Salvador

Transtornos e prejuízos: Demolição de antigo prédio de faculdade de Salvador gera polêmica no Rio Vermelho

Leitor BNews/Morador da região
Demolição tem gerado vetores de doenças e acúmulo de entulhos e lixo no local  |   Bnews - Divulgação Leitor BNews/Morador da região
Lucas Pacheco

por Lucas Pacheco

[email protected]

Publicado em 01/12/2024, às 06h00



Tremores, rachaduras, animais mortos, ratos, baratas, poeira e ruídos fortes. A demolição do antigo prédio da faculdade Ruy Barbosa, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador, para dar lugar a um grande empreendimento imobiliário residencial, se arrasta e tem gerado transtornos, riscos e prejuízos para donos de imóveis próximos ao local. 

A edificação ficou anos abandonada desde quando o campus da instituição de ensino deixou de funcionar. A demolição do prédio começou no início de 2023 e até hoje não foi concluída. Desde o começo da obra, moradores da região, sobretudo de casas vizinhas no Nordeste de Amaralina e Vale das Pedrinhas, fazem denúncias e registram queixas acerca da grande quantidade de vetores de doenças, com destaque para pombos, moscas, mosquitos como o Aedes aegypti, devido às poças de água aos montes, além dos já citados ratos, baratas e animais mortos.

O BNews teve acesso a imagens exclusivas do local, feitas por um morador, e que demonstram o acúmulo de lixo, entulho, restos mortais de animais, lama e água empoçada. 

Ruínas e abandono - Imagens: Leitor BNews
Ruínas e abandono - Imagens: Leitor BNews

Veja:

Ainda, além dos riscos de doenças, a demolição tem trazido diversos prejuízos materiais, como danos à estrutura de casas próximas, moradores preocupados e com medo de perderem suas residências e até mesmo de acontecer uma tragédia com a possibilidade de desabamento com pessoas dentro.

"Estamos lidando com rachaduras, ratos, baratas, pombos e moscas, além de poeira excessiva e ruídos constantes que não apenas estão danificando nossos lares, mas também afetando nossa saúde e qualidade de vida", afirma um morador ao BNews que preferiu não se identificar por medo de retaliação.
Casas próximas sofrem danos - Imagens: Leitor BNews
Casas próximas sofrem danos - Imagens: Leitor BNews

O BNews teve acesso a um vídeo que mostra uma dessas residências com rachaduras enormes, que vão do chão ao teto, e que têm gerado desespero à população. 

Além de não realizar a vistoria, as empresas responsáveis pela construção estão sendo acusadas de ignorar os impactos ambientais e sociais que o empreendimento pode causar na região.

O BNews Premium traz uma série de reportagens especiais sobre denúncias, investigações e apurações exclusivas, sempre aos domingos. Clique aqui e confira os outros materiais e compartilhe.

Veja mais imagens das ruínas:

Ao BNews, o advogado Michel Torres, que representa os moradores do entorno, na Rua Francisco Rosa, afirmou que a construção, que seria de responsabilidade da Salto Empreendimentos Imobiliários LTDA, com execução pela Direcional Engenharia, teria começado sem a devida inspeção cautelar exigida por lei para proteger as estruturas dos imóveis vizinhos.

Ainda segundo ele, a Direcional chegou a comunicar os moradores em julho deste ano, através de um documento assinado por um engenheiro de nome Altman, que um laudo de vistoria cautelar de vizinhança, com o objetivo de documentar o estado dos imóveis, seria realizado por uma terceira empresa, a Engos Engenharia, mas a demolição seguiu sem essa providência.

O advogado alegou ainda que, após uma assembleia que aconteceu no início de novembro, na Associação dos Moradores do Nordeste Amaralina e Vale das Pedrinhas, um novo compromisso para realização das vistorias foi firmado, mas sem cumprimento do acordo.  

"Nós tivemos uma reunião no início desse mês e eles haviam se comprometido a só continuar com a demolição quando concluísse todos os laudos cautelares em relação aos imóveis vizinhos. E isso não aconteceu. Logo no dia seguinte eles continuaram com a demolição, alegando que iriam começar pela parte que fica mais distante dos muros dessas casas e descumprindo o que haviam se comprometido com a gente na reunião. E três dias depois, quando os moradores voltaram a se manifestar, impedindo a entrada das máquinas, dos funcionários, eles destacaram uma empresa  para realizar esse laudo de vistoria", disse Michel Torres. 

Em razão desse novo descumprimento, as empresas foram notificadas extrajudicialmente pela defesa dos moradores com solicitação de realização urgente das vistorias e de paralisação das obras até o fim do procedimento. 

O BNews teve acesso à notificação:

Notificação encaminhada às empresas
Notificação encaminhada às empresas

"Há um desrespeito claro ao direito dos proprietários, que não tiveram sequer a chance de proteger seus patrimônios antes do início das escavações e construções pesadas", pontua o advogado.

Em resposta à notificação, a Salto Empreendimentos Imobiliários LTDA, no dia 18 de novembro, afirmou que a confecção dos laudos cautelares foi iniciada em 15 de julho de 2024 pela empresa Engos Engenharia, mas, "foi paralisada em 30 de agosto de 2024, diante da falta de segurança pública no local, o que também levou a empresa contratada optar por não seguir com a prestação do serviço".

