Feriado / Dia Nacional da Consciência Negra

Novembro Negro: Confira relatos de quem sofre diariamente com o racismo

Reprodução/Pixabay
Nesse Novembro Negro é importante destacar que a Bahia é o estado com a maior população negra do Brasil com 21,5% total, segundo dados do IBGE  |   Bnews - Divulgação Reprodução/Pixabay
Lorena Abreu

por Lorena Abreu

[email protected]

Publicado em 15/11/2022, às 09h00


FacebookTwitterWhatsApp

O Dia Nacional da Consciência Negra surgiu como uma compilação da luta do negro, resultado de empenho e conscientização da sua ancestralidade. O dia da morte de Zumbi dos Palmares então é lembrado nessa mesma data em que ocorreu seu assassinato, sem esquecer da importância de outros líderes como Dandara, e tantos que lutaram pela libertação negra.

Zumbi dos Palmares foi o último líder do Quilombo dos Palmares e também o de maior relevância histórica. Ganhou respeito e admiração de seus compatriotas quilombolas, devido suas habilidades como guerreiro, a qual lhe conferia coragem, liderança e conhecimentos de estratégia militar. Lutou pela liberdade de culto e religião, bem como pelo fim da escravidão colonial no Brasil. Apesar disso, este líder também ficou conhecido pela severidade despótica com que conduzia Palmares, onde, inclusive, havia um tipo mais brando de escravidão.

Dandara, foi esposa de Zumbi dos Palmares, era uma guerreira negra que dominava técnicas de capoeira e lutava ao lado de homens e mulheres nas muitas batalhas geradas por ataques ao quilombo.

Ao longo da história do Brasil até os dias atuais, a luta travada pelos negros contra a discriminação, por causa da cor da sua pele, é diária e extremamente difícil. Não obstante estarmos em pleno século XXI, infelizmente o preconceito racial contra os negros é latente e corriqueiro. Nesse cenário, cabe à toda sociedade brasileira, independente de etnia, se questionar qual o seu lugar nessa luta.

Nesse sentido, o ideal é que desde muito cedo haja uma conscientização ampla sobre igualdade racial, o que perpassa entre educação doméstica, bem como escolar.

[Colocar ALT]
Djavan Benin, designer, administrador, escritor e ilustrador

Djavan Benin, designer, administrador, professor, roteirista e ilustrador, acredita que "desde criança, essa conscientização deve estar presente no cotidiano de todos. Assim, docentes qualificados e engajados no tema são de suma importância para não só por obrigação da lei que versa sobre os povos africanos e seus descendentes, mas também por conter profissionais que sejam militantes e sensíveis a causa. Isso faz parte da formatação brasileira, negligenciar isso é esquecer do sentido do que é ser brasileiro de fato."

A lei à qual Benin se refere é a Lei 10.639/03, alterada pela Lei 11.645/08, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas, públicas e particulares, do ensino fundamental até o ensino médio. O objetivo do dispositivo legal propôr novas diretrizes curriculares para o estudo da história e cultura afro-brasileira e africana. Nas salas de aula os professores devem ressaltar em a cultura afro-brasileira como constituinte e formadora da sociedade brasileira, na qual os negros são considerados como sujeitos históricos, valorizando-se, portanto, o pensamento e as ideias de importantes intelectuais negros brasileiros, a cultura (música, culinária, dança) e as religiões de matrizes africanas.

A referida lei é a mesma que instituiu o Dia Nacional da Consciência Negra, no dia 20 de novembro. "Para o negro brasileiro [a data] é a celebração e memória das lutas por liberdade, aceitação e também por incentivo à sua cultura sem a interferência do ocidente", destaca Benin.

Embora a Bahia seja o estado com a maior população negra do Brasil, seguido do Rio de Janeiro, cada um com 21,5% e 14,2%, respectivamente, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) DE 2021, a desconstrução do preconceito ainda está muito incipiente.

O administrador de empresas, Marcelo Ataji conta um pouco sobre o preconceito que sofre dia-a-dia por ser negro. "Eu trabalhei durante 10 anos em um banco e tive a necessidade de aprender tudo do sistema bancário, primeiro pra evitar erros, segundo pra dinamizar meu trabalho e terceiro pra não deixar que ninguém me chamasse de incompetente, pois já tinha percebido que o meu simples erro tinha sempre uma repercussão grande diferentemente dos meus colegas que cometessem o mesmo erro."

[Colocar ALT]
Marcelo Atajai, administrador de empresas com MBA em em gestão de logística e estratégia empresarial

Ele ainda destacou a dificuldade em ser promovido. "Durante essa minha carreira no banco eu não tive promoção alguma me inscrevi algumas vezes no plano de carreira almejando pra alcançar um degrau acima na instituição e nem uma resposta eu recebia. Num primeiro momento, eu achei que era algum problema em relação à qualidade do meu trabalho, mas logo percebi que não era pois eu tinha muito conhecimento acumulado, inclusive era registrado como gerente; eu liberava e fazia coisas de gerente mas nunca fui promovido, nunca recebi como gerente e na primeira necessidade de tirar alguém de demitir , quem foi o escolhido? Ataji Marcelo."

Outro relato de Ataji é clássico. "Eu estava num shopping com meu sobrinho e entramos em uma grande loja de material esportivo, para comprar um skate para minha sobrinha, porém, estava em falta. Olhamos mais algumas coisas, mas saímos sem comprar nada. Ao chegar no estacionamento para pegar meu carro, percebi a presença de três pessoas; um funcionário da loja de material esportivo e os outros dois seguranças do shopping. O funcionário disse que nós tínhamos roubado um boné e foi aquele clima horrível! Olharam nossas sacolas e óbvio não acharam nada do que eles queriam e foram embora. Fui prestar queixa na delegacia e o policial não quis me atender perguntando se eu provava o que eu tinha falado. Somente após alguns um vizinho, amigo e policial me ver na delegacia, consegui registrar o Boletim de Ocorrência, conta o administrador.

Já Djavan Benin acredita que "ser negro no Brasil é viver com a duplicidade entre viver e sobreviver. Ou seja, transitar entre o que deve ser feito e o que pode ser feito. Para tal, as pessoas pretas devem se fortalecer enquanto comunidade, buscando a ajuda mútua e o incentivo comum. Não é uma tarefa fácil. E os brasileiros são corresponsáveis nisso. Digo, todos os brasileiros, independente de como se indentificam."

Os movimentos negros vêm ganhando corpo na Bahia, mas ainda são tímidos. "Em Salvador por ser a cidade mais negra fora da África, muitos acham que isso [os movimentos] não é desnecessário. Mas, precisa ainda de políticas públicas e entendimento da sociedade baiana como um todo. É uma tarefa cíclica, constante e rotineira mesmo. Falta uma conscientização geral, que perpassa a família, mídia, etc. Para isso, a educação é fundamental", destaca o designer.

Fato é que esses relatos servem para que todos possam refletir sobre a importância de se colocar frente à essa missão de combate ao racismo no Brasil. Os negros têm o seu lugar de fala, obviamente. Mas, mais que um dever moral, a luta contra o racismo deve ser uma questão de reconhecer a dignidade da pessoa humana e a isonomia entre as raças. Nesse cenário, a educação protagoniza o conjunto de movimentos em prol de uma sociedade mais humana e igualitária.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp