Justiça

Especialistas apontam que a nova lei das sobras eleitorais enfraquece partidos pequenos

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Eles destacam, porém, que as mudanças são necessárias tendo em vista o número grande de partidos políticos no Brasil  |   Bnews - Divulgação Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Publicado em 02/10/2021, às 21h00   Lucas Pacheco


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A Lei 14.211/2021, que redefiniu os critérios para a distribuição das vagas não preenchidas nas eleições proporcionais (vereador, deputados estadual e federal) depois da divisão dos votos pelo número de cadeiras, as chamadas sobras eleitorais, foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta sexta-feira (1º). Especialistas apontam que as mudanças enfraquecem partidos pequenos e o pluralismo político previsto na Constituição Federal, mas que a cláusula de barreira, ainda que tímida, é necessária.

A lei sancionada condiciona a distribuição dessas sobras com base em um limite mínimo de votos obtidos pelo partido. De acordo com o texto, poderão concorrer à distribuição das sobras de vagas apenas os candidatos que tiverem obtido votos mínimos equivalentes a 20% do quociente eleitoral e os partidos que obtiverem um mínimo de 80% desse quociente.

Trocando em miúdos, o quociente eleitoral é o resultado da divisão do número de votos válidos apurados pelo número de vagas. Ou seja, pela nova legislação, se um partido ou coligação consegue um total de 100.000 votos em determinada eleição proporcional e existem 10 vagas de sobras eleitorais, só poderá preenchê-las o candidato, até então não eleito, que conseguir, no mínimo, 2.000 votos (20% de 10.000 = resultado da divisão 100.000 votos por 10 vagas) e o partido dele 8.000 votos (80% de 10.000 = resultado da divisão 100.000 votos por 10 vagas).

A lei tenta coibir o chamado “Efeito Tiririca” que ocorre quando um determinado candidato obtém uma votação expressiva e em consequência disso acaba elegendo colegas da mesma agremiação ou coligação que tiveram bem menos votos e jamais conseguiriam serem eleitos sem esse efeito

Em conversa com o Bnews, o advogado eleitoral Luiz Romano afirma que “A consequência disso aponta para um sacrifício ainda maior às legendas partidárias dotadas de baixa densidade política e competitividade eleitoral menos expressiva. O novo critério legal tende a inibir, portanto, a já pequena representatividade dos partidos políticos menores, que tendem a perder ainda mais espaço”. 

Ele aponta ainda que a lei “Tende a favorecer partidos maiores, haja vista que esses, em razão de maior densidade eleitoral, em virtude de possuírem candidatos mais competitivos, podem ser contemplados com mais vagas”. 

E completa ressaltando que a sobrevivência de agremiações políticas menores se tornou mais difícil agora. “O pluralismo político é um dos fundamentos da República e do Estado de Direito. Como dito anteriormente, as alterações provenientes da Lei 14.211/2021 tendem a dificultar a sobrevivência dos partidos políticos menores na arena política, em razão do maior rigor trazido pela lei para o preenchimento das vagas legislativas. Não se pode perder de vista que se trata de um objetivo das alterações mais recentes à legislação eleitoral, materializadas na cláusula de desempenho, nos critérios para distribuição das vagas referentes às sobras, na exigência de percentual mínimo do candidato face ao quociente eleitoral para ser eleito, enfim. Infere-se que a ideia do legislador, já de algum tempo, é reduzir o número de partidos, que, atualmente, são mais de 30 legendas em todo o país, situação que dificulta, inegavelmente, a governabilidade”.

O advogado Jarbas Magalhães, também ouvido pelo Bnews, lamenta as alterações que os congressistas fazem na legislação eleitoral. “É importante lamentar o que o Congresso, mais especificamente os deputados, fazem em relação à legislação eleitoral. Eles fazem um verdadeiro laboratório, de dois em dois anos tem mudança que causa certa insegurança jurídica, principalmente para a população que não precisa entender esses detalhes e fica muito confuso”. 
Sobre as alterações trazidas pela nova lei, ele aponta que “É uma cláusula de desempenho, de certa forma limitando que partidos menores, pequenos, obtenham uma vaga no parlamento. Isso dificulta o acesso dos partidos menores ao parlamento. Não deixa de ser uma cláusula de desempenho, que alguns chamam de cláusula de barreira, que deveria ser tratada mais profundamente, mas o Congresso vem legislando de forma tímida”. 

Jarbas Magalhães destaca que o Brasil possui um número muito grande de partidos políticos e que é preciso diminuir. “Particularmente, sou a favor de uma cláusula de desempenho maior, até porque é preciso enxugar o número de partidos no Brasil. A gente tem mais de 30 partidos, o que não corresponde ao cenário ideológico no Brasil. A gente não tem mais de 30 ideologias, vamos assim dizer. Então, eu acho que cláusula de desempenho é necessária, muito embora essa ainda seja tímida. Eu acho que deveria ter cláusula de barreira mais rigorosa para diminuir a quantidade de partidos políticos”. 

Entretanto, ele pondera que existem partidos pequenos de aluguel e partidos ideológicos pequenos e que a lei pode prejudicar os ideológicos. 

“A gente tem que, de fato, separar os partidos políticos nanicos, de aluguel, e os partidos políticos ideológicos. A gente tem partido político ideológico pequeno, mas também tem uma gama de partidos políticos nanicos, que só são legendas de aluguel. Em relação a estes, eu acho que tem que ter mesmo cláusula de barreira específica e a tendência, se houvesse um fortalecimento, era esses partidos terem mais dificuldade no funcionamento e, futuramente, quem sabe, extinguir. Em relação aos partidos ideológicos, de fato, isso reflete neles. Há um problema aí que precisa ser buscada uma solução. Eu creio que essa questão dos ideológicos, ela pode ser atenuada com a criação das federações partidárias”. 


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