O grupo afirmou ainda que chegou a contratar uma nova empresa, mas que diante de problemas de segurança e da realização de operações policiais no local, as vistorias não foram realizadas, porque teria sido recomendado que a entrada no local fosse adiada para garantir a segurança de todos os envolvidos. 

Sobre a continuidade da demolição mesmo sem as vistorias, a empresa respondeu aos moradores que iniciou o trabalho em seu terreno restrito aos arredores dos prédios que foram vistoriados e tiveram seus laudos cautelares concluídos, observando a segurança e os direitos dos demais moradores, sem qualquer risco de impacto nos mesmos. Por fim, alegou que, após a segurança pública do local ser reestabelecida, a empresa Fibo Engenharia retomou as vistorias no último dia 13 de novembro e possuía o prazo de conclusão previsto para até o dia 22 de novembro de 2024. 

Resposta à Notificação
Resposta à Notificação

Entretanto, o advogado dos moradores ressaltou que o que foi informado na resposta à notificação também não foi cumprido. 

"Essa empresa ainda não concluiu a visita técnica de todas as casas que ficam ao redor, que são confrontantes ali do empreendimento, da antiga faculdade. Então, a gente conseguiu mapear em torno de 30, 40 casas que ficam nesse entorno, beirando o muro, realmente colado com o muro. Eu lhe digo que eles não conseguiram visitar 5 casas, 10 casas. E dessas casas que eles visitaram, que supostamente o laudo foi realizado, eles também não disponibilizaram esses laudos para os moradores e nem para a gente", assinalou Torres. 

O BNews  procurou a Salto Empreendimentos Imobiliários LTDA, a Direcional Engenharia, executora das obras, a Engos Engenharia, empresa que inicialmente realizaria as vistorias dos imóveis vizinhos, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo de Salvador (SEDUR), responsável pela liberação e fiscalização de obras na cidade e a Secretaria Municipal de Saúde da capital (SMS), devido à alegação de animais mortos e vetores de doenças no local. 

A SEDUR se limitou a dizer que o imóvel possui alvará que autoriza a demolição e que enviaria uma equipe ao local para verificar a situação. 

"A Secretaria Municipal Desenvolvimento Urbano (Sedur) informa que o imóvel possui o alvará de demolição. O órgão enviará uma equipe de fiscalização ao local para verificar a situação", afirmou o órgão. 

A Direcional Engenharia alegou que o empreendimento respeita as normas legais.

"A construtora informa que o seu empreendimento na Rua Francisco Rosa, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador, está em total conformidade com as normas legais e regulatórias, autorizadas pelos órgãos competentes. Desde que adquiriu o terreno, há pouco mais de cinco meses, a empresa tem mantido contato com a comunidade vizinha, no Vale das Pedrinhas, a fim de realizar as vistorias cautelares e abrir o diálogo sobre as atividades a serem realizadas no local onde o empreendimento será construído". 

A empresa afirmou ainda que algumas inspeções não foram feitas em residências por causa da recusa de moradores. 

"A vistoria cautelar foi realizada nos imóveis vizinhos ao terreno, porém, alguns proprietários da comunidade do entorno se recusaram a passar pela inspeção. A empresa então se reuniu com representantes dos moradores e lideranças comunitárias do local para dar início às vistorias cautelares dos imóveis que não haviam autorizado a inspeção anteriormente. Elas já estão sendo finalizadas para retorno do cronograma de obras no empreendimento", alegou.

A Engos Engenharia, primeira empresa contratada para realizar as vistorias, pontuou que foi contratada em junho/2024 para realizar Laudos de Vistoria Cautelar dos imóveis vizinhos ao empreendimento imobiliário.

"Os trabalhos foram iniciados com as vistorias dos vizinhos laterais às obras do empreendimento: Edifício Vivendas do Park e Edifício Juliana, cujos laudos foram elaborados e encaminhados para o contratante, conforme previsto no contrato", apontou.

A Engos destacou ainda que a Salto encontrou "dificuldades" para obter autorização dos moradores vizinhos para liberação das vistorias em seus imóveis, sobretudo nos fundos do empreendimento, que "impediram a realização de todas as vistorias, pois era responsabilidade da Salto obter autorização dos moradores para realização das vistorias".

A Engos Engenharia disse também que não é mais a empresa responsável para realização das vistorias restantes em face de distrato contratual.

Sobre a posição da Direcional Engenharia, o advogado dos moradores, ressaltou que espera que a empresa respeite o compromisso feito de arcar com os prejuízos das pessoas que moram no local.

"Esperamos que a empresa honre o compromisso assumido de ressacir os danos causados aos moradores e adote todas as medidas necessárias para evitar novos prejuízos. Para isso, a conclusão da vistoria e apresentação do laudo é indispensável. Sem ele, não podemos admitir a retomada das obras e, caso necessário, ingressaremos com as medidas judiciais cabíveis", disse Michel Torres. 

A Salto Empreendimentos Imobiliários LTDA e a SMS não se manifestaram até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para esclarecimentos. 

Classificação Indicativa: Livre

Facebook Twitter WhatsApp