no futuro, seguem na gaveta. Muitas delas nem tiveram um relator designado para analisá-las.

A CPI da Covid foi oficialmente criada no dia 13 de abril de 2021, quando o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), leu o requerimento de instalação no plenário. O senador mineiro resistia a permitir a atuação do colegiado, mas foi obrigado por determinação do Supremo Tribunal Federal.

A CPI atuou por quase seis meses, período em que foram realizadas aproximadamente 400 horas de sessões de grande audiência e que repercutiram nas redes sociais. Foram armazenados quase 10 terabytes de documentos, parte deles foram utilizados para embasar as acusações.

O relatório final da comissão, aprovado em 26 de outubro do ano passado, recomendou o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro (PL), duas empresas e outras 77 pessoas, entre elas filhos do presidente, ministros, parlamentares, médicos e religiosos.

O documento também sugeriu os 17 projetos de lei, que versam sobre homenagens, alterações no código penal para aumentar a pena de crimes, mudanças na lei sobre crimes de responsabilidade, genocídio, entre outros assuntos.

Em quase seis meses após a aprovação do relatório, apenas três das propostas foram à votação no plenário do Senado, sendo aprovadas.

Elas criam respectivamente a Ordem do Mérito Médico, o Livro dos Heróis da Pandemia e institui o Dia Nacional em Homenagem às Vítimas da Covid-19.

Embora os membros da CPI ressaltem a sua importância simbólica, há reclamações de que os demais, que promovem alterações estruturais na legislação brasileira, para coibir e facilitar a punição de crimes, seguem na gaveta. Dos restantes, dez deles não possuem nem relator.

A cúpula da CPI da Covid, que foi formada pelo presidente Omar Aziz (PSD-AM), pelo vice Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL), já manteve reuniões com a presidência do Senado para tentar, ainda sem sucesso, destravar a tramitação.

"Não acho razoável a paralisação. A minha intenção é conversar com o presidente [Rodrigo Pacheco] para ver como poderemos avançar esses projetos", afirma o senador Randolfe Rodrigues.

"A leniência da PGR [Procuradoria Geral da República] tem lá as suas razões de ser, como nós todos sabemos. A Casa que sediou a CPI não tem o direito a paralisar, colocar essas matérias em tom de compasso", completou, em referência ao procurador-geral Augusto Aras, criticado por engavetar propostas contra Jair Bolsonaro.

Dentre as propostas que ainda aguardam início da análise, está um projeto de lei que altera a lei do impeachment para estabelecer um prazo de 30 dias para que o presidente da Câmara decida sobre a abertura ou não do processo —atualmente não há prazo.

Parlamentares apontam que a regra atual permite que o comandante da Câmara, atualmente Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, possa engavetar os pedidos sem analisá-los. Os prazos, argumenta-se, seria importante porque, em caso de recusa, poderia haver recursos para análise em plenário.

Outra proposta buscava criminalizar a criação e divulgação de fake news, especialmente em casos de saúde pública. Há ainda projeto de lei para aumentar a pena para gestores que cometerem crime durante pandemia ou situações de emergência em saúde pública.

Há também um projeto de lei para internalizar na legislação brasileira definições relativas a genocídio e define crimes contra a humanidade, crimes de guerra. Durante as discussões do relatório final, os senadores chegaram a cogitar propor a responsabilização de Jair Bolsonaro pelo crime de genocídio, mas recuaram posteriormente.

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Uma das propostas mais defendidas pelos senadores que integraram o colegiado é a criação de uma pensão para crianças e adolescentes órfãos de vítimas da Covid-19.

"Eu acho que, em primeiro lugar, é necessário que façamos uma seleção. Isso porque há projetos que são muito bons, até projetos que são urgentes e outros que são muito polêmicos. Aqueles que são polêmicos, nós poderíamos fazer passar pelas comissões, realizar audiências públicas e votá-los depois de um certo acúmulo", afirma o senador Humberto Costa (PT-PE).

"E aqueles que são consensuais, que são urgentes e são necessários, nós poderíamos ter uma tramitação mais rápida. Mas para isso seria necessário que o colégio de líderes pudesse estabelecer essas duas condições", completa.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, nega que haja morosidade com os projetos de lei oriundos da CPI da Covid.

O senador mineiro argumenta que muitos já foram enviados para as comissões temáticas. Em nota, a Presidência do Senado cita que o próprio Pacheco assinou a criação de uma comissão para discutir a atualização da lei do impeachment, que é presidida pelo ministro do STF Ricardo Lewandowski.

"Dos projetos derivados da CPI, alguns já foram aprovados. E boa parte despachada para as comissões, inclusive a alteração de Código Penal será submetida à Comissão de Constituição e Justiça", diz trecho da nota.

"Em relação à Lei do Impeachment, recentemente o Senado instituiu uma comissão de juristas para remodelar toda a legislação, de modo que tudo isso vai estar concentrado na comissão. E espero ainda esse ano discutir a Lei do Impeachment", completa.

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