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Salvador 473 anos: Conheça o Caribe soteropolitano da Ilha de Maré

Foto: Divulgação
Com 4,2 mil moradores, Ilha de Maré pertence a Salvador e não tem ligação por terra com o continente.  |   Bnews - Divulgação Foto: Divulgação

Publicado em 28/03/2022, às 05h50   Juliana Barbosa


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Quem nunca ouviu falar do Caribe mexicano com toda a sua beleza natural, cultura e diversão? A vontade de ir é grande, mas muitas vezes o bolso aperta. Porém, não precisamos cruzar o pacífico para conhecer um paraíso. Aqui na Bahia, temos o Caribe de Salvador, na ilha de Maré, a Praia das Neves. 

Dentro da ilha, estão a Igreja de Nossa Senhora das Neves, uma das mais antigas do Brasil e a primeira construída a ilha, anexada ao antigo engenho.  Outra herança do passado é a obtenção de renda pela produção de doces de banana que marcam profundamente a cultura do local e a pesca.

Hoje, por conta do transporte entre as comunidades em direção a Salvador serem realizadas por meio de embarcações, as ruas da ilha são muito tranquilas. A sugestão é ir nos fins de semana que tem mais movimento. Dentro das diversas praias, a Praia Grande é a maior e a mais desenvolvida delas.

História 

Arquivo BNews
Ilha com 4,2 mil moradores pertence a Salvador

À frente da comunidade de Bananeiras, do outro lado da Baía de Todos os Santos, o Museu Wanderley Pinho, antigo engenho de açúcar, retrata o passado de violência escravocrata na Ilha de Maré, bairro de Salvador. Hoje, 367 anos depois da morte de Zumbi dos Palmares, dia da Consciência Negra, o preto da pele é motivo de reafirmação de força. A ilha, segunda maior da Baía, é também o bairro mais negro da capital baiana.

No século 16, os primeiros negros chegavam a força na ilha para servirem o modelo escravocrata dos senhores de engenho, e nas 11 comunidades que formaram a ilha durante os anos, até hoje encontra-se traços do passado. Um exemplo seria o museu que antes era o Engenho Freguesia, no município de Candeias.

Uma pequena embarcação leva ao ponto mais central do nordeste da Baía de Todos-os-Santos. Quando, em 2010, funcionários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desembarcaram na ilha para censo demográfico, 93% dos 4.236 moradores se autodeclararam negros.

Desde 2017, quando Ilha de Maré foi reconhecida como bairro de Salvador, cinco das 11 comunidades que formam o local passaram a constituir o Território Quilombola da Ilha de Maré, de acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). As referências culturais afro-brasileiras são sempre mencionadas pelos moradores, principalmente pescadores e marisqueiras.

“Inicialmente, a Ilha de Maré foi ocupada por povos Tupinambá, até que em 1534 foi criada a capitania da Bahia e em 1549 a cidade do Salvador. A partir da segunda metade do século XVI, as guerras contra os povos indígenas, somadas às epidemias, exterminaram grande parte dos povos originários e foram estabelecidas primeiras ocupações portuguesas efetivas, coma criação de freguesias e engenhos de açúcar. A Ilha de Maré e demais regiões insulares da Baía de Todos os Santos, inclusive a maior delas, Itaparica, passaram por esse processo de colonização. No século XVII, os ricos engenhos de açúcar, que pontuavam todoo Recôncavo, atraíram a cobiça das Províncias Unidas, que a partir de 1624 invadiram Salvador e as áreas adjacentes. As invasões holandesas à Baía se repetiram em 1627, 1638, 1640 e 1647 e em todas a ilha de Maré foi um alvo fácil, tendo seus engenhos saqueados. A ilha de maré era estratégica também para os holandeses quando havia o saque de açúcar, então o fato dela se tornar um território majoritariamente de população de origem africana se deve aos engenhos. Gradualmente tem a substituição do índio pelo africano, e ao longo dos séculos XVIII e XXI a ilha se torna um Pequeno território dentro do Recôncavo, mas a população é majoritariamente africana”, explica Pablo Antônio Iglesias Magalhães, professor doutor em história social.

Arquivo Professor Pablo
Uma das primeiras representações cartografias da ilha

O historiador e pesquisador do subúrbio, Rodrigo de Souza Sena também falou sobre a história do caribe soteropolitano:

"As regiões do subúrbio da cidade foram ocupadas por portugueses antes mesmo da fundação da cidade de Salvador, no período das capitanias hereditárias. Logo quando o capitão donatário Francisco Pereira Coutinho, que chegou a bahia no ano de 1536, se estabelecer na chamada Vila do Pereira (região do farol da barra), foram doadas por ele terras na região suburbana para plantação de bens de subsistência e a cana-de-açúcar, para produção do chamado “ouro branco”. Com o fim das capitanias hereditárias, o subúrbio vai ser reocupado por portugueses após a fundação da cidade.

Importante lembrar que nessa região viviam indígenas tupinambás que possuíam diversos grupos estabelecidos pelo subúrbio, principalmente ao redor de rios que hoje não existem mais, como é o caso do Rio Pirajá, que deu nome ao bairro e hoje não existe mais."

Como chegar?

Os carros não entram e o transporte - entre as comunidades ou em direção a Salvador - é feito por meio de embarcações, bicicletas ou animais. 

Em Salvador, você precisa ir através da estrada do DERBA (BA 528), a base naval e de lá saem barcos no Terminal Hidroviário de São Tomé de Paripe. Na última década, os moradores acreditam ter aumentado a chegada de turistas, que desembarcam ou no píer da comunidade de Santana ou de Botelho, depois de embarcarem no terminal. A travessia dura em média 20 minutos e começa entre 4h30 e 5h. A última embarcação sai de Botelho, quando a maré permite, às 19h. 

Os barcos maiores cobram em média R$ 4. Barcos menores cobram R$5 por pessoa até encher o barco com 6 passageiros.

Curiosidade

Outra peculiaridade faz de Ilha de Maré um caso de estudo: é o lugar onde há mais albinos na cidade e, possivelmente, o maior do Brasil. A descoberta faz parte de um estudo do programa de Genética e Sociedade da Universidade Federal da Bahia (Ufba). 

Apesar de ser uma condição genética rara no mundo, o albinismo tem índices altos em populações afrodescendentes – é de um caso para cada 10 mil pessoas. Entre brancos, a frequência é de um para cada 36 mil.  

Leia Mais: Albinos da Ilha de Maré, na Bahia, enfrentam isolamento e lutam por atenção à saúde

Comunidades da Ilha de Maré 
Ilha de Maré é dividida entre as comunidades de Oratório, Botelho, Engenho de Maré, Nossa Senhora das Neves, Itamoabo, Santana, Praia Grande, Mata Atlântica, Martelo, Maracanã e Bananeiras.

Para finalizar, uma das primeiras peças literárias publicadas por um baiano e data de 1705, um trecho do poema Ilha de Maré, de Manoel Botelho de Oliveira, que de certa forma, traz a história da ilha até então;

"Jaz oblíqua forma e prolongada

a terra de Maré toda cercada

de Netuno, que tendo o amor constante,

lhe dá muitos abraços por amante,

e botando-lhe os braços dentro dela

a pretende gozar, por ser mui bela.

Nesta assistência tanto a senhoreia,

e tanto a galanteia,

que, do mar, de Maré tem o apelido,

como quem preza o amor de seu querido:

e por gosto das prendas amorosas

fica maré de rosas,

e vivendo nas ânsias sucessivas,

são do amor marés vivas;

e se nas mortas menos a conhece,

maré de saudades lhe parece.

Vista por fora é pouco apetecida,

porque aos olhos por feia é parecida;

porém dentro habitada

é muito bela, muito desejada,

é como a concha tosca e deslustrosa,

que dentro cria a pérola fermosa."

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